Título: Novo regime automotivo
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Fonte: Correio Braziliense, 08/10/2012, Opinião, p. 16

Descontados os inconvenientes do protecionismo — praga que atropela as boas práticas do comércio internacional e impede a concorrência salutar em favor do consumidor —, há méritos nas mudanças no regime automotivo anunciadas na semana passada. Com elas, o governo justifica a manutenção da proteção às montadoras instaladas no país, mas exige, pela primeira vez, algo razoável em troca. Ao mesmo tempo, trata de formatar os incentivos à produção local e a novos investimentos no setor, bem como a manutenção de barreira tributária à importação, de modo a aliviar as queixas em fóruns internacionais, patrocinadas desde setembro por montadoras sem unidades produtoras no país, abrindo-lhe uma janela de participação no programa.

As empresas tinham razão. O Brasil manteve o limite de taxação às importações estabelecido em 35% pela Organização Mundial do Comércio (OMC), mas adotou a contestável manobra de elevar em 30 pontos percentuais a alíquota de um imposto interno, o IPI, sobre os veículos importados de montadoras não instaladas no território nacional. Essa medida barrou a crescente entrada de veículos, principalmente chineses, que rapidamente começaram a incomodar a produção local. A barreira está mantida, mas agora poderá ser amenizada e até eliminada mediante o cumprimento de certas exigências.

O que o governo criou, depois de muita negociação com as montadoras aqui instaladas, foi um sistema de redução progressiva do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Basicamente, essas condições incentivam a inovação, por meio do abatimento gradual do tributo para as montadoras que investirem em pesquisa e desenvolvimento, de 0,13% a 0,5% da receita bruta entre 2013 e 2017; em engenharia e capacitação de fornecedores nacionais, entre 0,5% e 1% da receita bruta no mesmo período. Além disso, estabelece compromissos de aumento da eficiência energética, com o lançamento de veículos com motorização capaz de economizar combustível, com meta de redução de consumo em 12% até 2017. Outro mérito do programa foi fixar seu prazo de validade: cinco anos, a contar de 2013.

Bom ou ruim, nada pior do que a incerteza. Logo após o anúncio dessas regras, pelo menos cinco montadoras informaram a disposição de desengavetar investimentos em suas primeiras fábricas no país: as chinesas JAC Motors (na Bahia) e Chery (em São Paulo), a alemã BMW (Santa Catarina), a indiana Tata (Minas) e a Nissan (Rio). Mas permanecem incertezas quanto à operacionalidade da medição do cumprimento das condições para a concessão do abatimento do IPI. Ademais, mesmo tendo as montadoras aprovado o regime e suas exigências, nada garante que elas, dentro de dois ou três anos, terão condições de cumprir o combinado. Afinal, o carro moderno é produto mundial e suas partes e peças estão sujeitas à feroz concorrência de fabricantes espalhados pelo planeta. Restará à sociedade, verdadeira dona do tributo abatido, cobrar eficiente e transparente fiscalização.