O globo, n.31390, 17/07/2019. País, p. 08

 

Partidos punem infiéis, mas poupam filiados que são réus na Justiça 

Guilherme Caetano 

Silvia Amorim 

17/07/2019

 

 

Milhões. Dinheiro encontrado em bunker do ex-deputado Geddel Vieira Lima, que, apesar de preso, continua no MDB

Enquanto ameaçam expulsar parlamentares que votaram contra a orientação do partido na reforma da Previdência, PSB e PDT não adotaram o mesmo rigor com deputados que viraram réus por diversos crimes. Nos últimos anos, pelo menos quatro parlamentares do PDT e dois do PSB passaram a essa condição e não tiveram pedido de expulsão analisado pelo conselho de ética dessas siglas.

No PDT, Robério Monteiro (CE) é acusado de crime ambiental; Gil Cutrim (MA), de crime contra a Lei de Licitações, peculato e formação de quadrilha; Afonso Motta (RS), corrupção ativa, estelionato e ocultação de bens; e Weverton Rocha (MA), de contratação de empresa sem licitação.

Já no PSB, Camilo Capiberibe (AP) responde por crime contra o sistema financeiro, enquanto Adilton Sachetti (MT), por crime de responsabilidade. Os partidos alegam que não abrem processos de expulsão porque eles ainda não foram condenados.

HISTÓRICO

Por outro lado, oito deputados do PDT e 11 do PSB já entraram na mira dos conselhos de ética de seus partidos por terem votado a favor da reforma da Previdência. Em 2017, o PSB expulsou 13 filiados que votaram a favor da reforma trabalhista do governo Michel Temer.

—O PSB é o segundo partido mais antigo do Brasil e tem raízes muito profundas. Isso faz com que, de tempos em tempos, grupos ou pessoas que entram para o partido e discordam de princípios importantes para o PSB acabam tendo de sair, porque esbarram nessa formação mais sólida do PSB —afirma Theo Rochefor, coordenador nacional de comunicação da legenda.

No PDT, uma das que vão enfrentar processo na Comissão Nacional de Ética Partidária é a deputada Tabata Amaral (SP). Para o candidato derrotado à Presidência da República pelo PDT no ano passado, Ciro Gomes, ela deveria deixar a sigla de forma espontânea por estar fazendo “dupla militância” — uma referência ao fato de ela integrar o movimento Acredito, que prega a renovação na política.

A sigla de Leonel Brizola expulsou em 2016 Giovani Cherini (RS) após o deputado votar pelo impeachment de Dilma Rousseff, ignorando a orientação de apoio à petista. Ameaçado de expulsão pelo mesmo motivo, o senador Lasier Martins (RS) pediu desfiliação meses depois.

Questionado do porquê o partido não abre processos internos contra parlamentares que se tornaram réus em processos criminais, o presidente do Comitê de Ética Nacional do PDT, Marcos Ribeiro, diz que o partido não pode condenar as pessoas antecipadamente, antes de sentenças judiciais:

— Se não houver condenação em última instância ou uma repercussão muito séria, a tradição partidária é que se afaste o filiado para ele se defender. Temos muita precaução com esse tipo de coisa, porque muitas vezes isso é usado de maneira ordenada só para afastar o parlamentar.

LUPI E SUA FICHA

O presidente do PDT, Carlos Lupi, é réu em uma ação civil pública por improbidade administrativa. Segundo o Ministério Público Federal, em 2009 ele viajou para agendas oficiais como ministro do Trabalho em uma aeronave alugada pelo dono de uma empresa que tinha interesses em contratos com o ministério.

Para Humberto Dantas, professor de Ciência Política do Insper, há oportunismo na atuação do PDT e PSB no episódio envolvendo os deputados que desobedeceram orientação partidária na votação da reforma da Previdência.

— Partidos punem e protegem conforme a conveniência. Acho que o PDT enxergou nessa polêmica dos infiéis na votação da Previdência espaço para se projetar como oposição, coisa que a sigla não tinha conseguido em toda a discussão sobre a reforma — diz Dantas, que ainda avalia a situação do PSB: —Já o O PSB sempre foi um partido adesista, sem muita organicidade. Exigir alinhamento dos parlamentares soa como uma tentativa do partido de mostrar autoridade internamente.

A situação nesses dois partidos é similar ao que acontece nas grandes legendas que, em geral, só propõem ações de expulsão para parlamentares que são infiéis, mas não punem investigados, por exemplo, por corrupção. No MDB, o ex-deputado Geddel Vieira Lima (BA), que está preso desde 2017, chegou a ser afastado do por 60 dias, mas um processo de expulsão contra ele não andou. Geddel foi preso depois que policiais encontraram em um apartamento de Salvador malas com R$ 51 milhões atribuídas a ele.