Título: Corrida para renovar concessão
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 06/10/2012, Economia, p. 13

Acionistas da CEB reivindicam prioridade em investimentos para assegurar a manutenção da Licença concedida pelo governo. Empresa tem até o dia 15 para apresentar proposta à AneeL

As pesadas mudanças impostas pelo Palácio do Planalto ao setor elétrico jogaram luz sobre as causas da má qualidade dos serviços prestados pela Companhia Energética de Brasília (CEB), cujo desempenho está abaixo dos padrões exigidos pela legislação e é alvo diário de críticas dos clientes. Além de cobrar mais eficiência das empresas do setor, a Medida Provisória (MP) 479, assinada em 11 de setembro pela presidente Dilma Rousseff, antecipa para o próximo ano a renovação dos contratos de concessionárias que vencem a partir de 2015, caso da CEB Distribuição. Caberá à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidir se dará mais 20 anos de concessão à distribuidora local, condicionada à redução de tarifas, à análise do desempenho operacional e a outros itens ainda desconhecidos.

Preocupados com os índices de qualidade insuficientes e as dúvidas sobre a capacidade de reação da CEB, seus acionistas minoritários aproveitam o aperto regulatório em marcha para cobrar rapidez nos avanços já anunciados pela atual gestão da companhia. Não à toa encaminharam à direção da empresa e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pedido para a realização de uma assembleia geral extraordinária para tratar do assunto. Eles temem o risco de perda da concessão.

"A baixa qualidade dos serviços prestados nos últimos quatro anos resultou em multas milionárias da Aneel. Os gastos com pessoal estão 39% acima do considerado razoável pela agência e o valor pago pelas compras de produtos e serviços é quase o dobro do aceitável", afirmou ao Correio François Moreau, sócio com 2% do capital total da CEB Distribuição. Segundo ele, outros investidores que formam o bloco minoritário (17,5%) pensam da mesma forma e exigem um controle mais rígido da gestão. Se somar a participação do Regius, fundo de pensão dos funcionários do BRB, o governo do Distrito Federal detém 74% do bolo societário.

Irresponsabilidade

Apesar de pressões diversas de agentes do mercado, que incluem até sugestões de privatizar a companhia, a diretoria da holding avisou que entregará à Aneel o seu pedido de renovação no próximo dia 15, data limite fixadape-la MP 479. "A distribuidora tem um grave problema de ordem financeira, gerado pela irresponsabilidade de administrações passadas e que está sendo equacionado. Por outro lado, ainda é uma das empresas do setor de maior potencial econômico em razão de seu monopólio sobre uma área geográfica pequena e público consumidor de elevada renda média", observou Rubem Fonseca Filho, presidente da CEB. "Para recuperar a empresa, não precisamos privatizá-la", assegurou.

Fonseca Filho garantiu que já conseguiu reduzir o "Custo CEB", o que permitiu a empresa diminuir um prejuízo de R$ 32 milhões, em 2010, para uma perda de R$ 3 milhões no ano seguinte. No primeiro semestre deste ano, o balanço voltou ao azul, com lucro de R$ 9 milhões. Os acionistas minoritários ressaltam, contudo, que os resultados melhores só foram possíveis graças à venda de terrenos da estatal. A diretoria concorda em parte e informa que ainda tem muito patrimônio sem uso operacional a ser vendido. "A dívida da empresa, de R$ 800 milhões, está equacionada", assinalou a diretora financeira da estatal, Eli Soares Jucá.

Com uma longa história de falhas no atendimento ao consumidor, um dos piores do país, que atingiram seu auge na quinta-feira, após um apagão histórico que deixou às escuras 70% de seus 880 mil clientes (residências e estabelecimentos comerciais) por até * seis horas, a CEB corre contra o tempo para cumprir compromissos já assumidos com o órgão regulador e, ainda, capacitar-se a outros. A empresa iniciou uma série de medidas para restaurar a capacidade de ação frente aos transtornos cotidianos, incluindo a renovação de frota e exigência de ponto dos servidores.

Além de tentar retomar a confiança do mercado, que, no passado, a considerou uma das melhores do setor no país, a estatal negocia há meses empréstimos da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para ampliar e modernizar sua rede e iniciar uma nova etapa a partir de 2014. "Não se compra subestações e linhas de alta transmissão em supermercados. São investimentos de longa maturação, de pelo menos 18 meses, e elevada complexidade", ressaltou o presidente da CEB. Ele espera fechar acordo também com a Eletrobras para investir em redes de distribuição, apesar do sufoco atual da holding federal com a reavaliação do patrimônio proposta pelo pacote elétrico.

Investimentos

Analistas ouvidos pelo Correio e a própria diretoria da empresa reconhecem que a má gestão e uma cultura de ingerência política levaram a estatal a acumular problemas de difícil correção. Formou-se um círculo vicioso, no qual baixos investimentos nas redes de distribuição levaram a péssimos serviços que, punidos com multas e ressarcimentos diretos e indiretos aos usuários, reduziram as tarifas de empresas. Com os ralos no caixa, a CEB se endividou ainda mais, deixou fornecedores na mão, além de perder capacidade de investir. "Essa realidade começou a mudar. Estamos investindo no maior plano da nossa história, R$ 130 milhões, e logo iniciaremos outro", afirmou Fonseca Filho.

Ele e os minoritários concordam que a interferência política levou ao absoluto descontrole de custos e a sérios danos de operação. A divergência dos dois lados está na velocidade com que as mudanças realizadas até agora, como a renegociação dos contratos de compras, estão produzindo efeitos. Mas a ansiedade maior vem mesmo do consumidor, que soma prejuízos de toda ordem. A fragilidade das linhas de transmissão e subestações está evidente — faça sol ou faça chuva. Prova disso é que apenas no dia que marcou o fim da seca no Distrito Federal, 21 de setembro, a CEB registrou quase 900 ocorrências por falta de energia em diversas regiões atendidas.

"A renovação de concessões poderá ser particularmente benéfica para a distribuidora do Distrito Federal, considerando que a redução de tarifas vai ampliar o consumo e reduzir a inadimplência", comentou um líder do setor elétrico. Seu temor está, contudo, no poder dado aos eletricitários na gestão dos negócios. "A CEB é o exemplo clássico de estatal que a diretoria trata bem empregados para que ignorem desmandos administrativos", sublinhou.