O globo, n. 31363, 20/06/2019. Sociedade, p. 21

 

Dados da educação

Paula Ferreira

20/06/2019

 

 

Avanços tímidos e ritmo lento mostram cenário de estagnação, dizem especialistas

Embora tenha mostrado evolução nos índices educacionais, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) revela que a educação do país ainda está longe da resolução de seus principais problemas. Para especialistas, os avanços são muito pequenos, o que configura um cenário de estagnação do Brasil na área.

Os dados da Pnad Contínua, que abrange 211 mil domicílios, mostram que 40% da população de 25 anos ou mais nem sequer concluiu o ensino fundamental, o que representa cerca de 53,4 milhões de pessoas. A taxa ajuda a compor um cenário mais amplo, no qual mais da metade dessa população (52,6%) não completou a educação básica, ou seja, não chegou a se formar no ensino médio, o que corresponde a 70,3 milhões de pessoas.

Os índices são referentes ao ano de 2018 e, embora ainda mostrem um cenário negativo, apresentam evolução em relação ao alcançado em 2017, quando 40,9% da população não tinham o fundamental. Já o índice de pessoas que não terminaram a educação básica chegava a 53,8%.

— Quando olhamos o nível de instrução, observamos as pessoas de 25 anos ou mais, aquelas que estão estudando e aquelas que já pararam de estudar. Temos uma população de idosos onde o acesso à educação não foi tão fácil quanto para a população jovem. O que observamos é que os jovens estão mais escolarizados, seja porque já são mais alfabetizados nos primeiros anos da educação, ou porque já estão atingindo o ensino médio completo — diz Marina Aguas, analista do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A Pnad mostra ainda que há 11,3 milhões de analfabetos no país. O índice passou de 6,9% da população acima de 15 anos, em 2017, para 6,8% desse grupo em 2018. Além disso, o levantamento revela que há altos índices de jovens de 15 a 29 anos que não estudam e nem trabalham (23%).

Entre as causas para esse cenário, educadores apontam o escanteamento do Plano Nacional de Educação (PNE) e a falta de políticas públicas contundentes para reverter questões estruturais como a evasão escolar.

Os pesquisadores afirmam ainda que o fortalecimento da Educação de Jovens e Adultos (EJA) poderia ajudar a reverter essa realidade.

— Desde o começo de vigência do Plano Nacional de Educação, em 2014, a meta de alfabetização está praticamente estagnada. Isso acontece

porque não há nenhum programa ativo em dirimir essa situação. E apolítica de educação de jovens e adultos, que atinge uma população em maior situação de vulnerabilidade eque já teve seguidas violações d odir eitoà educação, é muito precarizada e escanteada —afirma Andressa Pellanda, coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

O coordenador do Núcleo de Inteligência do Todos pela Educação, Caio Sato, destaca que é preciso investir também nas políticas voltadas para a primeira infância afim de mitigar as desigualdades desde o início da vida escolar.

Sato exemplifica que crianças de baixa renda desde o início da vida têm contato com um vocabulário menor que seus pares inseridos em famílias mais ricas, o que poderia em parte ser compensado com uma educação de qualidade na primeira infância. O educador chama a

atenção para o fato de que a Avaliação Nacional de Alfabetização, feita pelo Ministério da Educação, já constatou que a alfabetização das crianças não têm acontecido de maneira eficaz.

'Cultura de repetência'

Juliana Leitão, especialista em Políticas Educacionais da Fundação Roberto Marinho, afirma que os avanços foram “discretos”, mas que é preciso aumentar a velocidade dos ganhos. Para isso, diz, é preciso encontrar as dificuldades de aprendizado e combatê las o mais rápido possível.

— Temos, basicamente, dois gargalos: um no ensino médio e outro nos últimos anos do ensino fundamental. Agora, dentro da escola, se faz necessário um projeto de correção de fluxo destinado aos alunos com dificuldade de aprendizagem.

Ela explica que o monitoramento precisa ser constante, para evitar que as dificuldades só sejam descobertas no fim do ano letivo.

— Monitorar os indicadores das turmas é importantíssimo. Precisamos achar as dificuldades do aluno antes que se chegue a dezembro para descobrir que o estudante perdeu o ano. Temos uma cultura de repetência no Brasil. Essas dificuldades devem ser descobertas a tempo para os pais serem chamados e o reforço ser convocado, evitando que essa repetência aconteça.

A Pnad Contínua revela ainda que uma das principais características do problema educacional no país é a disparidade entre brancos e negros e entre as regiões do país. De acordo com Andressa Pellanda, a falta de investimento em políticas estruturais reforça o problema. Ela cita que a meta 8 do PNE não tem evoluído significativamente. Esse trecho do documento prevê, entre outros pontos, igualar a escolaridade média entre negros e os demais até 2024.

— O balanço que fizemos dessa meta mostra que a população negra, do campo do Nordeste e o quartil mais pobre segue defasado em relação à média da população. As parcelas dessa população em maior situação de vulnerabilidade e discriminação é a mais afetada em termos educacionais.

Caio Sato ressalta a importância no desenvolvimento de ações que sejam capazes de trazer as pessoas que saíram do sistema de volt apara a escola,oque pode ajudara reduzir também os problemas relacionados ao desemprego.

— Muitos não estão estudando e trabalhando porque evadiram da escola e não estão encontrando oportunidade no mercado de trabalho, seja pela crise econômica, ou porque perderam o interesse. Precisamos pensar um novo modelo para que esses alunos continuem estudando.