O globo, n. 31363, 20/06/2019. País, p. 7

 

Comissão do Senado derruba decretos de armas de Bolsonaro

Amanda Almeida

Daniel Gullino

20/06/2019

 

 

Decisão, que impõe nova derrota para o governo, ainda precisa passar pelo plenário da Casa e pela Câmara; votação foi marcada para ocorrer na próxima terça-feira

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem a derrubada dos decretos do presidente Jair Bolsonaro que flexibilizaram o porte e a posse de armas. O argumento central é que Bolsonaro extrapolou suas funções ao editá-los. Para ter validade, a decisão ainda precisa passar pelo plenário e pela Câmara dos Deputados. Havia a intenção de votar o texto ainda na noite de ontem no plenário do Senado, mas houve um acordo para adiar a análise para a próxima terça-feira.

A CCJ analisou conjuntamente sete projetos de decretos legislativos (PDLs) que pedem a revogação dos decretos, editados em maio. O relator, Marcos do Val (PPSES), defendeu a manutenção das medidas de Bolsonaro. Mas seu parecer foi derrotado por 15 votos a 9. No lugar, foi aprovado simbolicamente um voto em separado apresentado por Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB).

Uma recomendação de urgência para que os projetos fossem votados ainda ontem no plenário também foi aprovada. À noite, contudo, dada à falta de consenso, o senador Randolfe Rodrigues (RedeAP), autor de um dos PDLs, afirmou que concordava com o adiamento. Assim, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), confirmou a votação para a próxima terça.

Caso de família

Na sessão da CCJ, pela manhã, Marcos do Val tentou sensibilizar os senadores com uma história pessoal: ele rela touque sua irmã sofreu ameaças de morte recentemente e que, por isso, ela entrou com um pedido para ter o porte:

—É a única maneira que ela está encontrando de garantir avida. A segurança pública

não tem condição de estar em todos os lugares, em todos os momentos. Minha irmã nunca tocou numa arma. Depois dessa ameaça, ela está se preparando. Não é o que ela queria, mas é a oportunidade que ela está tendo, por esse decreto, de proteger a vida dela. Não tirem esse direito dela.

Entretanto, prevaleceu a

avaliação de que não se estava debatendo a flexibilização ou não do porte de armas, mas sim a maneira pela qual ela foi feita, ou seja, por meio de decreto. Espiridião Amin (PPSC), por exemplo, votou pela derrubada do decreto, mas defendeu que o Legislativo debata essa questão em breve. — Voto por considerar que este decreto exorbita (o poder do presidente), reconhecendo que será muito apropriado que o Legislativo trate desde assunto na forma constitucional e legal devida.

Um dos que defenderam o decreto foi Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente. Segundo ele, a política desarmamentista falhou em evitar homicídios.

Novas derrotas

Parlamentares já apostam em novos reveses do governo. Na Câmara, a expectativa de rejeição de algumas alterações no Código de Trânsito propostas por Bolsonaro é grande, entre elas o fim da multa para quem transporta crianças sem o uso de cadeiras próprias. A Casa também deve propor alterações em dois pontos do pacote anticrime do ministro Sergio Moro (Justiça): retirar do texto o excludente de ilicitude e a prisão em segunda instância.

Derrota

A DERRUBADA, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, dos decretos do presidente Jair Bolsonaro que flexibilizam o porte de armas já era esperada, dada a flagrante inconstitucionalidade do texto.

O CONGRESSO cumpre o seu papel. E é bom que aconteça em início de governo, para reafirmar os limites que a Carta estabelece aos Poderes.

GOSTE-SE dele ou não, o Estatuto do Desarmamento continua a vigorar. Para mudá-lo, não bastam decretos. É preciso ouvir o Congresso.