Correio braziliense, n. 20482, 19/06/2019. Política, p. 3

 

Moro vai encarar senadores

Renato Souza

19/06/2019

 

 

Poder » Ministro da Justiça está com discurso na ponta da língua para a audiência pública na CCJ da Casa, hoje. Ele explicará as conversas que teve com o procurador da Lava-Jato Deltan Dallagnol quando era juiz

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, ficará frente a frente com senadores, hoje, às 9h, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Ex-juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, ele terá meia hora para explicar mensagens trocadas com o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato no Paraná. Diálogos, que teriam sido alvo de hacker, foram divulgados pelo site The Intercept. Nos últimos dias, Moro buscou apoio de parlamentares e preparou o discurso que será apresentado na sabatina.

Dos 26 parlamentares aptos a fazer perguntas ao ministro, pelo menos cinco foram denunciados pela Lava-Jato. Entre eles, o ex-presidente do Senado Renan Calheiros, que responde a 13 inquéritos no Supremo Tribunal Federal.

Para convencer os senadores de que agiu tecnicamente, Moro repetirá que conversas entre as partes do processo fazem parte do jogo, desde que não causem impacto no resultado do julgamento. A base do governo vai tentar blindar o ministro de críticas, enquanto a oposição buscará prejudicar a imagem de Moro — e, de quebra, do governo —, que desfruta de grande popularidade justamente pela atuação do então juiz na maior operação de combate à corrupção da história do Brasil. Fato é que o cenário estará bastante hostil ao convidado.

A segurança do Senado foi reforçada para a chegada do ministro. Ele não deixou de comparecer a eventos públicos e manteve a sua agenda oficial após as divulgações dos diálogos. No entanto, tem evitado responder a perguntas da imprensa.

A sabatina de hoje é fundamental para os próximos passos de Moro. Ele começa a sofrer bombardeio no Congresso, o que impede o avanço do seu projeto anticrime e de outras pautas do governo. Além disso, fica cada vez mais difícil ganhar o aval do Senado para assumir uma vaga no Supremo.

“Melindrar”

Ontem, Moro se reuniu com integrantes da Frente Parlamentar pela Agricultura da Câmara, em Brasília. De acordo com o deputado Alceu Moreira (MDB-RS), o ministro falou sobre as acusações e se defendeu, afirmando que todas as condenações que realizou ocorreram com base na legislação. “Diga-me um só julgado que seja, de qualquer um desses crimes, que não esteja coberto pela lei”, teria dito o ex-juiz, de acordo com o deputado. Moro também teria afirmado que não procede a informação de que as conversas foram vazadas por um procurador que participava dos grupos do aplicativo pelo qual foram trocadas as mensagens.

Ontem à noite, o Intercept divulgou mais um trecho de conversas entre Moro e Dallagnol.

O site deixa a entender que o então juiz quis proteger o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Nos diálogos, Moro questionou o procurador sobre uma investigação contra o tucano, a classificou como fraca e disse que poderia “melindrar alguém cujo apoio é importante”. O site Antagonista, no entanto, mostrou que as frases publicadas pelo Intercept estavam fora de contexto. Moro disse que viu reportagem sobre caixa 2 contra FHC na tevê e achou muito fraco. Ele perguntou também se o eventual crime não estava prescrito. Dallagnol respondeu que não foi analisada a prescrição, ao que o então juiz respondeu: “Acho questionável, pois melindra alguém cujo apoio é importante”.

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Ministro diz que agiu com lisura

19/06/2019

 

 

 

 

O ministro da Justiça, Sérgio Moro, afirmou ontem, em entrevista no Programa do Ratinho, do SBT, que a violação do sigilo de suas comunicações e de procuradores da força-tarefa Lava-Jato é feita por “um grupo criminoso organizado”, que pretende prejudicar as investigações e anular as penas dos condenados por corrupção. Ele disse também não se lembrar se realmente enviou, pelo aplicativo Telegram, as mensagens que vêm sendo divulgadas pelo site The Intercept.

“Em relação às minhas mensagens, o que eu troquei ou não troquei, eu não posso nem confirmar, porque eu não tenho mais as mensagens. Mas eu tenho a mais absoluta confiança de que sempre agi com lisura dentro da minha profissão”, frisou, rebatendo as acusações de que aconselhou procuradores da força-tarefa em questões relacionadas a processos.

Apresentado por Ratinho como “o único herói brasileiro no momento”, Moro disse estar tranquilo em relação à sua conduta à frente da 13ª Vara Federal de Curitiba. No entanto, afirmou que os ataques cibernéticos são motivos de preocupação.

“Eu acho que todos nós devemos nos preocupar, porque é um ataque, de certa maneira, às instituições. Não só eu fui vítima dessa tentativa, mas também procuradores da Lava Jato. Nós temos notícias até de jornalistas, igualmente até de parlamentares, ou seja, é um ataque orquestrado”, destacou.

“E aqui, a minha opinião — a Polícia Federal está investigando, com independência e autonomia —, é que a gente não está falando de um adolescente na frente de um computador querendo fazer algumas estripulias, mas sim de um grupo criminoso organizado, cujo objetivo, na minha opinião, é obstaculizar os avanços das investigações da Operação Lava-Jato”, declarou. Ele contou que o trabalho na força-tarefa sempre “foi muito difícil, de muita pressão de gente poderosa”. “Em vários momentos, eu pensava se era possível romper essa impunidade da grande corrupção.”

Moro afirmou que, nos últimos dias, foi deflagrada uma estratégia de contrainteligência pelos responsáveis pelos vazamentos, com o objetivo de prejudicar a apuração sobre os ataques cibernéticos. “Na semana passada, esse hacker começou a invadir alguns telefonemas e começou a fazer brincadeiras. E qual era a intenção? A de passar aquela ideia de adolescente irresponsável. Nesse final de semana, circulou uma outra informação de contrainteligência, de que seria um procurador (o autor dos vazamentos), que teria traído os demais”, enumerou. “Eu vi o meu telefone, a tentativa de ele ser atacado. Recebi três ligações do meu número e, em seguida, invadiram aquele aplicativo Telegram. Então, não é alguém que traiu. Existe, sim, um grupo criminoso organizado cujo objetivo é obstaculizar as investigações ou buscar a anulação de quem já foi condenado por corrupção.”