O globo, n.31397, 24/07/2019. País, p. 06

 

PGR recorre da decisão de Toffoli sobre Coaf 

Aguirre Talento 

Leandro Prazeres 

24/07/2019

 

 

A Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou um recurso ontem contra a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, que suspendeu todas as investigações baseadas em relatórios financeiros do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), tomada após um pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSLRJ) no caso Fabrício Queiroz. No embargo de declaração, a procuradora-geral, Raquel Dodge, afirma que a decisão de Toffoli não poderia abranger todas as investigações no país porque extrapola as condições iniciais do caso, e um juiz não pode ir além do que é solicitado pelas partes.

Dodge solicita que, neste primeiro momento, a decisão de Toffoli fique restrita apenas ao caso de Flávio Bolsonaro. Caberá agora ao presidente do Supremo decidir se modifica algum ponto de sua decisão ou se levará o assunto diretamente ao plenário do STF para discussão do mérito.

O senador é alvo de uma investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) no inquérito que apura suposta prática de “rachadinha”, como é batizada a prática de embolsar salários de assessores. O caso foi iniciado após o Coaf identificar “movimentações atípicas” nas contas de um ex-assessor do parlamentar.

Sobre o argumento específico da defesa de Flávio Bolsonaro, de que o Ministério Público (MP) não poderia solicitar um relatório do Coaf sobre dez anos de movimentações financeiras, Dodge afirmou que a decisão de Toffoli utilizou uma lei que não trata especificamente desse assunto e não tem fundamentação jurídica adequada. Segundo a PGR, as leis e jurisprudências usadas por Toffoli “dizem respeito a situação completamente diversa”.

A fundamentação usada pelo presidente do STF trata de transferência dedados bancários para órgãos administrativos do governo federal sem autorização judicial. Dodge argumenta que essa legislação não poderia ser aplicada para o caso de Flávio, porque a transmissão de informações do Coaf ao MP está disciplinada por uma outra lei, específica sobre lavagem de dinheiro, que não traz impedimentos sobre a solicitação de dados bancários. A PGR pede, então, que Toffoli esclareça as “obscuridades” deste ponto de sua decisão.

“A decisão suspendeu toda e qualquer investigação, inquérito, PIC, ação penal e execução penal em curso no território nacional em que haja informação do Coaf, da Receita Federal e do Bacen (Banco Central) ao Ministério Público, o que vai muito além do que foi pedido pelo requerente em petição avulsa e pelo Ministério Público no recurso extraordinário”, afirmou a PGR.

FATO CORRIQUEIRO

A procuradora-geral argumenta que o intercâmbio de informações do Coaf com o MP é fato corriqueiro no ordenamento jurídico brasileiro e que o STF sempre referendou essa utilização. Por isso, Dodge alerta que o entendimento de Toffoli pode trazer impactos para ações penais e investigações em todo o país. A PGR cita o caso do mensalão, que utilizou relatórios do Coaf, a denúncia contra o ex-ministro Geddel Vieira Lima (MDB), do apartamento com R$ 51 milhões, e casos da Lava-Jato como a prisão do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB). Cita ainda a investigação sobre o médium João de Deus e inquéritos relacionados à principal facção criminosa surgida na capital paulista.