O Estado de São Paulo, n. 45930, 19/07/2019. Política, p. A6

 

Decreto amplia 'ficha limpa' para o Executivo

Mariana Haubert

Julia Lindner

19/07/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Governo cria regras mais rígidas para cargos em comissão, mas deixa brecha para ministros

O presidente Jair Bolsonaro editou ontem um decreto para ampliar as regras exigidas para cargos em comissão e funções de confiança da administração pública, incluindo autarquias e universidades federais, mas abre uma brecha ao possibilitar que um ministro possa manter em sua pasta alguém que não cumpra os requisitos necessários.

Entre os critérios exigidos para que alguém trabalhe no governo está o de não ter ficha suja e ter formação acadêmica compatível com a função de que vai ocupar. Os indicados para os cargos também terão de comprovar idoneidade moral e reputação ilibada.

As novas regras entrarão em vigor a partir de 1.º de agosto e valerão para ministérios, agências reguladoras, fundações públicas, instituições de ensino e cargos de natureza especial, como secretários executivos e secretários especiais, e até para ministros. O anúncio da medida foi feita durante solenidade sobre os primeiros 200 dias de governo Bolsonaro.

De acordo com o Ministério da Economia, o novo decreto abrange 76,1 mil cargos e funções. Em março, o governo já havia editado um decreto semelhante para os cargos de direção e assessoramento superiores (DAS) e funções comissionadas do Poder Executivo (FCPE) – que são de livre nomeação, ou seja, não requer concurso público. Na ocasião, a medida atingiu 24,3 mil cargos.

Desta forma, ao todo, os indicados para 100,4 mil postos comissionados deverão seguir as novas regras previstas no decreto. A medida não gera nenhum custo para o governo federal.

Brecha. O subchefe adjunto da Subchefia de Assuntos Jurídicos da Secretaria-Geral da Presidência, Humberto Fernandes de Moura, afirmou que a medida é retroativa e atinge também quem já está no governo. A decisão de demitir alguém, porém, ficará a critério do ministro responsável pelo cargo.

“Eventualmente, se a pessoa não cumprir aqueles objetivos, existe uma discricionariedade para que o ministro da pasta possa indicar e nomear a pessoa. Isso vai ser usado apenas de maneira excepcional e parcimoniosa pelos ministros do governo Bolsonaro”, disse Moura.

Em relação à aplicação das novas regras para as universidades federais, Moura afirmou que a norma não representa uma ofensa à autonomia das instituições. “O sistema que orienta as nomeações no Poder Executivo está facultado às universidades. Se o reitor quiser se valer do sistema que a Casa Civil dispõe para averiguar o passado, o currículo, ele está à disposição”, disse ele.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou que a medida tem caráter legal e lembrou que o “banco de talentos” criado no início do governo para gerenciar as nomeações continua existindo. Onyx disse ainda que o governo estuda cortar mais de 25 mil cargos em comissão, mas não detalhou quando isso deverá acontecer. “A gente espera que, lá nos 300 dias de governo, a gente consiga já anunciar mais 25 mil cargos em comissão que serão cortados. Nós já cortamos 21 mil, vamos caminhar para mais 25 mil”, declarou o chefe da Casa Civil.

Cortes. No início do ano, o governo cortou cerca de 21 mil cargos, comissões e funções gratificadas, de um total de 130 mil cargos nestas condições. A economia prevista na época com a redução foi de R$ 220 milhões por ano. Na primeira etapa de cortes, a área de Educação foi a mais afetada, principalmente as universidades públicas federais. Das 21 mil vagas eliminadas pelo governo, pelo menos 13.710 faziam parte das instituições de ensino, o que corresponde a 65% do total. Foram extintos cargos de direção, funções comissionadas de coordenação de cursos e outras gratificações para professores.

Onyx disse ainda que existem atualmente cerca de 60 mil cargos deste tipo nas universidades e nos institutos federais. “A gente não pode esquecer que o PT aparelhou esses lugares. Vamos fazer uma limpeza, mas com critérios”, disse o ministro da Casa Civil.

