Valor econômico, v. 20, n. 4853, 08/10/2018. Política, p. A12

 

Estados e municípios podem ganhar mais 4 anos para pagar precatórios

Vandson Lima

Roberto Rocha

08/10/2019

 

 

Impasse travou o andamento da reforma da Previdência no Senado e pôs em lados opostos parlamentares de Norte e Nordeste, contra Sul, Sudeste e Centro-Oeste

O prazo para que Estados e municípios paguem precatórios devidos a pessoas jurídicas poderá ser estendido de 2024 para 2028. Segundo a senadora Simone Tebet (MDB-MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, um acordo com os líderes e Alcolumbre está encaminhado para que seja votado ainda hoje, na CCJ e no plenário, em dois turnos, a PEC 95/2019.

Apresentada pelo senador José Serra (PSDB-SP) e relatada por Antonio Anastasia (PSDB-MG), a proposta prorrogava até 2028 o prazo para que os governos locais, condenados de forma definitiva, pudessem quitar os débitos vencidos e a vencer tanto com pessoas físicas quanto jurídicas - uma folga orçamentária da ordem de R$ 7 bilhões ao ano (ou R$ 42,1 bilhões até 2024). A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) estima haver mais de 1 milhão os credores na fila de espera dos pagamentos.

Anastasia, contudo, restringiu a moratória a dívidas com pessoas jurídicas, obtendo acordo para a matéria prosseguir.

“Pode ser uma surpresa positiva que o Senado dará ao país essa semana. Combinamos de votar amanhã a prorrogação de precatórios de pessoas jurídicas, portanto grandes valores, dando um fôlego aos Estados e municípios, mas preservando o cronograma para pessoas físicas”, disse Tebet. A presidente da CCJ afirmou que o acordo prevê a quebra de prazos para acelerar a matéria. “Pode ser votado na CCJ e em primeiro e segundo turno amanhã no plenário”.

O Congresso vive atualmente um impasse, em razão da disputa pela divisão dos recursos que virão da cessão onerosa. Um princípio de acordo em torno da divisão do bônus começou a ser tentado ontem. Uma reunião entre os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o líder do governo, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), esperada na noite de ontem, deveria avançar na construção de uma saída.

Além de estremecer as relações entre Câmara e o Senado, o impasse travou o andamento da reforma da Previdência no Senado e pôs em lados opostos parlamentares de Norte e Nordeste, contra representantes de Sul, Sudeste e Centro-Oeste.

Ao passar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tratou do tema, o Senado definiu que o bônus seria dividido em 67% para a União, 15% para Estados, 15% para municípios e 3% para o Rio de Janeiro, Estado produtor. Os recursos seriam distribuídos de acordo com critérios para a repartição dos Fundos de Participação de Estados (FPE) e municípios (FPM).

Essa divisão, no entanto, não foi bem recebida na Câmara - isso porque o cálculo via FPE e FPM privilegia Estados pobres, do Norte e Nordeste. No Senado, esse critério faz sentido: como cada Estado tem três representantes e Norte e Nordeste formam juntos 16 Estados, a divisão agradou em cheio pelo menos 48 senadores - mais da metade da casa. Como na Câmara as bancadas são proporcionais às populações locais, as outras regiões se julgaram prejudicadas.

A Câmara nunca quis reduzir a participação de 15% dos Estados”, disse Maia. O governo defendeu a redistribuição dos recursos, com 10% do bônus de assinatura do excedente da cessão indo para emendas parlamentares, 10% para Estados e 10% para municípios.

Maia tem defendido a manutenção de 15% e 15%, desde que a parte destinada a Estados seja distribuída por outra fórmula de cálculo. Os governadores também entrarão na negociação, que será discutida no Fórum dos Governadores, que acontece hoje em Brasília.

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A vida correndo, parada

Roberto Rocha

08/10/2019

 

 

Relator da reforma tributária no Senado diz que o povo está ausente da discussão do tema

Aponte-me, caro leitor, um único brasileiro, pessoa física ou jurídica, de esquerda, do centro ou de direita, que seja a favor do atual sistema tributário brasileiro.

De batina, de farda, de gravata ou avental não existe um único brasileiro capaz de assinar uma declaração a favor desse verdadeiro manicômio tributário que existe no país. Então, você deve estar pensando: se todo mundo é contra, deve ser a proposta mais fácil de passar no Congresso, não é? Ledo engano, é justamente a mais difícil. “Quem quer mais que lhe convém, perde o que quer e o que tem”, já disse o padre Antonio Vieira.

