Título: Amigo de Cachoeira quer jogo legalizado
Autor: Almeida, Amanda
Fonte: Correio Braziliense, 09/10/2012, Política, p. 7

Deputado flagrado em mais de 100 conversas com o bicheiro goiano não teme cassação do mandato e vai negar à CPI que tenha cometido "ato ilícito"

Amanda Almeida

Suspeito de receber propina do bicheiro Carlinhos Cachoeira, com o qual foi flagrado pela Polícia Federal em mais de 100 conversas telefônicas, o deputado federal Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO) marca, com o depoimento que prestará hoje, a reabertura da CPI que investiga as relações do contraventor. Em entrevista ao Correio, o parlamentar garante que responderá a todas as perguntas dos colegas, reafirma sua amizade com Cachoeira e diz não temer sua cassação. Independentemente das operações ilegais do amigo, Leréia diz que a comissão dá uma “importante contribuição” ao Brasil, que é discutir a legalização do jogo do bicho.

“Não tenho nenhuma estratégia. Vou responder a tudo o que me for perguntado”, promete Leréia. Depois de um acordo político, o deputado, que inicialmente estava na lista de convocados pela comissão, falará na condição de “convidado”. O depoimento estava marcado para 5 de setembro, mas, um dias antes, Leréia avisou que não compareceria, alegando “problemas pessoais”. Além do conteúdo de suas conversas com Cachoeira, o deputado goiano deve ser questionado sobre um celular que teria recebido do contraventor e um avião supostamente comprado em sociedade com ele. Também vai ser cobrado para explicar porque usou um cartão de crédito de cachoeira para comprar jogos de computador. Sem entrar em detalhes sobre as acusações, Leréia nega ter praticado qualquer “ato ilícito”. “Sou amigo (de Cachoeira) há muitos anos. Isso não significa que tenha cometido algum crime.”

Pesa ainda contra Leréia, uma ligação telefônica em que teria avisado ao bicheiro sobre uma investigação da Polícia Federal em andamento. O advogado de Leréia pediu para ter acesso às gravações da PF, mas não conseguiu. “A mídia publicou o que achava relevante. É necessário ouvir as conversas todas. Há trechos que, sem contexto, podem ser mal interpretados”, argumenta.

Leréia diz ainda que a comissão vai contribuir com o debate sobre a legalização do jogo no Brasil. Defensor de mudanças na lei, ele alega que vários países de todo o mundo permitem a exploração de jogos e que famílias brasileiras viajam ao exterior apenas para jogar. “Não dá para ficar nessa proibição de faz de conta”, afirma. Leréia argumenta que a legalização aumentaria a arrecadação de impostos, que poderiam ser investidos em saúde e educação. E completa a defesa: “Muito melhor que os brasileiros jogadores gastem o dinheiro aqui do que no exterior”.

Outra contribuição da CPI, para Leréia, é a discussão sobre contratos públicos. “Acho que deveria haver um limite de contratos que uma empresa pode ter com o governo”, palpita. Ele acha “estranho” a Empreiteira Delta ter “tantas obras” com o poder público. “Com tantos contratos, às vezes, a empresa não dá conta. Quer crescer mais do que dá conta.” Mas o deputado não falou sobre as ligações entre a Delta e Carlinhos Cachoeira.

A amizade com o bicheiro rendeu mais uma dor de cabeça para o deputado. A Comissão de Sindicância da Câmara aprovou parecer que recomenda a cassação do mandato dele. O relatório segue agora para a Comissão de Ética. “Não temo ser cassado. Quem me deu o mandato foi o povo”, diz Leréia. Segundo ele, a relação com o PSDB, que cogitou expulsá-lo, está “muito boa”.

Na retomada das atividades da CPI, será discutida a possibilidade de adiar o fim dos trabalhos, marcado para 4 de novembro. Parlamentares do governo e da oposição, porém, articulam sepultar de vez as investigações, que podem atingir políticos dos dois lados.

“Sou amigo (de Cachoeira) há muitos anos. Isso não significa que tenha cometido algum crime” Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO), deputado federal