O Estado de São Paulo, n.45894, 13/06/2019. Política, p. A12

 

Nos últimos seis meses, Lava Jato desacelera no STF

Rafael Moraes Moura 

13/06/2019

 

 

Ministro. Edson Fachin é relator da operação no STF

A Operação Lava Jato caminha a passos lentos no Supremo Tribunal Federal. Um balanço divulgado nesta semana pelo relator da Lava Jato, ministro Edson Fachin, aponta que a investigação que apura desvios bilionários na Petrobrás não teve avanços significativos nos últimos seis meses. De dezembro até agora, a Procuradoria-Geral da República apresentou apenas uma nova denúncia no STF, nenhum acordo de colaboração premiada foi homologado e nenhum político foi condenado na operação.

Um dos casos que exemplificam esta lentidão é o do “quadrilhão do PP”. Por 3 votos a 2, a Segunda Turma decidiu anteontem aceitar denúncia – apresentada em setembro de 2017 pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot – contra quatro parlamentares do PP por organização criminosa.

Fachin liberou o processo para análise dos colegas em 13 de março. O julgamento, inicialmente marcado para 9 de abril, foi adiado cinco vezes e só concluído nesta semana. Agora, com o recebimento da denúncia, será aberta ação penal e as investigações de integrantes do Centrão serão aprofundadas.

Até hoje, o único político condenado pelo Supremo na Lava Jato é o ex-deputado federal Nelson Meurer (PP-PR), sentenciado a 13 anos, 9 meses e 10 dias de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Meurer segue em liberdade. Ainda está pendente de análise um recurso do ex-parlamentar para se livrar da cadeia.

O andamento da Lava Jato no Supremo não depende apenas de Fachin, que é auxiliado por quatro juízes. A velocidade com que os casos avançam também têm relação com o trabalho da Procuradoria-Geral da República, da Polícia Federal e do ministro-revisor da operação no tribunal, Celso de Mello.

‘Qualidade’. Nos últimos seis meses, a Procuradoria apresentou apenas uma denúncia na Corte no âmbito da operação – contra o senador licenciado Fernando Collor (PROS-AL), por peculato. Desde 2018, apenas um acordo da Lava Jato acertado pela equipe da procuradorageral da República, Raquel Dodge, foi homologado pelo Supremo – o do lobista Jorge Luz, que implica o senador Renan Calheiros (MDB-AL). A atual gestão da Procuradoria alegou que o “boom das delações” passou e não há preocupação com números, mas, sim, com a qualidade e a efetivação dos acordos.

Em agosto do ano passado, duas ações penais da Lava Jato foram enviadas ao gabinete de Celso de Mello – e até hoje não foram liberadas pelo ministro para julgamento na Segunda Turma. Para integrantes do tribunal, o revisor tem estilo centralizador e detalhista, o que afeta a velocidade dos processos.

As investigações em seu gabinete dizem respeito ao ex-senador Valdir Raupp (MDB-RO) e ao deputado Aníbal Gomes (DEM-CE). Procurado, Celso de Mello disse que a ação de Aníbal Gomes está “em análise e estudo” para que seja levada a julgamento ainda neste mês. Sobre Raupp, informou que o caso deve ficar para o segundo semestre.

Para o professor de direito constitucional Paulo Blair, da Universidade de Brasília (UnB), a Lava Jato anda no Supremo na velocidade possível, considerando as atribuições da Corte. Blair lembrou que, enquanto em Curitiba há uma equipe que cuida especificamente da operação, no STF os ministros têm de decidir sobre milhares de processos. O acervo de Fachin reúne mais de 4 mil processos; o de Celso de Mello, 2,8 mil. “Não está devagar, está no ritmo que dá para ser, considerando um tribunal desse tamanho”, afirmou o professor.

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Fachin descarta 'retrocesso' na operação

13/06/2019

 

 

O relator da Lava J atono Supremo Tribunal Federal ( STF ), ministro Edson Fachin, disse ao Estado que a operação é uma“re alidade” e“nadai rá macular seus avanços no combate à corrupção e ao crime organizado”. “Aliás, as suas contribuições ao Brasil são inequívocas, quer sob o ponto de vista jurídico e econômico, quer sob o enfoque ético, quer soba ótica da aplicação não seletiva do Direito Penal”, afirmou Fachin.

O discurso de Fachin em defesa da operação ocorre após o site The Intercept Brasil publicar conteúdo vazado de supostas mensagens trocadas pelo então juiz federal Sérgio Moro e o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol. As conversas mostrariam que Moro teria orientado investigações da Lava Jato em mensagens trocadas por meio do aplicativo Telegram.

“Ciente da necessidade de respostas céleres e eficazes à sociedade, seguimos cumprindo com esse dever constitucional imprimindo aos feitosa velocidade proporcional de seus objetos e ritos, tanto que temos ações penais em revisão e inquéritos em pauta para o imprescindível exame pelo colegiado”, afirmou o ministro, por escrito, quando questionado sobre o andamento da operação.

De acordo com balanço divulgado pelo gabinete de Fachin nesta semana, foram arrecadados R$ 784,8 milhões com as multas fixadas nos acordos de colaboração premiada – desse total, R$ 535,2 milhões são de delações de 77 executivos e exexecutivos da Odebrecht.

Freio. O levantamento aponta que, desde 2018, apenas um acordo de delação foi firmado na gestão da atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Desde dezembro do ano passado, uma nova denúncia foi apresentada ao STF – contra o senador licenciado Fernando Collor (Pros-AL), por peculato.

Na PGR, a avaliação é a de que a redução no número de acordos pode ser explicada por alguns fatores. Um deles é o fato de o STF ter restringido o alcance do foro privilegiado para os crimes cometidos no exercício do mandato e em função do cargo. Dessa forma, a equipe de Raquel tem feito uma análise prévia de potenciais delações, deixando com a PGR apenas os casos que poderiam ser efetivamente investigados no STF – os demais são encaminhados para a força-tarefa de Curitiba e do Rio, por exemplo.

No mês passado, Raquel estabeleceu novas cláusulas em acordos de colaboração premiada para assegurar o ressarcimento ao erário. Passará a constar nos acordos firmados pelo MPF a previsão de que os condenados somente poderão pagar multas a autoridades estrangeiras quando ao menos o mesmo valor que se pretende pagar o exterior tiver sido efetivamente saldado no Brasil. Para Raquel, o acusado deve ressarcir primeiro os cofres públicos brasileiros antes de indenizar outros países.

A procuradora já se colocou à disposição do presidente Jair Bolsonaro para ser reconduzida ao cargo por mais dois anos, mesmo sem se inscrever para a lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Parlamentares do Centrão defendem a sua permanência na PGR por considerá-la “previsível” e “discreta” e por temerem um nome “linha-dura” à frente do órgão./ R.M.M.