O Estado de São Paulo, n. 45896, 15/06/2019. Política, p. A10

 

Bolsonaro critica STF por julgar homofobia

Renata Agostini

Rafael Moraes Moura

15/06/2019

 

 

Decisão vai prejudicar os próprios gays, diz presidente; já Raquel Dodge elogia

O presidente Jair Bolsonaro classificou como “completamente equivocada” a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de criminalizar a homofobia no País. Segundo ele, a Corte está “legislando” e a decisão “aprofunda a luta de classes” no Brasil. Já a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, elogiou o entendimento dos ministros.

“Se alguém der uma facada ou tiro em alguém por ser gay, a pena deveria ser agravada”, disse ele ontem, em café com jornalistas no Palácio do Planalto, no qual o Estado esteve presente.

Para Bolsonaro, a decisão prejudica os próprios homossexuais, pois, segundo ele, as empresas pensarão “duas vezes” antes de oferecer emprego a alguém com essa orientação sexual. “Acho que o Congresso tomará medidas contra a decisão do Supremo”, afirmou.

Por 8 votos a 3, homofobia e transfobia foram enquadradas como racismo. Para os ministros, a legislação sobre racismo, em vigor desde 1989, também deve ser aplicada para quem pratica condutas discriminatórias homofóbicas e transfóbicas.

Na prática, não haverá mudança em texto de nenhuma lei, só o entendimento do Supremo de que essa deve ser a conduta dos juízes e dos delegados em ocorrências de discriminação por orientação sexual.

Bolsonaro voltou a falar ainda que avalia a possibilidade de indicar um evangélico para o STF. “Especialmente agora”, disse, em referência à decisão sobre homofobia. O próximo a sair da Corte deve ser o decano Celso de Mello, que completa 75 anos em novembro de 2020

Desde o início do ano, a bancada evangélica do Congresso vinha pressionando o STF para que não entrasse na “agenda de costumes”, o que incluía a criminalização da homofobia. Grupos religiosos fizeram campanha nas redes sociais pela retirada do tema de pauta.

O tribunal deixou claro que a repressão contra a homofobia não restringe o exercício de liberdade religiosa. Fiéis, pastores e líderes religiosos têm garantido o direito de pregar suas convicções, desde que essas manifestações não se convertam em discursos de ódio, incentivando hostilidade ou a violência contra LGBTs.

Em maio, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou projeto que criminaliza a homofobia, mas que faz exceção para a liberdade religiosa. O texto veda a restrição de manifestação “de afetividade em local público ou privado aberto ao público”, mas a regra não vale para templos religiosos. Ainda serão votadas emendas ao texto.

Parlamentares também viram usurpação de competência do Legislativo. Um dos críticos foi o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

PGR. Raquel Dodge, por outro lado, disse que a decisão vai em caminho “seguro” e “em busca da construção de uma sociedade mais justa e igualitária, em que haja espaço para todos”.

Juristas também elogiaram a medida, por aumentar o sistema de proteção à comunidade LGBTs e permitir uma melhor identificação dos casos de violência no País.