O globo, n. 31396, 23/07/2019. País, p. 4

 

Disputa de claques

Jussara Soares

Gustavo Maia

23/07/2019

 

 

Bolsonaro inaugura hoje aeroporto na Bahia; governador do estado cancela participação

Quatro dias após falas controversas sobre o Nordeste, o presidente Jair Bolsonaro desembarca hoje em Vitória da Conquista, na Bahia, para inaugurar o Aeroporto Glauber Rocha, tentando se blindar de protestos e buscando, mesmo em condições adversas, estabelecer uma agenda positiva na região em que tem a pior avaliação. Apenas 25% dos nordestinos consideram o governo ótimo ou bom, segundo a última pesquisa Datafolha, de 4 e 5 de julho. No Sul, onde tem a maior aprovação, o índice é de 41%.

Ontem, o governador da Bahia, Rui Costa (PT) cancelou sua ida à inauguração e acusou o governo federal de tornar o evento uma “convenção político-partidária”.

Segundo o colunista Lauro Jardim, inicialmente eram cerca de 200 convidados. O número passou para 300 na última sexta-feira — dia das declarações sobre os governadores do Nordeste — e, ao longo do fim de semana, subiu para 600 . Deste total, apenas cem convites eram para o governo da Bahia. O Planalto não comentou as críticas.

Em vídeo publicado nas redes sociais na tarde de ontem, o petista disse que convidou o governo federal por “boa educação”, mas “infelizmente confundiram a boa educação com covardia e, desde então, temos presenciado agressões ao povo do Nordeste e ao povo da Bahia”. Segundo ele, o último repasse do governo federal foi feito na gestão Michel Temer.

Rui Costa criticou ainda a organização do evento. “A medida anunciada é excluir o povo da inauguração, fazer uma inauguração restrita a poucas pessoas, escolhidas a dedo como se fosse uma convenção político-partidária. Não posso concordar com isso”, disse o governador. Há previsão de manifestações contrárias ao presidente em outras cidades do estado e do Nordeste.

Panos quentes

Como fez ao longo de todo o fim de semana, Bolsonaro voltou a minimizar ontem suas críticas aos governadores do Nordeste e disse que viajaria à Bahia sem temer protestos.

— Você já reparou que o pessoal fala do Nordeste como se fosse outro país, né? Nordeste, Norte, CentroOeste, Sudeste e Sul é um país só —respondeu ao ser questionado se não temia uma reação após as declarações da última sexta-feira —Estamos indo sim para a Bahia, inauguração do aeroporto, sem problema nenhum.

O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, reforçou ainda que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) não vê riscos na viagem. Para ele, o presidente será “muitíssimo bem recebido” na cidade da mesma forma como ocorre em outras regiões do país:

— Em qual cidade o presidente chega e não é ovacionado? Em todas. Ele é muito bem recebido pela população e não seria diferente em Vitória da Conquista, onde nós temos um apreço especial pelo senhor prefeito, por aquela população, e entendemos a importância, como dito anteriormente, da inauguração do aeroporto para ajudar na divulgação cultural, histórica e prover melhorias no ambiente econômico e turístico.

Durante declaração à imprensa, o porta-voz fez elogios à população do Nordeste em mais uma tentativa de superar o episódio em que Bolsonaro foi flagrado em conversa reservada com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, durante café da manhã com jornalistas da imprensa estrangeira.

No trecho audível do diálogo, o presidente diz que, “daqueles governadores de ‘paraíba’, o pior é o do Maranhão; tem que ter nada com esse cara”. Alvo de críticas de nordestinos, incluindo artistas e políticos, Bolsonaro disse mais tarde que se referia apenas a Flávio Dino, governador do Maranhão, e João Azevêdo, da Paraíba.

— O presidente enfatiza que os nordestinos representam a força do povo brasileiro, que supera adversidades de toda ordem, sendo exemplo de gente resiliente e trabalhadora — disse o porta voz, ressaltando que o Ministério de Desenvolvimento Regional viabilizou no primeiro semestre operações de crédito para o semiárido totalizando R$ 13 bilhões.

O cisma com o Nordeste é antigo. Foi a única região em que Bolsonaro perdeu no segundo turno, registrando 30,3% dos votos válidos contra 69,7% de Fernando Haddad (PT). Em maio, o presidente determinou uma força tarefa na região. Na época, Bolsonaro encomendou a cada ministério que apresentasse realizações para os nove estados nordestinos, governados por políticos da oposição.

Em busca de aproximação, o presidente queria iniciar uma série de viagens pela região. Em quase sete meses de governo, entretanto, a Bahia é apenas o segundo estado a receber a visita do presidente. Convidados subiram de 200 para 600, e só cem convites eram do governo da Bahia

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Jorge Oliveira: ‘Ele (o presidente) é muito franco’

Gustavo Maia

Jussara Soares

23/07/2019

 

 

Ministro da Secretaria-Geral credita repercussão negativa de declarações de Bolsonaro a ‘seu jeito de ser muito honesto’

Ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência há pouco mais de um mês, Jorge Oliveira credita a repercussão negativa de declarações recentes do presidente Jair Bolsonaro ao “seu jeito de ser muito honesto”. Para ele, muitas vezes se dá uma conotação “muito pejorativa” a falas de Bolsonaro por causa da “forma de se pronunciar”,

que “não representa na essência o que ele pensa e o que ele é como pessoa”.

—Ele é muito franco com as palavras, é muito simples. Não se prende ao politicamente correto, não segue protocolos. É da natureza dele. Faz sempre de forma muito espontânea. Ele sempre foi assim. E não mudou como presidente — disse Oliveira, em entrevista ao GLOBO.

Para o ministro, que foi funcionário de Bolsonaro também em alguns de seus mandatos como deputado, “qualquer ruído que se tenha toma uma proporção muito grande”.

Ele diz, no entanto, achar bom que o presidente não evite declarações polêmicas, já que isso evidenciaria sua autenticidade. O que Bolsonaro gosta ou não, “fica muito claro para qualquer um”, já que “ele não tem essa polidez de resguardar uma colocação”. O ministro reconhece que é “lógico” que esse comportamento “não vai agradar todo mundo sempre”.

Para Oliveira, o presidente passou os primeiros 200 dias do governo sem pensar em reeleição, apesar das declarações sinalizando a intenção de concorrer ao Planalto em 2022. Ele afirma que Bolsonaro tem adotado medidas duras, que causam desgaste político e perda de popularidade, por entender que são necessárias. Como exemplo, citou a reforma da Previdência, proposta que classificou como questão de Estado, e não de governo.

Questionado a respeito das declarações do presidente sobre entregar um país melhor em 2026, o ministro disse que se trata de algo “natural”, mas afirmou que a reeleição não é o foco.

—Às vezes surge alguma coisa, alguém fala, ele brinca ali e tal. Mas não é uma pauta dele, não é isso que guia. Até porque, se fosse, a gente estaria fazendo o politicamente correto, o que todo mundo fez, e a gente não está fazendo. Temos muitas pautas que a gente sabe que não são politicamente positivas, né? Mas a gente tem enfrentado isso, não tem esse apego —disse ele.

“Ele é muito simples. Não se prende ao politicamente correto, não segue protocolos. É da natureza dele. Ele sempre foi assim. E não mudou como presidente” _

Jorge Oliveira, ministro da Secretaria Geral da Presidência