O globo, n. 31404, 31/07/2019. Economia, p. 19
Entrevista - Marcos Troyjo: 'O intercâmbio está muito aquém do seu potencial'
Marcos Troyjo
Eliane Oliveira
31/07/2019
O secretário de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais, Marcos Troyjo, se reúne hoje, ao lado do ministro da Economia, Paulo Guedes, com o secretário de Comércio americano, Wilbur Ross. Para Troyjo, o fluxo de comércio Brasil-EUA está aquém do que deveria.
Qual a importância da vinda do secretário de Comércio dos EUA ao Brasil?
O mais importante é que o intercâmbio econômico comercial entre Brasil e EUA tende a aumentar, porque está muito aquém do seu potencial. São as duas maiores economias do continenrio te americano. Esse intercâmbio tem que ser aumentado e aperfeiçoado.
Como isso pode se concretizar?
Temos elementos de conjuntura muito favoráveis. Há uma coincidência de propósitos grande entre os chefes de Estado. Euma coincidência de propósitos com o presidente Mauricio Macri (da Argentina).
O senhor se refere a um acordo entre EUA e Mercosul?
Há várias formas de fazer a parceria econômica comercial avançar. Quando ela envolve tarifas, é necessário, como o Brasil faz parte de uma união aduaneira, envolver outros sócios do Mercosul. Seriam tratativas Mercosul-EUA.
O presidente Donald Trump tem poder para negociar um acordo com o Mercosul, ou o Brasil, independentemente do Congresso americano?
Quando os acordos envolvem tarifas e os EUA os fazem não país a país, mas país e bloco, por exemplo, é necessá que a Casa Branca conte com o chamado TPA (Trade Promotion Authority, ou fast track). O governo americano tem esse instrumento à mão até junho de 2021.
Qual sua expectativa para a reunião de Guedes com o secretário Wilbur Ross?
Eles se conhecem há bastante tempo. Têm uma excelente relação, e isso vai se refletir muito positivamente na expansão das relações econômico-comerciais entre Brasil e EUA.
Brasil e EUA competem no agronegócio em terceiros mercados. Isso é um problema?
Onde somos competidores, podemos formar joint ventures (parcerias) para ganhar escala.
Por que o comércio bilateral está aquém do que deveria?
Se o Brasil tivesse adotado estratégia baseada na integração das cadeias globais de valor, em vez de ficar atrelado ao paradigma da substituição de importações, talvez tivesse um fluxo comercial maior não apenas com os EUA, mas com todos os eixos dinâmicos da economia global. Provavelmente não teríamos tido quatro décadas perdidas.
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Trump quer negociar
Eliane Oliveira
Gustavo Maia
Manoel Ventura
Ana Letícia Leão
31/07/2019
Americano faz elogios a Bolsonaro e filho
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou ontem que deseja um acordo comercial com o Brasil e elogiou Jair Bolsonaro, que disse ser “um grande cavalheiro” com quem tem um “relacionamento fantástico”. Com relação à indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada brasileira em Washington, Trump disse não ver nepotismo, acrescentando que Eduardo é “fantástico, um grande jovem”. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, considerou as declarações de T rum pum sinal de que o presidente americano vê deforma positiva a indicação de Eduardo para o posto.
—Tenho um ótimo relacionamento com o Brasil. Tenho um relacionamento fantástico com o presidente. Ele é um grande cavalheiro. Acho que ele está fazendo um ótimo trabalho—disse Trump.
—Vamos trabalharem um acordo de livre comércio com o Brasil. O Brasil é um grande parceiro comercial.
No sábado, Bolsonaro havia afirmado que o propósito de nomear Eduardo embaixador nos EUA era buscar parcerias para explorar minério em terras indígenas:
— Por isso, eu quero uma pessoa de confiança minha na embaixada dos EUA — afirmou.
— Quero contato rápido e imediato com o presidente americano.
Os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, perdendo apenas para a China. Mas, enquanto os chineses compram basicamente produtos agropecuários e minérios, os americanos são grande consumidores de manufaturados brasileiros, como aviões, turbinas e peças para aeronaves, gasolina, máquinas e equipamentos do Brasil.