‘Excepcional’

“Eventualmente, se a pessoa não cumprir aqueles (critérios) objetivos (do decreto), existe uma discricionariedade para que o ministro da pasta possa indicar e nomear a pessoa. Isso vai ser usado apenas de maneira excepcional e parcimoniosa pelos ministros do governo Bolsonaro.”

Humberto Fernandes Moura

SUBCHEFE ADJUNTO DA SUBCHEFIA DE ASSUNTOS JURÍDICOS DA SECRETARIA-GERAL DA PRESIDÊNCIA

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'Pretendo beneficiar filho meu, sim' afirma Bolsonaro

Mariana Haubert

19/07/2019

 

 

Presidente volta a dizer que a indicação de Eduardo para embaixada é legal e aprofunda relações com os EUA

Eduardo Bolsonaro. Indicado para embaixada nos EUA

O presidente Jair Bolsonaro voltou a defender ontem a indicação do seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para a embaixada brasileira em Washington, nos Estados Unidos. No fim do dia, durante transmissão ao vivo feita em rede social, Bolsonaro rebateu acusações de oposicionistas e até de apoiadores de favorecimento. “Pretendo beneficiar filho meu, sim. Se eu puder dar um filé mignon ‘pro’ meu filho, eu dou, mas não tem nada a ver com o filé mignon essa história aí. É aprofundar o relacionamento com a maior potência do mundo”, afirmou.

Mais cedo, Bolsonaro disse que, se quisesse, poderia indicar Eduardo até para ser ministro das Relações Exteriores. “Eu posso chegar hoje e falar: Ernesto Araújo (atual ministro) está fora, o Eduardo Bolsonaro vai ser ministro das Relações Exteriores. Ele vai ter sob seu comando mais de uma centena de embaixadas no mundo todo”, afirmou o presidente.

Ele citou o exemplo para justificar que indicações políticas não são proibidas na administração pública, incluindo para embaixadas. “Você tem de ver o seguinte: é legal? É. Tem algum impedimento? Não tem impedimento. Atende ao interesse público? Qual o grande papel do embaixador? Não é o bom relacionamento com o chefe de Estado daquele outro país? Atende isso? Atende. É simples o negócio”, disse Bolsonaro ao deixar o Palácio da Alvorada na manhã de ontem.

O nome indicado pelo presidente tem de passar por sabatina no Senado. Como mostrou o Estado, integrantes da Comissão de Relações Exteriores e Defesa da Casa estão divididos sobre aceitar ou não a indicação, já que Eduardo não tem uma carreira na área diplomática.

Bolsonaro afirmou, no entanto, que, dentro do quadro de indicações políticas, vários países fazem o mesmo que ele pretende fazer. “É legal fazer no Brasil também.” E comparou o caso com outros dois que, para ele, também foram motivados por questões políticas. A do ex-deputado Tilden Santiago, do PT, para a representação brasileira em Cuba feita pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva; e a do diplomata e político Oswaldo Aranha, embaixador nos Estados Unidos durante o governo Getúlio Vargas.

“O Tilden Santiago não foi reeleito em 2002, foi ser embaixador em Cuba, ninguém falou nada. Sei que lá atrás não tinha Itamaraty, Rio Branco, mas quando Oswaldo Aranha acertou lá nos anos 40 com Israel, era uma indicação política. Tivemos várias indicações políticas”, disse Bolsonaro.

Tilden Santiago foi deputado por três mandatos e concorreu a uma vaga no Senado em 2002, mas ficou em terceiro lugar. Ele foi nomeado ao posto de Havana no primeiro mandato de Lula no Planalto.

‘Filé mignon’

“Pretendo beneficiar filho meu (Eduardo), sim. Se eu puder dar um filé mignon ‘pro’ meu filho, eu dou, mas não tem nada a ver com o filé mignon essa história aí (indicação para o posto de embaixador nos Estados Unidos). É aprofundar o relacionamento com a maior potência do mundo.”

Jair Bolsonaro

PRESIDENTE DA REPÚBLICA