Valor econômico, v.20, n.4854, 09/10/2019. Política, p. A7
TCU suspende campanha sobre pacote anticrime
Murillo Camarotto
09/10/2019
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, enfrentou ontem mais duas derrotas políticas na tentativa de viabilizar o pacote anticrime. Pela manhã, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou a suspensão da campanha publicitária do projeto, lançada oficialmente na semana passada. De tarde, o grupo de trabalho que avalia a matéria na Câmara dos Deputados derrubou mais um dispositivo previsto no texto.
Em decisão cautelar, o ministro do TCU Vital do Rêgo acolheu uma representação de parlamentares da oposição que questionam a legalidade da propaganda. O argumento é de que a pacote “não trata de política ou programa do governo federal que possa justificar uma campanha publicitária institucional”.
Segundo a decisão do TCU, a campanha deve ser suspensa até que o plenário do órgão se manifeste sobre o mérito. O objetivo da suspensão cautelar, diz Vital, é evitar que despesas que podem vir a ser consideradas ilegais continuem sendo realizadas.
Um dos signatários da representação, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) argumenta que o pacote anticrime ainda está em análise pelo Congresso, onde está sujeito a diversas alterações. Por essa razão, não poderia ser veiculado como uma peça de propaganda, com potencial de constranger os legisladores.
Ele também acredita que a natureza do projeto pode estar em desacordo com as regras impostas no contingenciamento de gastos, que autorizariam somente campanhas com caráter educativo ou de orientação social.
Moro se reuniu com o presidente do TCU, José Múcio, para tratar do tema. Depois, lamentou a decisão e, em nota, disse que a campanha “é importante para esclarecer à população o alcance das medidas propostas, como foi feito na Previdência. O Ministro da Justiça e da Segurança Pública aguardará, respeitosamente, a decisão final sobre a questão.”
Além da suspensão da peça, o TCU solicita esclarecimentos ao secretário Especial de Comunicação da Presidência da República, Fábio Wajngarten, sobre os fundamentos da campanha, a despesa total prevista e o processo licitatório. O prazo para o envio das informações é de 15 dias.
Na Câmara, o grupo de trabalho que analisa o pacote derrubou uma autorização para que delegados dispensem da prisão em flagrante pessoas que cometeram homicídio alegando legítima defesa. A ideia era evitar que alguém que matou para se proteger passe pelo constrangimento de ser algemado, conduzido pelos policiais e preso, somente podendo ser liberado por um juiz.
A maioria dos integrantes do grupo, no entanto, entendeu que isso seria estender à autoridade policial um poder exclusivo do Judiciário. Dessa forma, a sugestão de Moro foi retirada do relatório.
O grupo aprovou outras duas emendas ao projeto. A primeira retira o direito à saída temporária da cadeia para pessoas condenadas por crimes hediondos envolvendo morte. Também foi chancelado o aumento da pena prevista para o crime de concussão, que acontece quando um agente público exige o pagamento de vantagens indevidas.
Ficou adiada para a semana que vem a análise do aumento da punição para quem repassar, via internet, conteúdo que configure calúnia, injúria ou difamação. A proposta era de que o compartilhamento digital resultasse em uma pena até três vezes maior.
Os deputados também sinalizaram a intenção de incluir no grupo a discussão sobre a regulamentação do instituto da delação premiada. Os integrantes manifestaram desconforto com as movimentações no Judiciário e do Ministério Público Federal no sentido de determinar as regras para as colaborações.
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Toffoli pode adiar julgamento sobre segunda instância
Luísa Martins
09/10/2019
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, avalia deixar para novembro o julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) que tratam sobre prisão após condenação em segunda instância.
Segundo auxiliares próximos, Toffoli estuda adiar a análise do caso em plenário, diante da pauta congestionada de outubro e da perspectiva de que, dentro das próximas duas semanas, o quórum possa não estar completo. Em julgamentos politicamente relevantes, o presidente tem adotado como critério a presença dos 11 ministros da Corte.
Ainda não se descarta, no entanto, que o julgamento ocorra ainda neste mês, para quando estão agendados recursos da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra habeas corpus (HC) concedidos pelo ministro Ricardo Lewandowski a condenados detidos antes do trânsito em julgado das sentenças.
O pacote de HCs foi apresentado por Lewandowski durante a sessão do Supremo de 27 de setembro. O plenário discutia outro tema, mas, antes de votar, o ministro surpreendeu e levou o pedido “em mesa”, ou seja, sem que houvesse previsão na pauta.
A iniciativa foi considerada uma estratégia para pressionar Toffoli, que, desde que assumiu a presidência, vem resistindo a agendar o julgamento sobre a constitucionalidade da prisão após sentença de segundo grau.
Embora ainda não haja data definida, Toffoli sinalizou a colegas a intenção de resolver o assunto antes do fim do ano. As ADCs estão liberadas pelo ministro Marco Aurélio Mello (relator) desde dezembro de 2017.
Atualmente, a jurisprudência do tribunal permite que a pena possa começar a ser cumprida logo após a condenação em segunda instância - foi o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, levado à prisão depois de sentenciado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Há a perspectiva, no entanto, de que o plenário do STF reveja esse posicionamento e adote um voto médio - o de que a prisão só possa ocorrer depois da condenação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Anteontem, entrevistado no programa “Roda Viva”, da TV Cultura, o ministro Gilmar Mendes afirmou que é um dos favoráveis a essa tese, lançada inicialmente pelo próprio Toffoli.
Na data do julgamento do tema, além da discussão sobre o princípio da presunção de inocência, devem ser analisadas outras hipóteses. Por exemplo: quando um réu é absolvido em primeira instância, mas condenado em segunda; quando é condenado em instância única (sem grau recursal, como no STJ); ou quando o primeiro grau concede ao sentenciado o direito de responder em liberdade, o Ministério Público não recorre e, mesmo assim, a prisão é decretada pela segunda instância.