O Estado de São Paulo, n. 45971, 29/08/2019. Política, p. A10

 

Relator do sj vota por reabertura do caso Riocentro

Amanda Pupo

29/08/2019

 

 

Ministro afirma que a Lei da Anistia se aplica a fatos anteriores; julgamento é suspenso por pedido de vista

O ministro Rogério Schietti, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), votou ontem para que os militares envolvidos no atentado do Riocentro sejam processados pela Justiça. A avaliação do relator é de que o caso envolve possível crime contra a humanidade e, portanto, é imprescritível. No entanto, a sessão foi suspensa após o ministro Reynaldo Soares da Fonseca pedir vista (mais tempo de análise). Não há previsão de quando o julgamento será retomado.

A discussão foi reaberta exatamente 40 anos depois de o então presidente João Figueiredo sancionar – em 28 de agosto de 1979 – a Lei da Anistia, que concedeu perdão a crimes políticos cometidos no Brasil entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. O caso conhecido como Riocentro, que resultou na explosão de duas bombas de fabricação artesanal, ocorreu na noite de 30 de abril de 1981 – depois da promulgação da lei – durante um show de música popular brasileira em um centro de convenções para comemorar o Dia do Trabalho.

Naquela noite, o plano dos militares não saiu como esperado. Uma das bombas explodiu antes da hora, ferindo gravemente o capitão Wilson Luís Machado e matando o sargento Guilherme Pereira do Rosário. Ambos pertenciam ao Departamento de Operações Internas-Centro de Operações para a Defesa Interna (DOI-Codi). A segunda bomba caiu numa estação de fornecimento de energia elétrica, mas o show de música não foi interrompido.

Segundo o relatório da Comissão Nacional da Verdade, pela forma como foi elaborado e pelo público de cerca de 20 mil pessoas no evento, o caso do Riocentro foi planejado para ser, “possivelmente, o maior atentado terrorista da história do Brasil”, com a finalidade de paralisar o processo de reabertura democrática e “forjar um ato terrorista, que seria atribuído à esquerda armada”.

Argumentos. Representante do Ministério Público Federal na Corte, o subprocurador-geral da República Haroldo Ferraz da Nóbrega afirmou que o episódio foi algo “estarrecedor”, sendo necessário, em sua visão, que o processo volte a tramitar. Já o advogado que falou em nome do processado Yuri Saramago destacou que a Justiça já teria reconhecido a extinção da punibilidade.

Em longo voto, Schiett ides tacou o entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre crimes contra a humanidade, observando que o Brasil estaria atrelado a ele por ser signatário de tratados. “Não estamos deixando de aplicar Lei da Anistia. Ela é de 79, ela se aplica a fatos anteriores. Todo aquele questionamento, debates que se sucederam, nesse caso não parece ter o mesmo relevo”, disse.

Schietti afirmou que, após leitura de trechos da denúncia, da decisão em primeira instância e do relatório da Comissão Nacional da Verdade, é possível constatar que o caso fez parte de uma “série de ataques orquestrados” de agentes do Estado contra“adita ameaça comunista personificada pelos opositores do regime ”.

‘Fatos anteriores’

“Não estamos deixando de aplicar Lei da Anistia. Ela é de 79; ela aplica-se a fatos anteriores. Todo aquele questionamento, debates que se sucederam, nesse caso não parecem ter o mesmo relevo.”

Rogério Schietti Cruz

MINISTRO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ)