O Estado de São Paulo, n. 45939, 28/07/2019. Política, p. A8

 

Bolsonaro defende Moro e fala em 'cana' para Glenn

Daniela Amorim

28/07/2019

 

 

Presidente diz que confia em ministro e sugere que jornalista pode ser preso; editor do The Intercept rebate: ‘comentários perturbados’

O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que a decisão sobre eventual destruição do conteúdo obtido na investigação do hackeamento de celulares de autoridades não cabe ao ministro da Justiça, Sérgio Moro. Ele ainda negou que a portaria que permite a deportação sumária de estrangeiros “perigosos” tenha relação com o jornalista Glenn Greenwald, mas disse que o editor e fundador do The Intercept “talvez pegue uma ‘cana’ no Brasil”. O jornalista rebateu e afirmou que as declarações do presidente eram “comentários perturbados”.

As declarações do presidente foram dadas em entrevista durante agenda na Vila Militar, em Deodoro, no Rio. Bolsonaro fazia a referência à portaria publicada anteontem que permite a deportação “sumária” de estrangeiros suspeitos de terrorismo, de integrar grupo criminoso ou organização armada e acusados de tráfico de drogas, pessoas ou armas.

A portaria foi editada por Moro. O site de Greenwald tem publicado, desde junho, supostas mensagens entre o então exjuiz e procuradores da Operação Lava Jato. “Ele (Greenwald) não vai embora. O ‘Green’ pode ficar tranquilo. Talvez pegue uma ‘cana’ aqui no Brasil, não vai pegar lá fora não”, disse. Para o presidente, suspeitos de crime devem ser banidos porque “já tem bandido demais no Brasil”. O presidente se referiu ao jornalista como “malandro” por ter “casado com outro homem” e ter “meninos adotados no Brasil” para evitar problemas. O jornalista é casado com o deputado federal David Miranda (PSOL-RJ).

“Tem que botar pra fora mesmo, quem não presta tem de mandar embora. (A portaria) Não tem nada a ver com o caso desse Green-não-sei-o-quê aí (Glenn Greenwald). Tanto é que não se encaixa nessa portaria o crime que ele está cometendo. Até porque ele é casado com outro homem e tem meninos adotados no Brasil. Malandro, pra evitar um problema desse, né, casa com outro malandro ou não casa, ou adota criança no Brasil.”

Greenwald criticou a fala do presidente. “Ao contrário dos desejos de Bolsonaro, ele não é (ainda) um ditador. Ele não tem o poder de ordenar pessoas presas. Ainda existem tribunais em funcionamento. Para prender alguém, tem que apresentar provas para um tribunal que eles cometeram um crime. Essa evidência não existe”, publicou o jornalista, que afirmou que é casado com Miranda há 14 anos.

‘Graves agressões’. A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) repudiou os comentários de Bolsonaro. “Ao ameaçar de prisão um jornalista que publica informações que o desagradam, o presidente Bolsonaro promove e instiga graves agressões à liberdade de expressão”.

Bolsonaro disse ainda durante a entrevista que confia 100% em Moro e que ele não fará nada que a lei não permita, mas classificou o hackeamento dos celulares do ministro e de procuradores como “uma invasão criminosa”. Ele voltou a dizer que estava tranquilo com a possível captura de mensagens de seu telefone porque não havia nada de reservado ou confidencial em suas conversas.

‘Vou mandar de carro?’

Bolsonaro comentou o uso de um helicóptero da FAB por parentes que foram ao casamento de seu filho Eduardo, em maio, no Rio. “Eu vou negar o helicóptero e mandar ir de carro? Não gastei nada além do que já ia gastar.”

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Preso diz ter emprestado nome a hacker

28/07/2019

 

 

Em depoimentos à Polícia Federal, três presos por suspeita de hackear autoridades, junto com Walter Delgatti Neto, apresentaram versões nas quais “Vermelho” é tratado como líder do grupo. A GloboNews revelou e o Estado confirmou o teor das oitivas prestadas na semana passada. O motorista Danilo Cristiano Marques afirmou à PF que emprestou seu nome para o amigo Delgatti Neto alugar um imóvel em Ribeirão Preto em 2018. As contas do imóvel ficaram no nome de Marques. Ele disse que não recebeu pagamentos ou vantagens para emprestar o nome.

O DJ Gustavo Henrique Elias Santos disse em seu depoimento que também chegou a ser hackeado por Delgatti Neto em fevereiro. O próprio hacker teria confirmado a ação e, meses depois, revelado a Gustavo que tinha acessado a conta de Sérgio Moro no Telegram. Ele disse ter registros da troca de mensagens. Ele justificou sua movimentação financeira com negociações em criptomoedas. O DJ afirmou que Delgatti Neto é “simpatizante do PT” e que pretendia vender as mensagens acessadas para o partido.

Suelen Priscila de Oliveira, também presa, afirmou que desconhece as operações financeiras do namorado Gustavo, mas confirmou que ele fazia movimentações em seu nome.