Correio braziliense, n. 20474, 11/06/2019. Política, p. 2

 

Blindagem a Moro

Rodolfo Costa

11/06/2019

 

 

Poder » Governo monta força-tarefa para preservar o ministro acusado de parcialidade nos julgamentos referentes à Lava-Jato quando era magistrado. Presidente Jair Bolsonaro tem reunião marcada para hoje com o ex-juiz

O governo montou uma força-tarefa para blindar o ministro da Justiça, Sérgio Moro, das acusações de parcialidade em julgamentos referentes à Operação Lava-Jato, após a invasão criminosa e o vazamento de troca de mensagens do então juiz com o procurador Deltan Dallagnol. O problema é que, por ora, a articulação é frágil. O presidente Jair Bolsonaro não se pronunciou ontem e qualquer declaração deve ser feita só depois de reunião marcada para hoje com Moro.

A cúpula militar do Executivo saiu em defesa de Moro, mas o núcleo político, comandado pelo ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, não deu diretrizes às lideranças partidárias e a aliados de como se portar no Congresso. Sem engajamento no Legislativo, até o sucesso de acordo para a votação do Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) 4/2019 não está totalmente garantido. A proposta dispõe sobre o crédito suplementar solicitado pelo governo ao parlamento para quitar, por meio de operações de crédito, despesas correntes de R$ 248,9 bilhões.

Em conversas privadas ou em grupos de WhatsApp, deputados dizem que a reforma da Previdência será blindada, mas “o resto será reanalisado”. Ou seja, o governo precisará reavaliar e intensificar as articulações pauta a pauta.

A orientação política deveria ser feita por Onyx, que nada fez, criticam parlamentares. Em reunião com lideranças do governo e aliados, ontem à noite, no Palácio do Planalto, não deu diretrizes sobre a atuação. A inércia do ministro freou um movimento que começou a ser construído por deputados do baixo e médio cleros para apoiar Moro e o governo. O clima é de cautela, reconheceu o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO). “Eu me reunirei com aliados para ver se e como apoiamos. Temos de dar um voto de confiança a Moro, e acho que o Planalto está blindado desse assunto, mas tudo depende se tem ou não novos vazamentos”, disse.

Por ora, o apoio formal ao governo no parlamento reside no PSL. A deputada Carla Zambelli (PSL-SP) e outros correligionários traçam uma estratégia de, nas redes sociais e nas sessões plenárias, ridicularizam a oposição e mostram como as críticas de partidos como PT e PSol reforçam o trabalho contra a corrupção, sem uma suposta interferência de Moro nas ações da força-tarefa da Lava-Jato. “Iremos às ruas se a coisa se acirrar, mas a linha, agora, é pegar a lista do Janot (nomes denunciados pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot) e pressionar pelos julgamentos. Vamos defender a Lava-Jato e ironizar quem questiona a conduta do ministro”, destacou a parlamentar.

A área militar do governo também deixou claro o apoio a Moro. O ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência, Augusto Heleno, disse, em nota, que o “desespero dos que dominaram o cenário econômico e político do Brasil levou seus integrantes a usarem meios ilícitos para tentar provar que a Justiça os puniu injustamente”. “Querem macular a imagem do dr. Sérgio Moro, cujas integridade e devoção à Pátria estão acima de qualquer suspeita”, sustentou.

O discurso foi reforçado pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, ao garantir ontem que Moro tem a confiança do governo. “Ele é um ministro, um homem de muito respeito e do bem”, declarou. O vice-presidente Hamilton Mourão classificou o ex-juiz como alguém da “mais ilibada confiança do presidente” e disse que “conversa privada é conversa privada”. “Descontextualizada, ela traz qualquer número de ilações. (Moro) É uma pessoa que, dentro do país, tem um respeito enorme por parte da população, visto as pesquisas de opinião sobre a popularidade dele”, frisou.

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Ministro de Dilma vê ilicitude

 

 

 

 

 

Jorge Vasconcellos

11/06/2019

 

 

 

O ataque criminoso que expôs diálogos entre o ex-juiz federal e ministro da Justiça, Sérgio Moro, e integrantes da força-tarefa da Lava-Jato, divulgados pelo site The Intercept Brasil, no domingo, abriu caminho para questionamentos das decisões judiciais proferidas pelo grupo. Essa é a opinião de advogados que acompanham o caso, considerado um dos maiores escândalos envolvendo o Poder Judiciário brasileiro.