Sucessivas tentativas mostraram que é uma tarefa ingente passar qualquer reforma, uma vez que carecemos da visão de um Estado democrático, que seja de todos e de nenhum. E a pergunta mais simples - que país queremos? - não será respondida pela soma dos interesses que se agitam buscando não perder um único centavo com a reforma, sem atentar que com uma verdadeira reforma ninguém, a médio prazo, sairá perdendo. O que falta nessa equação é exatamente Sua Excelência o Povo, a quem nós, políticos juramos representar.

Esse Povo que nem sabe que paga impostos altíssimos e profundamente injustos que fazem com que sua vida seja uma eterna agitação, “correndo, parada”, como no verso de Djavan. O que falta é dar compreensão à população do que está sendo feito, por trás do rigor técnico envelopado em conceitos como regressividade, seletividade, desoneração, elisão e tantos outros aspectos que tornam a Reforma Tributária uma espécie de missa iniciática para seres superiormente dotados.

Me honra ser o relator da PEC 110, do Senado, de autoria intelectual de um ilustre brasileiro, o ex-deputado Luíz Carlos Hauly, que se debruçou sobre o tema com o ânimo e a empolgação de quem cumpre uma missão. Ele fez mais de 500 reuniões técnicas, em todos os estados brasileiros, ouvindo sugestões de empresários, trabalhadores, associações profissionais, igrejas, sindicatos, técnicos e especialistas. Ao todo, realizou mais de 170 palestras, e esse número vem crescendo.

Apresentado no Senado por 66 senadores, o projeto não atende a nenhuma corporação em particular, mas à necessidade de contar com um novo acordo social, que garanta o atendimento de alguns pilares, tais como o crescimento econômico sustentado, um piso mínimo de proteção social e uma agenda para o Estado cumprir suas metas sociais e econômicas. Um projeto com princípios na justiça social, que busca a simplificação, modernização, desoneração e competição.

Comparando com outras nações, o atual sistema é um Frankenstein funcional que mata as empresas, os empregos, os salários e por fim, trava o Brasil como demonstrado pelo fato de estarmos há 38 anos com crescimento abaixo da linha mundial, como em um voo de galinha, agora sem as asas. Por que agora sem as asas? Nos últimos cinco anos, enquanto o PIB do mundo cresceu 19,1%, o do Brasil caiu 4,1%. Essa verdadeira reengenharia tributária é sustentada por uma base tecnológica moderna, com inteligência nacional que é capaz de construir um sistema ágil e online para coletar e distribuir os impostos entre os entes nacionais e o sistema produtivo do país. Atualmente, não precisa rastrear só o produto, temos tecnologia para rastrear também o dinheiro. E melhor, dará as bases para, fora do texto da PEC, através de leis complementares, organizarmos um modelo mais próximo e tão eficaz quanto os dos países desenvolvidos.

Vamos dar alguns exemplos, que já estão sendo estudados: por que cobrar tributos tão altos de remédios (33%), quando no exterior há países que não cobram nada? Por que taxar a tarifa social de energia elétrica, e cobrar tanto da telefonia popular? Por que cobrar impostos sobre os botijões de gás domésticos para pessoa física de baixa renda? São apenas alguns exemplos de fazer justiça social, botando a máquina arrecadatória a serviço de quem mais precisa, os mais pobres.

Vamos reverter a equação perversa que faz com que hoje sejam os pobres aqueles que pagam mais imposto, proporcionalmente ao pago pelos mais ricos. Estamos legislando com os olhos dos que mais precisam. Outro exemplo que salta aos olhos é o fato de quem tem uma simples moto ou carro popular ter que pagar o IPVA, enquanto proprietários de aviões e iates estarem isentos. Uma primeira proposta que avanço é o de considerar os carros 1.0 e as motos até 200 cc como veículos de trabalho, daí baixando o tempo de isenção do IPVA de 15 para 5 anos, e desonerar progressivamente até o quinto ano. E mais importante, além de baixar também os remédios para no máximo 5%, atuaremos decididamente para que a comida, especialmente os produtos da cesta básica, o feijão nosso de cada dia, seja também desonerada, bem como sejam bem menores as alíquotas de transporte coletivo urbano, saneamento básico, logística reversa, educação e saúde.

De onde sairão essas desonerações? Da inovação tecnológica na arrecadação e da simplificação tributária, eliminando R$ 500 bilhões que vem sendo sonegados, a complexa burocracia para arrecadar, que custa R$ 66 bilhões ao ano (1% do PIB), R$ 500 bilhões de renúncia fiscal, R$ 3 trilhões de contencioso, R$ 3 trilhões de dívida ativa, sem contar, é claro, o custo da corrupção, que grassou no país epidemicamente.

Queremos um novo Brasil. Feito para todos os brasileiros. Onde a vida corra, para quem trabalha e onde os frutos da imensa riqueza de nosso país sejam distribuídos entre todos.