Valor econômico, v.20, n.4858, 15/10/2019. Política, p. A8

 

Interesse eleitoral trava saída de deputados do PSL

Raphael Di Cunto 

Marcelo Ribeiro 

15/10/2019

 

 

As pretensões eleitorais de deputados federais do PSL em 2020 são um obstáculo ao plano do presidente Jair Bolsonaro de provocar uma migração em massa para um novo partido ou reunir apoio suficiente para derrubar o presidente da sigla, o deputado Luciano Bivar (PSL-PE), que controla o dinheiro da legenda e pode destituir o comando dos diretórios de quase todo o país.

Ao menos 25 dos 53 deputados pretendem concorrer a prefeito no ano que vem ou têm parentes próximos, como pais, irmãos, esposas e filhos como pré-candidatos. Quase todos -22- estão no grupo que se recusou a assinar a carta articulada por Bolsonaro para cobrar “novas atitudes” e “mais transparência” de Bivar.

Apenas três, da ala mais “ideológica”, são pré-candidatos e assinaram a nota: Filipe Barros (Londrina-PR), Daniel Silveira (Petrópolis-RJ) e Hélio Lopes, que se elegeu com o nome de “Hélio Bolsonaro” e é um possível nome do PSL no Rio de Janeiro para se contrapor à candidatura do deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL).

Os demais evitam entrar em confronto com Bivar publicamente, seja pela relação de proximidade com o presidente do partido, que negociou a divisão de espaços da sigla na Câmara e nos diretórios estaduais, seja por um interesse em receber parte do fundo eleitoral e partidário no ano que vem, além de garantir espaço expressivo na propaganda eleitoral na TV e rádio, o que não teriam num partido nanico ou recém-criado, já que esses ativos eleitorais ficariam no PSL.

O PSL deve receber R$ 112 milhões de fundo partidário em 2020 e cerca de R$ 180 milhões do fundo eleitoral. O dinheiro será usado para impulsionar candidaturas a prefeito, mas o presidente da sigla já ameaçou deixar sem recursos quem o confrontar. O tesoureiro do partido é José Tupinambá Coelho, ex-diretor da seguradora Excelsior, que pertence a Bivar.

“Não há guerra, há debate. É como um Big Brother onde todo mundo quer ganhar e só tem um cofre. A briga é pela chave desse cofre”, disse o líder do PSL na Câmara, delegado Waldir, que comanda a sigla em Goiás. Ele defende a permanência de Bolsonaro, mas diz que o presidente deve desculpas a Bivar e que, embora sejam todos aliados de Bolsonaro, há um grupo “mais sensato” e “não cegamente bolsonarista”.

Estão nessa situação, por exemplo, aliados de Bolsonaro ainda na época da pré-campanha à Presidência, como Heitor Freire (CE), que se lançou em Fortaleza e comanda o PSL no Estado, a professora Dayene Pimentel (BA), que pretende concorrer em Feira de Santana, o coronel Chrisóstomo (RO), que pode disputar em Porto Velho, e Julian Lemos, ex-coordenador de Bolsonaro no Nordeste, pré-candidato em João Pessoa.

Também estão nesse rol deputados ligados as forças de segurança pública e que têm pretensões eleitorais em suas cidades, como o delegado Marcelo Freitas (Montes Claros-MG), delegado Pablo (Manaus) delegado Antônio Furtado (Volta Redonda-RJ) e coronel Armando (Joinville-SC).

Vista com desconfiança por Bolsonaro, a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann, pretende concorrer à Prefeitura de São Paulo. Júnior Bozzella, que assumiu a linha de frente do grupo contra Bolsonaro, quer concorrer em Santos (SP). Charlles Evangelista defende que a companheira, delegada Sheila, concorra em Juiz de Fora (MG), mas Bolsonaro quer eleger o presidente da Santa Casa que o salvou da facada na campanha.

Há também os parentes: o deputado Nereu Crispim, presidente do PSL no Rio Grande do Sul, trabalha para eleger a esposa em Canoas, enquanto o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Felipe Francischini (PR), tem o pai, o deputado estadual Fernando (PSL), como candidato em Curitiba. Lourival Gomes quer emplacar o filho como prefeito de Saquarema (RJ).

