Título: FHC alfineta postura do governo
Autor: Cavalcanti, Leonardo
Fonte: Correio Braziliense, 16/10/2012, Política, p. 8
Ex-presidente critica discurso governamental de que jornalistas "atrapalham". Pesquisa indica restrição de liberdade nas Américas
Na tarde de ontem, durante palestra na 68ª Assembleia-Geral da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), os ex-presidentes do Brasil e do Peru Fernando Henrique Cardoso e Alan García falaram sobre liberdade de expressão. Questionado sobre declarações do atual presidente do Equador, Rafael Correa, contra a imprensa daquele país, Fernando Henrique fez um paralelo com o Brasil. "Aqui não é muito diferente, talvez mais discreto", disse Fernando Henrique sem citar integrantes do governo petista. "Para eles, quem atrapalha o governo é a imprensa. Agora acrescentaram um outro inimigo, que é o STF", disse o tucano, em uma referência ao mensalão.
García, que governou os peruanos durante dois mandatos (entre 1995 a 1990 e entre 2006 e 2011), disse que, nas vezes em que foi eleito, sabia que era natural receber críticas. "Mas sempre soube que a pluralidade é importante", disse García. No fim, do evento, o ex-presidente brasileiro comentou a dificuldade de o Brasil exercer atualmente um papel de valores democráticos em relação a países da América Latina. "Andamos para trás no sentido mais democrático." A presidente Dilma Rousseff chegou a constar da programação inicial da assembleia da SIP, mas o Palácio do Planalto não confirmou a participação.
Ameaças Durante o evento, também foi apresentada uma pesquisa inédita sobre liberdade de imprensa nas Américas. Os dados mostram que 67% dos editores de jornais, incluindo brasileiros, acham que a mídia tem liberdade constitucional, mas é esporadicamente ameaçada ou coagida. Promovido pela Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), o levantamento aponta ainda que os jornalistas entrevistados acreditam que está em curso um amplo processo de restrição à liberdade de imprensa. As maiores ameaças vêm dos governos (36%), de medidas judiciais (28%), organizações criminosas (9%) e Poder Legislativo (7%).
No Brasil, 41% dos participantes da pesquisa acreditam que são as medidas judiciais que dificultam o trabalho dos jornalistas. Os países mais ameaçados, segundo o levantamento, são Venezuela (82%), Argentina (62%), Cuba (60%), Equador (46%) e México (39%). Os agentes da violência contra a imprensa são grupos políticos (63%) e organizações criminosas (55%). Segundo os editores, nos últimos cinco anos, 38% dos veículos de imprensa tiveram jornalistas ameaçados ou mortos, 8% estão sob proteção e 32% adotaram regras de segurança. Ao todo, foram entrevistados 101 editores.
"Para eles, quem atrapalha o governo é a imprensa. Agora acrescentaram um outro inimigo, que é o STF" Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente
Protesto do lado de fora
Representantes de entidades em defesa da liberdade de expressão e organizadores da campanha "Para expressar a liberdade" realizaram ontem um protesto em frente o hotel, no centro de São Paulo, onde ocorre a 68ª Assembleia Geral da SIP. Durante a manifestação, o grupo pregou 12 cartazes que apresentam temas considerados "invisíveis" pela mídia, como o fechamento de rádios comunitárias e ameaças de morte sofridas por repórteres. Já durante o encontro da SIP, jornalistas reconheceram a dificuldade para se investigar o narcotráfico no México. "É uma tristeza não poder aprofundar o jornalismo investigativo devido ao poderio imenso do narcotráfico", disse à Agência Efe Heriberto Deándar, proprietário e diretor-geral do jornal Hora Cero de Tamaulipas.