Título: A conversa é com Chávez
Autor: Luna, Thais de
Fonte: Correio Braziliense, 14/10/2012, Mundo, p. 21

Com mais uma reeleição do presidente venezuelano, sócios do bloco começam a encarar os trâmites práticos para efetivar a incorporação do novo membro de pleno direito, que investe na diversificação de sua economia

Superado o desafio de vencer nar urnas o candidato da oposição, Henrique Capriles Radonski, e conquistar mais um mandato como presidente da Venezuela, Hugo Chávez agora tem pela frente o processo de adaptação ao Mercosul. Embora o ingresso do país no bloco tenha sido formalizado há três meses, a primeira reunião do grupo em que a Venezuela atuará como sócio pleno está prevista apenas para dezembro. Por isso, a eleição presidencial do último domingo foi acompanhada com especial interesse na vizinhança. Os governos de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai — que está suspenso até abril de 2013, devido ao impeachment relâmpago do presidente Fernando Lugo — aguardavam uma definição quanto ao colega com quem terão de negociar e lidar nos próximos seis anos. Segundo analistas ouvidos pelo Correio, os sócios encaram o quarto mandato do novo parceiro um prolongamento do processo iniciado com o pedido de adesão, feito em 2006.

Cristina Kirchner, presidente da Argentina, foi a primeira líder a demonstrar sua satisfação com a continuidade de Chávez, que governa o país desde janeiro de 1999. “Sua vitória é uma vitória para a América Latina”, comentou na rede social Twitter. Dilma Rousseff, ao telefonar para o colega para parabenizá-lo, se dispôs a trabalhar com o bolivariano, por meio de mecanismos de integração regional, por uma América do Sul “mais justa e igualitária”. O especialista em Venezuela Eric Farnsworth, vice-presidente do Conselho das Américas, instituto dos EUA, lembra que Brasil e Argentina têm uma série de acordos com a Venezuela, especialmente no setor energético. Para Alcides Vaz, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), a reação positiva dos sócios se deve mais à constatação de que o processo eleitoral venezuelano ocorreu sem fraudes e entraves, que poderiam adicionar problemas políticos para o Mercosul. “Depois de todo o movimento feito para o ingresso venezuelano, ter o processo questionado seria um problema”, pontuou.

A fim de promover a própria nação dentro do bloco, cuja nomenclatura comum deve adotar até dezembro, Chávez já anunciou que em breve lançará a Missão Mercosul. Embora não tenha detalhado o projeto, explicou que tem como meta apoiar o desenvolvimento nacional, de modo que o país se torne “uma grande potência mundial”. Para alcançar esse objetivo, o líder bolivariano pretende instalar um porto internacional para melhorar econômica e socialmente as regiões do Lago de Maracaibo e de Trijillo. Além disso, busca construir uma ferrovia que ligue a região do Rio Orinoco ao Caribe.

Os desafios econômicos da Venezuela para atuar no Mercosul como algo mais que um importador de mercadorias, porém, vão além da instalação de portos e ferrovias. Vaz avalia que a nação precisa diversificar seus setores produtivos, a fim de ter mais presença no mercado de exportação. “É necessário apresentar-se como um mercado potencialmente importante diante de outras economias”, avaliou. A economia venezuelana é essencialmente baseada na exportação de petróleo e gás. Segundo Farnsworth, o governo precisa reduzir seus gastos. Além disso, a fim de negociar com a União Europeia, o polêmico Chávez terá de agir com mais moderação e abrir o país para o setor privado.

Bolívia e Equador

Como membro do Mercosul, a Venezuela pretende defender o ingresso do Equador e da Bolívia, como destacou Chávez após ter sido eleito. “Seria muito positivo se os dois países se incorporassem a médio prazo”, afirmou. Ambas as nações já solicitaram formalmente a adesão, mas não há prazo para a tramitação dos processos. Farnsworth acredita que levar qualquer um desses países para o Mercosul, atualmente, enfraqueceria o bloco no aspecto econômico. “No entanto, como o presidente Chávez procura aumentar sua visibilidade e reivindicar a liderança dos esforços pela integração da América do Sul, faz sentido que lute pela inclusão.”

Vaz também vê o comentário do presidente como uma iniciativa política. “Essas declarações revelam certa dificuldade no avanço do processo da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba), que foi a primeira opção dele em termos de uma ação regional, ao apostar na criação de um bloco latino-americano nos mesmos moldes de sua revolução bolivariana”, detalhou. Para o especialista em integração regional, Chávez reconsiderou o valor estratégico do Mercosul.

"É necessário (para a Venezuela) apresentar-se como um mercado potencialmente importante diante de outras economias" Alcides Vaz, professor de Relações Internacionais da UnB

"Como Chávez procura reivindicar a liderança da integração da América do Sul, faz sentido que lute pela inclusão (de Bolívia e Equador)" Eric Farnsworth, vice-presidente do Conselho das Américas