O Estado de São Paulo, n. 45885, 14/06/2019. Política, p. A4

 

Bolsonaro tira Santos Cruz e escoLhe general da ativa

 

 

 

 

Vera Rosa

Renata Agostini

Naira Trindade

14/06/2019

 

 

 

Secretaria de Governo.

Ministro entrou em atrito com ala olavista por controle da Comunicação do governo; Ramos, o substituto, estudou com presidente na escola de cadetes

O presidente Jair Bolsonaro demitiu o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, e nomeou para o cargo o general de Exército Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, comandante militar do Sudeste. Primeiro militar a deixar o ministério de Bolsonaro, Santos Cruz foi alvo de ataques do escritor Olavo de Carvalho e do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). O general geria os recursos da Secretaria de Comunicação.

 

O presidente Jair Bolsonaro demitiu ontem o ministro chefe da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, um de seus principais conselheiros no Palácio do Planalto. Alvo de ataques do escritor Olavo de Carvalho e do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), ele integrava o núcleo duro do governo e é o primeiro ministro militar a cair. Santos Cruz deixa a equipe sob desgaste, após ruidosas críticas da rede bolsonarista, e será substituído pelo general de Exército Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, comandante militar do Sudeste.

A queda do antigo companheiro de Bolsonaro representa a vitória da ala olavista do governo, dos filhos do presidente e do chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Fábio Wajngarten. O general da reserva tinha nas mãos a chave do cofre da Secom e era ele quem comandava a liberação dos recursos. Sua posição considerada “linha dura” com a distribuição da verba incomodava tanto os políticos como a equipe econômica.

A última briga que ganhou os holofotes ocorreu no mês passado, quando Santos Cruz vetou parte do orçamento apresentado para a campanha publicitária da reforma da Previdência. Além disso, seus adversários no governo afirmavam que ele isolava o presidente no Planalto, criando obstáculos para a nova estratégia de comunicação.

Apesar das divergências, a demissão de um dos generais mais próximos de Bolsonaro surpreendeu até o vice-presidente, Hamilton Mourão. Santos Cruz foi comunicado de sua demissão em almoço no Planalto com o presidente, por volta de 12h20. O diálogo ocorreu pouco antes de Bolsonaro viajar para Belém (PA). O ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno Ribeiro, e o titular da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, estavam presentes à reunião.

O Estado apurou que Santos Cruz parecia incrédulo. Disse que, embora não concordasse, respeitava a decisão do presidente. Duas horas antes de ser demitido, ele participou de uma audiência na Comissão de Transparência do Senado e defendeu o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Ex-juiz da Lava Jato, Moro está sob pressão por causa do episódio envolvendo suposta troca de mensagens com o procurador Deltan Dallagnol, em Curitiba. Questionado se haveria risco de Moro sair, o general afirmou que o colega estava “muito acima desse absurdo criminoso”, em referência ao que chamou de “invasão da privacidade”.

Bolsonaro fez ontem sua tradicional live das quintas-feiras, mas silenciou sobre Santos Cruz. O porta-voz da Presidência, general Rêgo Barros, disse que o presidente agradecia o trabalho do ex-ministro e que a dispensa não afetava “a amizade, a admiração e o respeito mútuo”. Em nota, Santos Cruz confirmou que deixava a equipe

“por decisão” do presidente e fez uma série de agradecimentos, inclusive aos deputados e senadores, “pelo relacionamento profissional respeitoso, desejando sucesso no equacionamento e na solução das necessidades e anseios de todos os brasileiros”. Nos bastidores, porém, ele sempre foi criticado no Congresso.

Pentatlo. Amigo de longa data de Bolsonaro, Santos Cruz integrou sua equipe de pentatlo militar, nos anos 80, e exerceu papel de comandante das tropas de paz da ONU no Congo e no Haiti. Conhecido pela disciplina, ele cumpriu os compromissos agendados para ontem, no Planalto, mesmo após demitido. À tarde, ele recebeu o deputado Fausto Pinato (PP-SP) e se comportou como ministro. Afirmou, por exemplo, que o Congresso deveria avançar em pautas que trouxessem arrecadação para o País, como a liberação de jogos. O deputado só soube da dispensa quando já estava no elevador.

O general é o terceiro ministro a deixar a equipe de Bolsonaro após polêmicas com a ala ideológica do governo. O primeiro foi Gustavo Bebianno, que comandava a Secretaria Geral da Presidência, e o segundo, Ricardo Vélez Rodrígues, no Ministério da Educação.

Em abril, Santos Cruz desautorizou uma ordem da Secom para que todo o material de propaganda da administração pública passasse por análise prévia da pasta. A determinação da Secom, que é subordinada à Secretaria de Governo, veio um dia depois de Bolsonaro mandar suspender a propaganda do Banco do Brasil por considerar que os comerciais – exibindo representantes da diversidade racial e sexual – tinham viés ideológico. À época, Bolsonaro não escondeu a irritação com Santos Cruz.

No mês passado, o general emplacou um auxiliar como presidente do Conselho de Administração da EBC, vetando Wajngarten. O núcleo olavista reforçou a ofensiva para derrubar o ministro e seguidores de Bolsonaro postaram nas redes a hashtag #ForaSantosCruz. Olavo de Carvalho chegou a escrever: “Controlar a internet, Santos Cruz? Controlar a sua boca, seu m...” Os militares saíram em defesa do ministro e conseguiram segurá-lo, mas não por muito tempo. Na prática, o grupo ideológico do governo sempre quis ter mais poder na Secom, na Educação e na Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex).