O Estado de São Paulo, n. 45957, 15/08/2019. Política, p. A6

'Ala ideológica' e Centrão disputam fundo biblionário

Mateus Vargas

15/08/2019

 

 

Indicação de nomes para a diretoria que administra orçamento de mais de R$ 50 bi opõe integrantes do governo e de partidos do bloco

Os partidos do Centrão e a chamada “ala ideológica” do Ministério da Educação (MEC) disputam a indicação de nomes para a diretoria do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão cobiçado pelo orçamento superior a R$ 50 bilhões e que trata desde a compra de livros escolares ao Financiamento Estudantil (Fies). As siglas esperam conseguir ao menos quatro das seis diretorias do órgão.

Alguns nomes já foram convidados, mas ainda não está definido qual dos partidos do bloco – DEM, PP, PL, PRB e Solidariedade – ficaria com cada diretoria. O acordo é metade das vagas para indicados da Câmara e a outra parte do Senado.

A principal disputa é para escolher o novo diretor de Gestão, Articulação de Projetos Educacionais (Digap), área que serve de intermediária para parlamentares destinarem recursos de emendas a Estados e municípios. O Estado apurou que o senador Ciro Nogueira (PPPI) tem interesse em emplacar neste posto um aliado. No entanto, segundo uma fonte que acompanha as articulações, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, avalia indicar Ana Cristina Bittar Oliveira, hoje em outra diretoria do FNDE.

Segundo mais de uma fonte ouvida pelo Estado, as indicações do Senado devem passar, além de Ciro, pelo presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Na Câmara, o PRB deve emplacar um indicado e Rodrigo Maia (DEM-RJ) teria o direito de dar o aval a outro. Maia e Alcolumbre negam participar da negociação.

A articulação com o governo está sendo feita com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM). Conforme o Estado antecipou, a distribuição de cargos, além da liberação de emendas parlamentares, foi uma das estratégias adotadas pelo governo para conseguir levar adiante a reforma da Previdência.

As trocas em diretorias ocorrem em momento de crise no FNDE. O déficit de funcionários tem atrasado a análise de milhares de processos judiciais sobre o Fies, além da transferência de recursos para construção e reformas de creches. A falta de funcionários ocorre após o MEC anular, por suspeita de irregularidades, contrato com a Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), que vigorava desde 2008.

Duas fontes envolvidas nas indicações ao órgão acreditam que as mudanças podem acirrar conflitos internos. Hoje, há entre os diretores desde militares a funcionários de carreira do FNDE. Uma hipótese será acomodar os atuais dirigentes em cargos menores, como secretarias do fundo. Outro possível conflito, segundo as mesmas fontes, será conciliar interesses dos partidos do Centrão com os da ala ideológica do ministério, influenciada pelo escritor Olavo de Carvalho, considerado o guru do bolsonarismo.

O governo anunciou na semana passada que o advogado Rodrigo Sergio Dias irá substituir o professor Carlos Alberto Decotelli como presidente do FNDE. A nomeação de Dias ainda não foi publicada no Diário Oficial da União.

O advogado é primo e braço direito de Alexandre Baldy (PP-GO), secretário de Transportes Metropolitanos no governo de São Paulo e aliado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Dias presidiu em 2018 a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), órgão com função similar à do FNDE, de executar ações do ministério, mas que apresenta orçamento inferior, na casa de R$ 3 bilhões.

Investigações. Na Funasa, Dias foi alvo de investigação do Tribunal de Contas da União (TCU) por suspeita de superfaturamento de produtos e fraude em licitações no período em que comandou a Funasa – o que ele negou à época.

O advogado chegou a ser indicado em 2018 para a diretoria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas o processo travou nas mãos da ex-senadora Marta Suplicy (sem partido). O motivo seria, além dos questionamentos do TCU, uma ação a que Dias respondia sobre agressão contra a ex-mulher. A indicação à agência foi retirada.

Em maio deste ano, Dias foi absolvido da acusação de agressão, mas foi condenado pelo crime de lesão corporal contra o então advogado dela. Nos bastidores, especula-se que a absolvição retirou o “veto político” e cacifou o advogado para retornar a Brasília. Procurado, Dias não quis se manifestar.

