Título: Doação via internet não decola
Autor: Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 05/10/2012, Política, p. 6

Apenas dois candidatos a prefeito conseguiram levantar algum dinheiro pela rede de computadores. Em todo o país, foram arrecadados apenas R$ 203 mil. Nos EUA, esse tipo de financiamento movimenta milhões de dólares

Lançada em 2010 pela Justiça Eleitoral como uma forma de aproximar o eleitor do candidato e melhorar o sistema de arrecadação dos partidos, a modalidade de doação via internet não deslanchou. Somente 34 candidatos a prefeito e vereador, dos quase 450 mil espalhados pelo país, receberam algum dinheiro pela internet. As doações feitas pela rede somam apenas R$ 203,4 mil, montante que não representa sequer 0,1% do total arrecadado pelos candidatos, comitês e diretórios para o pleito deste ano. Em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, nenhum candidato à prefeitura da cidade recebeu recursos pela web — situação bem diferente da dos Estados Unidos, onde as doações por computador alcançam cifras milionárias.

"Essa via ainda é muito pouco explorada no Brasil. Não temos essa cultura de doações dos eleitores aos candidatos aqui, muito menos eletronicamente. Nos EUA, há mais de 40 anos se admite doações diretas dos eleitores a quem disputa cargos públicos", explica o professor de direito eleitoral da Universidade de Brasília (UnB) Augusto Aras. Segundo ele, as relações comerciais via internet ainda não conquistaram a confiança do brasileiro. "Não há mecanismos confiáveis. Nos últimos anos, 30 milhões de crimes foram praticados na rede. A doação eleitoral nessa via ainda é carente de segurança jurídica para a aceitação do cidadão brasileiro".

Nas páginas dos principais candidatos a prefeito na internet não há nenhum mecanismo ou atalho que permita ao visitante fazer uma doação on-line. Quem explora essa ferramenta, porém, larga na frente. É o caso de Marcelo Freixo (PSol), que disputa a prefeitura do Rio de Janeiro. Até o começo de setembro, data da última prestação de contas divulgada pela Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Freixo arrecadou R$ 42,7 mil. Mais de 400 pessoas desembolsaram valores que variam entre R$ 2 e R$ 3 mil.

Segundo a assessoria do candidato, o mecanismo na internet torna o cidadão comum mais atuante no processo eleitoral porque se trata de um canal de fácil acesso e que boa parte dos jovens já está acostumada à linguagem. É como comprar produtos pela internet. Basta ter um cartão de crédito e preencher dados básicos antes de digitar o valor que quer doar. O PSol tem como princípio não receber doações de bancos, empreiteiras e multinacionais.

Ainda no Rio, o candidato tucano à prefeitura, Otávio Leite, também conseguiu arrecadar algum dinheiro pela rede. Apesar da quantia ínfima — somente R$ 2,4 mil — é o único, ao lado de Freixo, na listagem de arrecadação pela internet.

Entre as doações feitas diretamente aos partidos pela internet, o PT foi a legenda que mais dinheiro recebeu. O comitê em Itararé (SP) foi contemplado com R$ 50 mil, doados por uma empresa de pneus. O PP aparece logo em seguida, com R$ 23 mil recebidos no Rio Grande do Sul e no Rio Grande do Norte.

EUA: prática comum Nos Estados Unidos, a situação é bem diferente. O presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, por exemplo, arrecadou meio bilhão de dólares em doações pela internet durante quase dois anos de campanha para o pleito de 2008. Ao todo, 3 milhões de doadores repassaram 6,5 milhões aos candidatos americanos — a maioria de valor individual inferior a US$ 100. A média por doador foi US$ 80 e a maioria dos colaboradores fez mais de uma doação.

Pelas regras brasileiras, os candidatos, comitês financeiros e partidos que quiserem buscar financiamento eleitoral pela internet devem tornar disponível algum mecanismo que permita a identificação do doador e a emissão obrigatória de recibo eleitoral.

"Nos últimos anos, 30 milhões de crimes foram praticados na rede. A doação eleitoral nessa via ainda é carente de segurança jurídica para a aceitação do brasileiro" Augusto Aras, professor de direito eleitoral da UnB

Caixa virtual Confira a arrecadação total e via internet de partidos, comitês e candidatos

Total Total pela internet Partidos R$ 234,6 milhões R$ 3,6 mil* Comitês R$ 223,5 milhões R$ 101,5 mil** Candidatos R$ 1,4 bilhão R$ 98,3 mil***

*doado ao diretório municipal do PPS em São Vicente-SP **PT de Itararé-SP foi o diretório que recebeu a maior doação: R$ 50 mil de uma empresa de pneus ***Marcelo Freixo, candidato do PSol à prefeitura do Rio de Janeiro, foi quem mais captou: R$ 42 mil

Fonte: segunda prestação de contas divulgada pelo TSE

Memória Pouco dinheiro em 2010 Pela lei eleitoral, o candidato que disputa cargo eletivo no Brasil pode usar dinheiro próprio, recursos de doações feitas por pessoas físicas ou jurídicas e a verba repassada pelos comitês de campanha, incluindo a cota do Fundo Partidário. Tudo deve ser devidamente registrado na Justiça Eleitoral. Em 2010, os candidatos tentaram arrecadar recursos também pela internet. Inspirados na campanha de Barack Obama à Presidência dos Estados Unidos dois anos antes, que conseguiu receber meio bilhão de dólares por meio de doações feitas por seus eleitores na internet, os brasileiros tentaram encher o cofre também pela rede. Porém, o sucesso foi bem menor. Na eleição presidencial de 2010, Dilma Rousseff (PT) arrecadou somente R$ 240 mil via internet. Marina Silva (PV) contabilizou apenas R$ 170 mil vindos de doadores na rede.