A balança comercial no primeiro semestre com os EUA foi favorável ao Brasil em quase US$ 1 bilhão, com exportações de US$ 14,7 bilhões e importações de US$ 13,7 bilhões.
Há duas possibilidades de acordo. Um envolveria os quatro países do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), tendo como foco a queda de tarifas de importação. O outro abrangeria exclusivamente Brasil e EUA e seria ainda mais ambicioso, com a inclusão de outras áreas além da comercial.
O secretário de Comércio Exterior, Marcos Troyjo, vê inclusive a possibilidade de Brasil e EUA formarem joint ventures em terceiros mercados onde hoje são concorrentes. Por isso a aproximação comercial entre os dois países tem tanta importância.
— A manifestação do presidente Trump de que quer um acordo comercial com o Brasil é muito bem-vinda. Reflete a nova qualidade do relacionamento Brasil-EUA e inclusive pode ser considerada um sinal de que os EUA receberam muito positivamente a indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada em Washington. O Brasil está pronto para sentar-se à mesa com os EUA para definir as modalidades de uma negociação — disse o chanceler Ernesto Araújo.
Ao receber repórteres na Casa Branca, porém,Trump não deu detalhes sobre como estão essas negociações. O secretário de Comércio dos EUA,Wilbur Ross,está no Brasil e hoje vai encontrar o presidente Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes.
Ao ser perguntado sobre Eduardo, Trump afirmou:
— Conheço o filho dele, eu acho que o filho dele é fantástico, um grande jovem. Estou muito feliz por ele ter sido indicado, espero que seja nomeado — disse. — Não acho que é nepotismo, porque o filho dele ajudou muito na campanha. Ele é fantástico.
Sua filha Ivanka e o marido dela, Jared Kushner, estão entre os principais assessores de Trump. Bolsonaro agradeceu:
— Obrigado ao Donald Trump, favorável à ida de Eduardo Bolsonaro como embaixador nos Estados Unidos. Demonstra a confiança que ele tem no governo e também a confiança que tem no meu filho, que é amigo dos familiares dele. Temos certeza que, caso o Senado aprove a ida para lá, os nossos laços comerciais serão fortalecidos.
Eduardo, que é presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, esteve com Trump na primeira viagem oficial do presidente brasileiro ao exterior, a Washington, em março. Na semana passada, Bolsonaro confirmou que o nome do filho foi indicado para Washington e que aguarda confirmação.
O governo brasileiro argumenta que o fato de Eduardo ter conhecido Trump, seus familiares e outros personagens poderosos de Washington é uma das principais motivações para a nomeação. Há a expectativa de que o acesso do hoje deputado federal à Casa Branca será facilitado, propiciando comunicação direta entre o Planalto e Washington.
'Píluas de veneno'
Para Zilda Mendes, professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie nas áreas de comércio exterior e câmbio, as negociações com os EUA chegariam em boa hora. Entre os principais itens que poderiam entrar no acordo, ela destacou a transferência de tecnologias. Segundo ela, quanto maior o leque de opções, melhor para o setor produtivo brasileiro.
Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, seria melhor esperar a internalização do tratado de livre comércio do Mercosul com a UE, o que deve levar cerca de dois anos:
— Nesse período, o Brasil pode aumentar seu cacife, ao aprovar reformas como a tributária e a previdenciária.
Sobre esse acordo, o secretário Wilbur Ross pediu que os representantes dos dois blocos sejam cuidadosos para não haver poison pills (pílulas de veneno) no texto.
— Tenham cuidado ao refinar o contrato, para garantir que não haja pílulas de veneno que nos impeçam de liderar um acordo realmente verdadeiro com o Brasil — disse Ross em evento na Câmara de Comércio Brasil-EUA.
Ele ressaltou que a Europa é diferente dos EUA:
— Temos diferenças sobre padrões, alimentos, produtos químicos, automotivos. Por favor, tenham cuidado para não ameaçar algo que seria inconsistente com eles em um contrato livre com a gente.