Ministro da Justiça no governo Dilma Rousseff, o advogado Eugênio Aragão afirmou que as conversas confirmam as suspeitas de que Moro, o procurador Deltan Dallagnol e outros membros da força-tarefa sempre atuaram por interesses políticos. “As conversas captadas dão a entender que Moro e Dallagnol e outros procuradores agiram movidos apenas por seus sentimentos de repulsa em relação a Lula e ao PT. Agiram também movidos por uma agenda política, porque o que eles queriam na verdade era ‘limpar o Congresso’, como diz Sérgio Moro, ou impedir que Haddad fosse eleito. Isso é de extrema gravidade”, disse o ex-ministro, do escritório Aragão e Tomaz Advogados Associados. “E do ponto de vista penal, isso qualifica claramente um crime de prevaricação, que é proferir um ato de ofício para atender seu sentimento pessoal. Se o ato for ilícito, pior ainda. E, nesse caso, é ilícito porque temos claramente a tentativa de criar uma fraude processual.”

Na opinião do advogado criminalista Thiago Turbay, do escritório Boaventura Turbay Advogados, os desvios na conduta dos integrantes da Lava-Jato mancharam a credibilidade da operação. “A imparcialidade do juiz foi violada, o que implica obstruir a ampla defesa e o contraditório. As decisões são nulas. Os fatos revelam um comportamento à margem da lei. Perdeu-se a oportunidade de legitimar o combate à corrupção de maneira lícita”, disse.

Segundo o advogado criminalista Ricardo Rios, do escritório Maciel Marinho Advocacia, “nota-se a gravidade do teor do material divulgado pelo site Intercept, e as consequências gravíssimas passíveis de macular o processo que ensejou a condenação do ex-presidente Lula”. “Isso porque há clara violação ao art. 254, I e II, do CPP (Código do Processo Penal), por demonstrar amizade íntima do juiz com uma das partes e por conter aconselhamentos, ferindo a capacidade subjetiva do julgador, o que representa vício de suspeição. Tal fato poderá justificar uma nulidade absoluta do processo, o que pode ser alegado a qualquer momento pela defesa dos envolvidos”, ressaltou.

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Ex-juiz e procurador se defendem

11/06/2019

 

 

 

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, e o procurador Deltan Dallagnol disseram, ontem, ser “normal” o diálogo extraoficial entre juízes e integrantes do Ministério Público e defenderam a isenção da Lava-Jato. “É muito natural, é normal que procuradores e advogados conversem com o juiz mesmo sem a presença da outra parte”, disse Dallagnol, em vídeo publicado nas suas redes sociais.

“Não tem nenhuma orientação ali naquelas mensagens. E eu nem posso dizer que são autênticas, porque são coisas que aconteceram e, se aconteceram, foram há anos. Eu não tenho mais essas mensagens. Eu não guardo, não tenho registro disso. Mas ali não tem orientação nenhuma”, afirmou Moro, ao desembarcar em Manaus, onde cumpriu agenda ontem.

Questionado por que manteve contato com os procuradores via mensagem de texto de aplicativo, Moro afirmou que “é algo normal”. “Os juízes conversam com procuradores, conversam com advogados, conversam com policiais. E isso é algo normal. Se houve alguma coisa nesse sentido (de direcionamento), são operações que já haviam sido autorizadas, e isso é questão de logística de saber como fazer”, declarou o ministro.

No vídeo, Dallagnol disse que a Lava-Jato sofreu um “ataque gravíssimo”. Segundo ele, um “criminoso” teria se passado por jornalistas e por procuradores e invadido celulares. Dallagnol disse temer que a atividade criminosa “avance agora para falsear e deturpar fatos”.

Ele afirmou que integrantes da força-tarefa não reconhecem a “fidedignidade dessas mensagens que foram espalhadas”, embora concorde que elas “podem gerar algum desconforto em alguém”.

Segundo Dallagnol, eram “robustas” as provas apresentadas pelo Ministério Público na denúncia do caso do triplex, que resultou na condenação e prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Essa robustez ficou evidenciada com a concordância de nove julgadores em três instâncias diferentes.”

Frase

“A Lava-Jato Curitiba sofreu um ataque gravíssimo por parte de um criminoso”

Deltan Dallagnol, procurador