O globo, n.31392, 19/07/2019. País, p. 09

 

Governo endurece regras para indicação política 

Gustavo Maia 

Naira Trindade 

Marcello Corrêa 

Bruno Góes 

19/07/2019

 

 

Anúncio. Solenidade que marcou os 200 dias do governo Bolsonaro no Planalto: foram anunciadas nove medidas para “simplificar” a vida dos brasileiros

Enquanto negocia com parlamentares a ocupação de cargos, o governo resolveu endurecer as regras para a indicação política. Além disso, prometeu cortar 25 mil cargos comissionados nos próximos 100 dias. As inciativas foram anunciadas ontem pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Na cerimônia dos 200 dias de governo, sem a presença do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), mas com a participação do Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), foram divulgadas nove medidas, a maioria anunciada como tendo o objetivo de “simplificar” a vida dos brasileiros.

Entre as medidas, Bolsonaro assinou um decreto para ampliar a exigência de que indicados a cargos em comissão estejam enquadrados na Lei da Ficha Limpa e tenham formação acadêmica compatível com a função. Em março, o governo federal já havia editado decreto prevendo essas exigências para apenas 24 mil. Com a ampliação, 100 mil cargos passarão a ser submetidos às novas regras.

Apesar da aprovação da reforma da Previdência em primeiro turno, capitaneada por Maia, o governo ainda tem dificuldades para dialogar com o Congresso e construir sua base. O evento para marcar os 200 dias do governo ocorreu, na verdade, no 199ª dia da gestão. A intenção do Planalto foi se adequar à agenda dos deputados, que entraram ontem em recesso parlamentar. Mesmo assim, com o salão lotado de autoridades, poucos deputados e senadores compareceram.

O decreto formaliza a exigência para quase todas os cargos e funções gratificadas. Ao mesmo tempo, inclui tipos de cargos para os quais já era exigido um pente fino antes da indicação, como ministro e função de natureza especial. Segundo técnicos do Ministério da Economia, só ficam de fora as chamadas gratificações, que hoje são em torno de 10 mil. Diferentemente de funções gratificadas, mais genéricas, as gratificações são cargos criados para atividades específicas da administração pública. Por isso, são criadas por lei e não puderam ser reguladas por decreto. Esse é o caso, por exemplo, das gratificações temporárias pagas a servidores designados pelo governo para trabalhar no Sistema de Proteção da Amazônia.

PANOS QUENTES

Durante a cerimônia, o governo anunciou ainda que revogou 574 atos desde o primeiro dia do ano. A ação faz parte da ação conhecida como “revogaço”, que tem como objetivo a diminuição da burocracia.

Lorenzoni negou que o decreto interfira na relação com aliados no Congresso.

— A medida é de caráter geral. O banco de talentos continua existindo. O filtro e o critério que o governo tem usado estão lá no decreto que estabelecia as condições. O que nós estamos trabalhando e a gente espera que para os 300 dias a gente consiga já anunciar é mais 25 mil cargos em comissão que serão cortados.

Deputados do centrão ainda veem com desconfiança qualquer tipo de diálogo. Líder do PL na Câmara, Wellington Roberto (PB) afirma que não se pode forçar que o governo tenha relações com o Congresso.

— Ninguém pode exigir do governo uma convivência política. Ele já demonstrou que sempre jogou o Congresso contra a sociedade e agora é muito difícil de mudar essa realidade.

Para o líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), nada deve mudar com as novas regras para nomeações, uma vez que as contratações só eram efetivadas após passar por um pente-fino.

—Não muda em nada essas novas regras. Além dessas normas já existirem e serem aplicadas, as indicações aos cargos são do próprio governo.

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Solenidade para marcar 200 dias de gestão é atípica 

19/07/2019

 

 

Estilo. Bolsonaro disse que, apesar da gravata rosa, gosta de Alcolumbre

Desde a redemocratização, Jair Bolsonaro é o primeiro presidente da República a convocar um evento para celebrar seus primeiros 200 dias de gestão. Esse tipo de cerimônia costuma acontecer para marcar os primeiros cem dias —o que também foi feito por Bolsonaro.

Um dos organizadores do livro “130 Anos: Em Busca da República”, o historiador e cientista político José Murilo de Carvalho atribui o novo marco a uma estratégia de marketing do governo:

—Imagino que seja (iniciativa de) publicidade, marketing de governo.

Mesmo que seja a primeira vez, não vejo nada de errado.  É direito dele (marcar os 200 dias e fazer anúncios). E ele está precisando.

Segundo pesquisa Datafolha realizada nos dias 4 e 5 deste mês, a gestão do presidente é aprovada por 33% da população e rejeitada por outros 33%. Bolsonaro é o presidente em primeiro mandato com a pior avaliação a esta altura do governo desde Fernando Collor de Mello, em 1990. Ainda segundo a pesquisa, para 61% dos entrevistados, Bolsonaro fez menos do que se esperava na Presidência nos últimos meses.

Em 2017, o prefeito de Osasco (SP), Rogério Lins, apresentou publicamente um balanço até o ducentésimo dia de mandato, assim como o prefeito de Nova Friburgo (RJ), Renato Bravo. Quatro anos antes, o chefe do Executivo de Natal,fez o mesmo durante evento na Fecomercio/RN.

DAMARES FAZ ESCOLA

Na solenidade de ontem, Bolsonaro fez uma brincadeira com a cor da gravata do Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Ao notar que o acessório escolhido pelo senador era rosa, Bolsonaro afirmou que, apesar da escolha, cultiva amizade com Alcolumbre:

—Apesar da gravata cor de rosa, eu gosto dele. É meu amigo.

Em janeiro, as cores rosa e azul foram centro de uma das primeiras polêmicas do governo. No dia em que assumiu a pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, a ministra Damares Alves foi filmada dizendo que o país iria viver “uma nova era” em que “menino veste azul e menina veste rosa”.

Ao discursar, Alcolumbre não fez referência à própria gravata. Ele destacou que a marca de 200 dias de governo também é importante para o Congresso, principalmente após a aprovação em primeiro turno da Reforma da Previdência pela Câmara, na semana passada. Apesar das rusgas recentes entre o Executivo e o Legislativo, o Presidente do Senado fez um afago no presidente:

—Fiz questão de estar aqui hoje, presidente, porque é uma data importante para Vossa Excelência. É uma data importante para um governo que constrói e busca acertar.