Título: Pela Ficha Limpa
Autor: Paganini, Arthur
Fonte: Correio Braziliense, 10/10/2012, Cidades, p. 26

A indefinição sobre o resultado do pleito do último domingo em Santo Antônio do Descoberto, município goiano distante 45km de Brasília, revoltou os moradores da cidade. Ontem, cerca de 200 pessoas vieram à capital para protestar em frente ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Eles pedem agilidade no julgamento do registro de candidatura de Padre Getúlio (PMDB), que concorreu e venceu a disputa com 12.208 votos. O caso é analisado pelo ministro Marco Aurélio Mello, que pode decidir a questão de forma monocrática, se entender que o conteúdo da matéria já foi pacificado pela Corte. A Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) ainda deve se manifestar no processo.

Em primeira instância, o juízo municipal negou o registro da candidatura do peemedebista, seguindo entendimento do Ministério Público Eleitoral (MPE). Ele teve duas condenações por improbidade administrativa relativas ao período que chefiou o Executivo municipal, entre 1997 e 2000. Na última decisão, transitada em julgado em março de 2001, o ex-gestor teve suspensos os direitos políticos por oito anos, prazo que se encerraria em 2009. Contudo, Padre Getúlio recorreu da sentença por meio de uma ação rescisória e, provisoriamente, conseguiu suspender a determinação sobre a sua inelegibilidade.

Baseado na liminar, Padre Getúlio obteve uma certidão na vara de Fazenda Pública do município de que estaria em dia com a Justiça Eleitoral e, portanto, poderia concorrer ao pleito deste ano. "Mas o documento estava completamente equivocado. Quando contamos o período de suspensão dos direitos políticos dele, levando-se em conta a interrupção temporária do prazo, constatamos que ele só terminaria de cumprir a pena em 25 de julho de 2012, 20 dias depois do prazo final para registro de candidaturas", explica o promotor da cidade, André Wagner Melgaço Reis.

No Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE-GO), o recurso de Padre Getúlio foi aceito e ele recebeu autorização para disputar a prefeitura. "Entendeu-se que o fato de ele estar apto a partir do dia 25 seria suficiente para liberá-lo, mas essa avaliação, do ponto de vista do MPE, não procede. Por que a lei estipularia um limite para o registro de candidaturas?", questiona Reis. No TRE-GO, a decisão de liberar o representante do PMDB foi unânime, mas a Procuradoria Regional Eleitoral recorreu ao TSE.

Mobilização

O imbróglio que se arrasta nos tribunais mobilizou a população de Santo Antônio do Descoberto. Em três ônibus, aproximadamente 200 pessoas deixaram a cidade na manhã de ontem para protestar em frente à sede do TSE. A professora e artista circense Hera Augusto, 23 anos, fantasiou-se de palhaça para pedir agilidade no julgamento do caso. "Estou aqui para pedir que o tribunal leve em consideração a Lei da Ficha Limpa, que deveria ter tirado o Padre Getúlio da disputa. Viemos reivindicar os direitos da nossa cidade, que não pode ficar nas mãos de quem é ficha suja", reclamou.

O aposentado Genésio Argemiro dos Santos, 69 anos, também fez questão de comparecer ao ato. Pioneiro na cidade, ele levou um dos três filhos para acompanhar a manifestação. "A Justiça é quem melhor conhece o passado do Padre Getúlio. Estou em Santo Antônio desde 1974 e já vi ele ganhar outra eleição que acabou impedido de assumir. Ele está sempre na Justiça tentando limpar o nome", disse. Uma comitiva de quatro representantes do movimento se reuniu com a assessoria do relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello. O processo deverá ser encaminhado para parecer da PGE. A manifestação ocorreu sem registro de problemas.

Para saber mais Iniciativa popular A Lei da Ficha Limpa foi sancionada em 2010. O projeto que deu origem à norma chegou ao Congresso depois de 1,3 milhão de brasileiros assinarem um documento pedindo a sua criação. Dois anos depois, ela foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Por sete votos a quatro, ficou decidido que o texto valeria a partir deste ano. A principal medida é barrar a candidatura de condenados pela Justiça. Segundo a presidente do TSE, ministra Cármem Lúcia, todos os casos de pessoas que driblaram a lei serão julgados até a data de diplomação, em 19 de dezembro.