O Estado de São Paulo, n. 45927, 16/07/2019. Internacional, p. A8

 

Trump intensifica ataques considerados racistas contra deputadas democratas

16/07/2019

 

 

Bate-boca. Presidente dos EUA, que no domingo mandou quatro congressistas descendentes de estrangeiros “voltarem para seus países”, nega que tenha ofendido alguém; opositores condenam comentários, mas maioria dos republicanos prefere adotar o silêncio

O presidente dos EUA, Donald Trump, intensificou ontem seus ataques às quatro deputadas democratas representantes de minorias em comentários considerados por adversários – e alguns poucos republicanos – como racistas e impróprios para um presidente americano.

Em resposta, as quatro disseram, em entrevista coletiva conjunta, que os ataques não dividiriam os democratas e serviam apenas como distração para a “falta de políticas” de Trump. Elas também defenderam o impeachment do presidente.

“Esse presidente não sabe defender seus argumentos, então eles nos ataca. Tudo tem a ver com isso”, argumentou Alexandria Ocasio-Cortez, uma das quatro congressistas, ao lado de Ayanna Pressley, Rashida Tlaib e Ilhan Omar. “A agenda de Trump é a mesma dos supremacistas brancos. O que antes acontecia apenas nos grupos de bate-papo ou na TV, agora chegou aos jardins da Casa Branca”, disse Omar.

No domingo, Trump disse que elas deveriam “voltar para seus países” – ainda que todas sejam cidadãs americanas. Ontem, o presidente negou que estivesse sendo racista e afirmou que vários grupos concordavam com ele. Trump continuou tuitando durante o pronunciamento das deputadas.

“Os democratas estão tentando se distanciar das quatro ‘progressistas’, mas agora foram forçados a apoiá-las. Isso quer dizer que eles estão apoiando o socialismo, o ódio a Israel e aos EUA”, escreveu o presidente.

Novos ataques. Trump já havia rejeitado as críticas mais cedo e afirmado que racistas eram as quatro deputadas – não ele. “Se elas não estão felizes nos EUA, podem ir embora”. Segundo o presidente, as congressistas “amam os inimigos dos EUA”. No domingo, ele havia afirmado que as deputadas – uma negra e as outras de origem latina, palestina e somali – vêm de países “cujos governos são uma catástrofe completa e total”, que deveriam voltar para lá.

A presidente da Câmara dos Deputados, a democrata Nancy Pelosi, pediu apoio a uma resolução que condene as declarações do presidente. Em carta ao partido, ela disse que Trump foi muito “além de seu próprio padrão de linguagem de baixo calão” e merecia uma resposta.

Em editorial publicado ontem, o Washington Post afirma que Trump atingiu o momento mais baixo de sua presidência ao criticar as deputadas do partido adversário. “A impressão do presidente de que elas (democratas) pareçam derivar de uma combinação de cor de pele e nomes que soam estranhos (para ele) reflete seu racismo superficial, ignorante e tóxico.”

Um voto de repreensão a Trump no Congresso, como foi proposto por Pelosi, poderia unificar a bancada democrata que tem se divido nos últimos dias entre os mais progressistas e os mais moderados. Uma condenação na Câmara também colocaria os republicanos em uma situação difícil, já que a maioria tem se mantido em silêncio sobre os ataques de fúria de Trump, temendo criticar um presidente popular entre os republicanos – segundo pesquisas, ele tem cerca de 90% de apoio entre os que se declararam eleitores do partido.

Reação. Nos últimos dias, poucos republicanos reagiram. A maioria repreendeu sutilmente o presidente. A senadora republicana Susan Collins, por exemplo, disse que o presidente foi “muito além do limite”.

Meghan McCain, filha de John McCain, histórico senador republicano que morreu no ano passado, se disse “humilhada” pelo silêncio dos republicanos. “É assustador que não haja um membro sequer do Congresso que reaja a este tipo de comentário”, disse.

