O Estado de São Paulo, n. 45882, 01/06/2019. Política, p. A10

 

‘Como o pão que o diabo amassou’, diz Bolsonaro

 

 

 

 

Teo Cury

Amanda Pupo / BRASÍLIA

01/06/2019

 

 

Em almoço com caminhoneiros, presidente defende governo e ouve queixas sobre diesel

Em almoço de pouco mais de quarenta minutos com caminhoneiros em um restaurante de beira de estrada em Anápolis (GO), o presidente Jair Bolsonaro disse ontem que está “comendo o pão que o diabo amassou”. “Não loteamos ministérios, bancos oficiais e estatais”, afirmou. Ele deixou claro que, apesar disso, “só muda (de postura) se alguém cassar o seu mandato”. O comentário foi feito após um dos presentes dizer que faltaria boa vontade com o presidente em Brasília.

Bolsonaro se serviu como os demais clientes. Na mesa em que dividiu com cerca de 30 caminhoneiros, o presidente ouviu reclamações sobre o preço do diesel, questionamentos sobre a reforma da Previdência e estimulou os profissionais a requererem porte de arma.

A categoria foi uma das contempladas pelo decreto editado no início do mês que flexibilizou as regras para obtenção de armas. “Eu coloquei lá como profissão de risco (caminhoneiros). Quanto mais arma, mais segurança. Se tiver arma de fogo, é para usar”, disse ao grupo.

O presidente também se comprometeu em acabar com os radares móveis – “para dar uma folga para o policial rodoviário” – e repetiu sua promessa de aumentar a validade da carteira de motorista para dez anos e passar o limite de pontos para 40.

A parada de Bolsonaro foi estratégica. Ele mesmo contou que “foi feito levantamento de onde teria mais caminhões” naquele horário. “Eu estava vindo de Goiânia e paramos aqui para conversar com os caminhoneiros”, afirmou. O governo tem adotado várias medidas para evitar uma greve da categoria. Bolsonaro chegou a interferir em abril, até mesmo, no preço do combustível definido pela Petrobrás.

“O que mais pesa no combustível é o ICMS, que é do Estado. Não é a gente. Por isso que eu trabalho para privatizar o refino. Quanto mais tiver concorrência, melhor. Tá ok?”, disse.

Comitiva. O presidente viajou para Goiânia acompanhado de uma comitiva de 73 pessoas, onde participou da Convenção Nacional das Assembleias de Deus. O grupo o acompanhou no almoço com os caminhoneiros. Na nota fiscal, obtida pelo Estado, constam 73 refeições (self-service a R$ 20 por pessoa) e 26 refrigerantes em garrafas de 2 litros (R$ 9 cada) pagos ao restaurante Presidente - Posto e Churrascaria com cartão em nome da Secretaria de Administração da Presidência da República. O valor total da fatura foi de R$ 1.694.

O almoço serviu como uma espécie de confraternização do presidente com caminhoneiros. O governo disse que não pagou a conta dos “convidados”.

Na comitiva estavam “bombeiros, policiais militares, equipes de combate a incêndio e de saúde”, afirmou a Secretaria de Comunicação da Presidência. De acordo com três integrantes de governos anteriores consultados pelo Estado, a equipe presidencial neste tipo de viagem gira em torno de 40 pessoas. A Secretaria de Comunicação recomendou à reportagem pedir explicações sobre a comitiva ter 73 pessoas via Lei de Acesso, que dá 30 dias para que o governo envie uma resposta.

Ainda segundo o Planalto, Bolsonaro não pagou o próprio almoço, pois foi uma cortesia do restaurante. Um funcionário do estabelecimento que preferiu não ser identificado deu a mesma versão. Ele disse ainda que outras autoridades que comeram no local, como o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, também almoçaram de graça.

A passagem de Bolsonaro pelo restaurante, que fica ao lado de um posto de gasolina em Anápolis (a 69 km da capital goiana), durou cerca de 40 minutos. Bolsonaro chegou e saiu de helicóptero do local. / COLABOROU RAFAEL MORAES MOURA