O globo, n. 31366, 23/06/2019. País, p. 4

 

A régua do parlamento

Bruno Góes

Daniel Gullino

23/06/2019

 

 

 Recorte capturado

Congresso resiste a agenda bolsonarista, mas avança em medidas econômicas

Nesses quase seis meses de governo, o Congresso tem resistido à pauta mais identificada com o discurso de campanha do presidente Jair Bolsonaro, a chamada “agenda bolsonarista”, mas as medidas econômicas vem avançando entre os deputados e senadores. O GLOBO analisou a tramitação das 32 propostas legislativas apresentada por Bolso na roque dependem de aprovação do Congresso. Desde que assumiu o cargo, ele editou 17 Medidas Provisórias (MPs), dez projetos de lei, quatro projetos de lei complementar e uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Além disso, Bolsonaro editou uma média de um decreto por dia, alguns deles derrubados por deputados e senadores.

Apauta econômica tem ti doum tratamento diferenciado. Apesar deter sofrido alterações que levaram o ministro da Economia, Paulo Guedes, a entrar em rota de colisão com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a reforma da Previdência deve ser votada em breve na comissão especial. A proposta é prioridade do Executivo e foi encampada pela maioria da Casa. Além da reforma da Previdência, a Câmara resolveu dar andamento a uma reforma tributária por conta própria. Os parlamentares também aprovaram a MP destinada a combater fraudes no INSS e outra, editada pelo expresidente Michel Temer mas encampada pela gestão Bolsonaro, que abriu o mercado para companhias aéreas estrangeiras.

O Congresso ainda aprovou um crédito emergencial de R$ 248,9 bilhões para o governo. Outras iniciativas que contam com apoio são o plano de equilíbrio fiscal dos estados, apresentado recentemente, e a proposta que facilita a abertura de empresas, chamada pelo Planalto de MP da Liberdade Econômica. O presidente da Câmara também manifestou a intenção de fazer andar o projeto de autonomia do Banco Central, que interessa ao ministro Paulo Guedes.

— A pauta econômica demonstra uma maturidade do Congresso. Não adianta usar isso pra impor derrota a Bolsonaro, com 14 milhões de desempregados e uma situação das contas públicas que todos sabem como está. Cada derrota na área econômica seria uma derrota para o país — disse o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP). Por outro lado, o Congresso barrou propostas da “agenda bolso na ri sta ”, que atende a nichos específicos que a poiam o presidente. Logo em fevereiro, o governo editou decreto alterando a Lei de Acesso à Informação para ampliar o número de pessoas autorizadas a classificar documentos sigilosos. A medida, que atendia demanda dos militares, foi derrubada pela Câmara. Outro tema caro a Bolsonaro e para a chamada bancada da bala que o apoia é a agenda das armas. As flexibilizações no Estatuto do Desarmamento, feitas por decreto, já foram derrubadas no Senado. A Câmara deve fazer o mesmo nesta semana.

No horizonte, há mais derrotas na agenda da segurança pública. O pacote anticrime coleciona críticas. A previsão é que seja retirada da versão final a “imunidade” para agentes de segurança que matem em conflito, conhecido como excludente de ilicitude.

— O Congresso não deve pautar a questão ideológica nem a pauta de perfumaria, essa pauta de costumes, porque isso não vai mudar a vida das pessoas —disse o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO). Entregue pessoalmente por Bolsonaro à Câmara, o projeto que afrouxa regras de trânsito, outra agenda setorizada do presidente, também não deve passar incólume. A dispensa de multa para quem deixa de usar a cadeirinha para crianças e de exame toxicológico para caminhoneiros enfrentam resistência e críticas públicas de Rodrigo Maia. Bolsonaro também propôs medidas que atendem à pauta de costumes defendida na campanha, como o projeto de homeschooling, que regulamenta a educação em casa.

Comparação com passado

Até agora, o presidente enviou ao Congresso mais propostas (32) do que seus antecessores imediatos: Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff propuseram em seus primeiros mandatos, respectivamente, 30 e 20 alterações legais no mesmo período. Bolsonaro aprovou até agora três MPs: da reorganização do governo, de combate a fraudes no INSS e gratificações para membros da Advocacia-Geral da União. A primeira, embora seja contabilizada como uma vitória, teve alterações importantes, como a retirada do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) da alçada do ministro Sergio Moro (Justiça), e da atribuição de demarcar terras indígenas do Ministério da Agricultura.

Essa última foi revertida por Bolsonaro com a edição de uma nova MP, o que já provoca reações no Congresso. Enquanto algumas medidas do governo têm tramitação lenta, o presidente viu o Congresso aprovar, por iniciativa própria e com rapidez, duas PECs que contrariam seus interesses: a do Orçamento Impositivo e a que alterou a tramitação das MPs.

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‘Querem me deixar como rainha da Inglaterra?’

Gustavo Maia

André de Souza

23/06/2019

 

 

Bolsonaro reclamou de projeto aprovado pelo Congresso que restringe suas indicações para agências reguladoras

O presidente Jair Bolsonaro reclamou ontem do projeto aprovado pelo Congresso instituindo o novo marco das agências reguladoras. A proposta restringe as escolhas que ele pode fazer para as diretorias desses órgãos. Ao comentar o projeto, Bolsonaro questionou se querem deixá-lo como a rainha da Inglaterra, que, apesar do cargo, não comanda o governo. —Pô, querem me deixar como rainha da Inglaterra? Não sei. Esseéo caminho certo ?— questionou ele, que conversou com jornalistas após passar por exames no serviço médico do Palácio do Planalto. Para Bolsonaro, as agências são um “poder paralelo” que travam as ações dos ministérios:

— As agências travam os ministérios. Travam. Você fica sem ação. Tem que negociar com agência. É um poder paralelo —afirmou. O projeto, aprovado pela Câmara em 2018 e pelo Senado em maio deste ano, aguarda a sanção de Bolsonaro para virar lei. O presidente tem até terça-feira para fazer isso ou vetá-lo. Ao GLOBO, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), rebateu:

—Não vou comentar, pois acho que ele não compreendeu o projeto de lei. Hoje, o presidente pode escolher qualquer brasileiro de reputação ilibada, formação universitária e elevado conhecimento para ser nomeado para uma agência, precisando depois de aprovação do Senado. O novo marco estabelece um processo público prévio para formular uma lista tríplice.

O texto final que saiu do Congresso proíbe a indicação de políticos e parentes para as agências reguladoras, além de prever a adoção de práticas para prevenir riscos de corrupção e a perda de mandato de diretores que violarem a lei. Também ficou proibida a recondução dos diretores após o término de seus mandatos, que aumentaram de quatro para cinco anos. Os que estiverem no cargo hoje, porém, ainda poderão ser reconduzidos. Os novos diretores também deverão apresentar comprovada experiência na área das agências.

Defesa anterior

Criticado por Bolsonaro, o projeto foi defendido no ano passado pelo atual secretário executivo do Ministério da Economia, Marcelo Guaranys — número 2 da pasta comandada por Paulo Guedes. Expresidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Guaranys disse que a proposta efetiva a autonomia das instituições, fortalece a governança e o controle social.