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Bolsonaro rejeita acordo com Bivar e exige auditoria 

Fabio Murakawa 

Matheus Schuch 

15/10/2019

 

 

O presidente Jair Bolsonaro não está disposto a fazer acordo com o presidente do PSL, o deputado Luciano Bivar (PE), para permitir que o grupo que o apoia deixe o partido sem perder o mandato, porém abrindo mão do direito ao fundo partidário, disse seu advogado Admar Gonzaga ao Valor.

O presidente manteve ontem uma série de encontros com aliados no Palácio do Planalto, entre eles alguns parlamentares do PSL. Porém, ele se recusou a receber deputados próximos a Bivar. O gesto sinaliza que Bolsonaro trabalha para deixar o PSL e que há poucas chances de reconciliação.

Ao todo, cerca de 20 dos 53 deputados federais da legenda estariam dispostos a acompanhar o presidente. O pano de fundo dessa rixa é a disputa por recursos do fundo eleitoral e o controle da máquina partidária entre o grupo de Bolsonaro e o de Bivar.

A agenda de Bolsonaro no Planalto começou com um encontro com Gonzaga e a advogada Karina Kufa, que tentam encontrar saída jurídica que possibilite a manutenção dos mandatos.

Segundo Gonzaga, a questão central do desentendimento entre Bolsonaro e a cúpula do PSL não é o fundo partidário, mas sim a transparência no uso dos recursos do partido. “Ninguém conversa sobre fundo. Essa rixa é a narrativa deles [do grupo de Bivar], e não nossa”, disse ele.

Gonzaga afirmou ter tomado conhecimento “pela imprensa” da oferta de Bivar e a criticou. “É mais uma demonstração de que a intenção dele [Bivar] é manter dinheiro público em uma gestão sem auditoria, sem fiscalização, nas mãos do grupo que se acomodou no poder”, afirmou Gonzaga.

Questionado a respeito da oferta da possibilidade de aceitar a possibilidade de deixar o partido sem os recursos do fundo, Gonzaga afirmou: “O grupo do presidente Bolsonaro não está disposto a conceder nesse sentido. O dinheiro [do fundo partidário] não é dele. É um patrimônio do eleitor”, afirmou. “Para ele [Bolsonaro] não tem conversa. É prestação de contas e auditoria das contas do partido”, disse.

Na última sexta-feira, os advogados do presidente e parlamentares que o apoiam protocolaram um pedido de acesso à prestação de contas do partido. Bolsonaro quer uma auditoria nas contas do partido, alegando que há falta de transparência.

Gonzaga afirmou que quem deve decidir sobre o destino do fundo partidário será o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), do qual ele já fez parte como ministro.

Líder do governo na Câmara, o deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO) afirmou que o partido só existe por causa de Bolsonaro. “O PSL teria muito provavelmente acabado se não tivesse dado a legenda para o presidente, por causa da cláusula [de barreira] que foi imposta pela lei. O presidente teve 57 milhões de votos.” Após se encontrar com Bolsonaro, o líder afirmou que “o mais importante para quem está desse lado é a manutenção do vínculo e da lealdade com o presidente”.

Porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros falou em “divórcio” para descrever o relacionamento de Bolsonaro com o PSL. “O presidente analisa no dia a dia [a situação com o partido] e usa uma metáfora que lhe é usual: qualquer casamento é passível de divórcio”, afirmou. Sobre as trocas de farpas entre o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), e o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), o porta-voz disse: “O presidente não comentou o contencioso entre o major Olímpio e seu filho, mas lembrou que o apoiou últimas eleições e ajudou a conseguir os votos que o tornaram o mais votado”. Próximo a Olímpio, o deputado Coronel Tadeu (PSL-SP) esteve no Planalto, mas Bolsonaro se recusou a recebê-lo. “Eduardo, Carlos e Flávio precisavam baixar o tom da voz, para o bem de todos”, afirmou.