Alguns líderes do partido, porém, não apenas defenderam o presidente como atacaram as quatro deputadas. “Todos nós sabemos que AOC (Alexandria Ocasio-Cortez) e sua turma são um bando de comunistas. Eles odeiam Israel, odeiam nosso país”, afirmou o senador Lindsey Graham – que na campanha presidencial de 2016 chamou Trump de “xenófobo”./ W.POST, AFP , NYT

QUADRA DE DAMAS

Alexandria Ocasio-Cortez

Aos 29 anos, é a deputada mais jovem dos EUA e uma estrela em ascensão na política americana

“Não fiquei surpresa quando o presidente disse a quatro deputadas eleitas que elas deveriam ‘voltar para seus países’. Enquanto ele dizia isso, ele autorizava a prisão de milhares de famílias pelo país”

Rashida Tlaib

Filha de palestinos, mais velha de 14 irmãos, é advogada, muçulmana e tem 42 anos

“Não foi a primeira vez nem será a última que ouviremos esta linguagem repugnante do presidente. Sabemos que ele é assim. E sabemos que ele está constantemente envolvido em ações que prejudicam os americanos”

Ilhan Omar

Nasceu na Somália, de onde fugiu ainda criança, tem 37 anos, é muçulmana e caçula de 7 irmãos

“A agenda de Trump é a mesma dos supremacistas brancos. O que antes acontecia apenas nos grupos de bate-papo ou na TV, agora chegou aos jardins da Casa Branca”

Ayanna Pressley

Primeira negra deputada por Massachusetts, tem 45 anos e foi vítima de abuso sexual

“Eu sempre vou me referir a ele (Trump) como um ocupante. Ele está apenas ocupando um espaço. Ele não tem a empatia, a compaixão e a integridade que o cargo exige e o povo americano merece”

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EUA vetam pedidos de asilo de imigrantes na fronteira com México

16/07/2019

 

 

Decreto restringe entrada de refugiados e cria barreira contra cidadãos de países da América Central

O governo do presidente Donald Trump publicou ontem um decreto que proíbe os pedidos de asilo feitos por imigrantes da América Central na fronteira com o México. A determinação vale a partir de hoje. Para poder ter direito ao pedido de asilo, o imigrante deve ter entrado com a mesma solicitação nos países em que esteve de passagem durante a viagem aos EUA. Apenas se os pedidos formalizados aos outros países forem negados, o imigrante poderá recorrer aos EUA como última alternativa.

Pessoas com situação comprovada de tráfico humano ou que venham diretamente de um país que não seja signatário de tratados internacionais contra tortura e perseguição também se encaixam nas exceções à nova regra.

A iniciativa faz parte dos esforços de Trump para incluir os países da América Central na recepção de imigrantes – na prática, transformando esses Estados em barreiras contra o fluxo de imigrantes.

Após ameaçar o México com tarifas comerciais, ambos os países chegaram a um acordo, que incluiu o aumento de agentes mexicanos nas fronteiras norte e sul do país, além da expansão do Protocolo de Proteção da Imigração, que determina que requerentes de asilo devem aguardar por uma decisão do governo americano fora dos EUA.

O governo da Guatemala também está na mira de Trump, que busca um acordo para que o país aceite pedidos de asilo de todos os imigrantes que passem por seu território.

No entanto, a Suprema Corte guatemalteca negou o plano. Uma reunião em Washington entre Trump e o presidente da Guatemala, Jimmy Morales, que ocorreria ontem, foi cancelada a pedido dos guatemaltecos no domingo.

Em pronunciamento escrito, o secretário do Departamento de Segurança Interna dos EUA, Kevin McAleenan, afirmou que o objetivo do decreto é reduzir “o peso esmagador sobre o sistema doméstico americano causado por requerentes de asilo que não solicitaram proteção urgente no primeiro país disponível”. “São imigrantes econômicos sem fundado temor de perseguição e organizações criminais transnacionais, traficantes e contrabandistas, que exploram o nosso sistema para gerar lucro”, disse o secretário.

McAleenan garantiu que a medida seria para “tapar buracos”, até que o Congresso americano aprove mudanças nas leis de imigração dos EUA. No mês passado, deputados aprovaram US$ 4,6 bilhões em fundos emergenciais para reforçar as operações na fronteira com o México, apesar das críticas da oposição, que defende que a medida fortaleceria a política migratória restritiva de Trump.

O decreto deve ser contestado na Justiça por organizações de defesa dos direitos humanos. Pelas regras atuais, qualquer refugiado pode solicitar asilo nos EUA, independentemente de como ele chegou ao país./ W. POST, EFE e AP

Restrições

162.020

pedidos de asilo foram feitos aos EUA no ano fiscal de 2018 – dos quais apenas 13.168 foram concedidos