O senador Ciro Nogueira e o Ministério da Educação não responderam aos questionamentos da reportagem enviados desde anteontem.

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Demissão atinge secretário de Comunicação

Tânia Monteiro

15/08/2019

 

 

A demissão do jornalista Paulo Fona, anteontem, da Secretaria de Imprensa da Presidência da República, respingou no secretário de Comunicação Social (Secom), Fábio Wajngarten. Foi ele o responsável pela indicação de Fona, contestada nos bastidores pelo passado do jornalista em governos de esquerda.

Antes de integrar o governo, Fona foi secretário de comunicação nos governos de Rodrigo Rollemberg (PSB), no Distrito Federal, e de Yeda Crusius (PSDB), no Rio Grande do Sul.

Wajngarten apostou na experiência de Fona para o contato direto com jornalistas. No entanto, a indicação foi objeto de ataques nas mídias sociais bolsonaristas desde antes de ser oficializada, com direito a mensagens em grupos de WhatsApp dos quais Bolsonaro participa.

No Planalto, Fona é considerado “pouco alinhado” com o modelo bolsonarista

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PSOL recebe apenas 0,002% do total de emenda parlamentar

Felipe Frazão

15/08/2019

 

 

 

 

 

 

 Recorte capturado

Partido de oposição obteve R$ 21,6 mil do total da verba impositiva; MDB lidera execução com R$ 182 milhões

O governo de Jair Bolsonaro preteriu, na distribuição de recursos do Orçamento, o pagamento de emendas indicadas por parlamentares do PSOL. Do R$ 1,4 bilhão quitado nos primeiros sete meses deste ano, apenas R$ 21,6 mil foram destinados por deputados do partido de oposição, segundo levantamento feito pelo Estado.

As emendas deste ano foram decididas por senadores e deputados da legislatura passada – parte deles não se reelegeu. Em dobradinha com prefeitos e governadores, parlamentares costumam remeter a verba a investimentos em seus redutos eleitorais, como asfaltamento de ruas e compra de ônibus escolares. Embora impositivas – o governo é obrigado a pagá-las –, a prioridade a algumas emendas é fruto de negociação política.

O valor para atender ao PSOL representa 0,002% do que foi pago aos congressistas. O dinheiro faz parte de apenas uma emenda, da deputada Luiza Erundina (SP), destinado a uma entidade de ensino profissionalizante. Ao todo, o governo empenhou R$ 503 mil dessa emenda, mas o Ministério da Educação só quitou R$ 21,6 mil.

A quantia paga às indicações feitas por nomes do PSOL – que tinha seis deputados no ano passado – é menor até do que a de partidos nanicos, como o PTC, que teve R$ 1,2 milhão liberado.

O MDB lidera a lista com R$ 460 milhões empenhados e R$ 182 milhões pagos. No ano passado, a bancada emedebista era a segunda maior na Câmara e a maior no Senado – ambas somavam 68 parlamentares. O PT, cuja bancada no Congresso era a mais expressiva, com 70 nomes, é o segundo, com R$ 401 milhões comprometidos e R$ 170 milhões transferidos.

O PSL, partido do presidente, tinha oito parlamentares no ano passado, entre eles o presidente, à época eleito pelo Rio, e seu filho Eduardo, representante de São Paulo. A bancada já teve R$ 35 milhões empenhados, dos quais R$ 5,4 milhões foram pagos pelo governo.

O Planalto sempre argumentou que o empenho e o pagamento seguem a legislação e critérios técnicos. Procurada, a Secretaria de Governo da Presidência não comentou.

“Isso (R$ 21,6 mil) pode botar no traço em termos monetários. É uma retaliação. Eles (governo) tendem a criar dificuldade”, disse o líder do PSOL na Câmara, Ivan Valente (SP). O partido estuda recorrer à Justiça para conseguir a liberação.

A líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), ponderou. “Temos até 31 de dezembro para pagar o que é impositivo. A vez do PSOL chegará, depois do Papai Noel”, afirmou a deputada.