O globo, n. 31401, 28/07/2019. País, p. 9

 

‘Talvez pegue uma cana’, diz Bolsonaro sobre Glenn

Juliana Dal Piva

Julia Cople

28/07/2019

 

 

Presidente chama jornalista de ‘malandro’ por ter marido e filhos brasileiros e afirma que regra de deportação sumária não se aplica ao americano; para editor do Intercept, declaração é ‘insana’: ‘Ele ainda não é um ditador’

Um dia após a publicação de uma portaria que estabelece regras de deportação sumária para estrangeiros considerados perigosos, o presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que a norma não se aplica ao jornalista americano Glenn Greenwald, editor do site The Intercept, mas o chamou de “malandro” e declarou que ele pode ser preso no Brasil.

—Eu teria feito um decreto porque quem não presta tem que mandar embora. Tem nada a ver com esse Glenn. Nem se encaixa na portaria o crime que ele está cometendo.

Até porque ele é casado com outro homem e tem meninos adotados no Brasil. Malandro para evitar um problema desse, casa com outro malandro ou adota criança no Brasil. O Glenn não vai embora, pode ficar tranquilo. Talvez pegue uma cana aqui no Brasil, não vai pegar lá fora, não —disse. Desde o início de junho, o site The Intercept, comandado por Greenwald, tem publicado o conteúdo de supostas mensagens trocadas entre integrantes da Operação Lava-Jato e autoridades, como o ministro da Justiça, Sergio Moro.

O jornalista é casado há 14 anos com o deputado federal David Miranda (PSOLRJ), com quem tem dois filhos, portanto não poderia ser afetado pela portaria 666/2019, publicada na última sexta-feira.

Pelo Twitter, Greenwald afirmou que não há evidências de que tenha cometido qualquer crime e que Bolsonaro “não tem o poder” de mandar prender pessoas. “Ao contrário dos desejos de Bolsonaro, ele não é (ainda) um ditador. Ele não tem o poder de ordenar pessoas presas. Ainda existem tribunais em funcionamento”, escreveu. Nascido nos Estados Unidos e radicado no Brasil há mais de uma década, o editor do Intercept classificou como “insana” a afirmação de Bolsonaro de que ele teria se casado e tido filhos com um brasileiro para escapar de uma possível deportação. “Sugerir que alguém adotaria — e cuidar de — dois filhos para manipular a lei é nojento.”

Destruição de provas

Bolsonaro foi questionado também sobre a possível destruição das mensagens obtidas nas investigações sobre os hackers, e reafirmou que a decisão não será do ministro da Justiça.

— A decisão de possível destruição não é dele (Moro). Podemos pensar e torcer por alguma coisa, mas o Moro não fará nada do que a lei não permite. Agora, foi uma invasão criminosa. Eu não tive esse problema porque nada trato de reservado nos meus telefones —afirmou.