Valor econômico, v.19, n.4685, 07/02/2019. Política, p. A12

 

PGR abre mão de inquérito sobre suposto crime eleitoral de Flávio Bolsonaro 

André Guilherme Vieira 

Isadora Peron

Vandson Lima 

Cristian Klein

07/02/2019

 

 

A Procuradoria-Geral da República (PGR) considerou, em manifestação feita ontem à noite, que cabe à Procuradoria Regional Eleitoral no Rio de Janeiro investigar o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) por suposta lavagem de dinheiro relacionada à falsificação de documento público para fins eleitorais. O inquérito foi aberto em junho de 2018 pelo procurador eleitoral Sidney Madruga, que encaminhou os autos à PGR na segunda-feira.

Trata-se de suspeita de ocultação de bens na aquisição de imóveis declarados à Justiça Eleitoral do Rio em 2018 por valor abaixo do de mercado, segundo a procuradoria. O inquérito foi revelado anteontem pelo jornal 'O Globo'. Essa frente de investigação menciona suposto "aumento exponencial" de patrimônio envolvendo negociações imobiliárias realizadas pelo filho mais velho do presidente da República Jair Bolsonaro. Segundo a manifestação da PGR, "teria havido crescimento patrimonial não justificado, a considerar as prestações de contas apresentadas à Justiça Eleitoral em um período de 15 anos, que se inicia no primeiro mandato parlamentar".

A PGR entendeu que o caso é da segunda instância, porque "os fatos investigados no inquérito policial (...) precedem o início do mandato de senador da República pelo representado e não têm relação com o exercício deste mandato parlamentar federal".

Na eleição de 2018, Flávio Bolsonaro declarou à Justiça Eleitoral apartamento no valor de R$ 917 mil e uma sala comercial avaliada em R$ 150 mil, na Barra da Tijuca. Em 2014 o hoje senador declarou apenas um apartamento de R$ 565 mil no bairro de Laranjeiras. O valor patrimonial aumentou de R$ 714 mil, em 2014, para R$ 1,7 milhão, segundo a Justiça Eleitoral, incluídos investimentos, participação em uma empresa e um automóvel.

Segundo uma fonte a par dos autos na PGR, há, em tese, a possibilidade de o procurador regional eleitoral entender que a investigação deve ser separada da que apura suspeita de lavagem. Caberia então ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio decidir sobre a cisão dos autos, e se o prosseguimento da investigação sobre lavagem ficaria sob responsabilidade de promotoria criminal.

Flávio Bolsonaro também é alvo de outra investigação na esfera penal, conduzida pelo Ministério Público estadual do Rio de Janeiro (MP-RJ) e instaurada a partir de comunicações de transações bancárias feitas por Flávio e pelo ex-assessor parlamentar dele na Assembleia Legislativa do Rio, o ex-policial militar Fabrício Queiroz. Os informes de operações atípicas constam de relatórios de inteligência financeira elaborados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública comandado por Sergio Moro.

Ontem, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que o inquérito encaminhado na segunda-feira à PGR deve tramitar na primeira instância. O ministro disse que já foi decidido pelo Plenário da Corte que, para tramitar no STF, investigação sobre parlamentar deve tratar de delito praticado no exercício do mandato e estar diretamente relacionado a ele.

Marco Aurélio foi relator da investigação que apura transações atípicas de Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz e determinou seu envio à primeira instância.

O senador chamou de "denúncia totalmente infundada" o inquérito em que é investigado por falsidade ideológica eleitoral e lavagem de dinheiro. "Isso já tentaram usar contra mim na campanha, ano passado. Uma denúncia totalmente infundada de um advogado ligado ao PT", referindo-se a Eliezer Gomes da Silva, autor da denúncia.

"Já foi arquivada no âmbito estadual e será arquivada no federal também, não tenho nenhuma dúvida. Não tem nada de novo nisso. Meu patrimônio é totalmente compatível", garantiu.

Sobre sua participação na Mesa Diretora do Senado, na qual atuará como terceiro-secretário, Flávio Bolsonaro disse: "Algum problema [em] ir para a Mesa? O partido indicou, eu aceitei. A indicação é do PSL", respondeu o senador.

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MP do Rio designa promotor para investigar senador 

Cristian Klein

07/02/2019

 

 

O Ministério Público do Rio designou ontem o promotor de Justiça Luís Otávio Figueira Lopes, da 25ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal, para o caso Flávio Bolsonaro, senador investigado por transações suspeitas relacionadas a ex-funcionários de gabinete, quando era deputado estadual. Figueira Lopes substitui o promotor Claudio Calo, que anteontem se declarou impedido de assumir a atribuição.

Em redes sociais, Calo publicou mensagens favoráveis à família Bolsonaro. Numa publicação no Twitter, em 21 de janeiro, o promotor relativizou a descoberta de que Flávio recebeu 48 depósitos de R$ 2 mil em espécie, totalizando R$ 98 mil. "Tecnicamente, o crime de lavagem de capitais é um crime parasitário, acessório, pressupõe uma infração penal antecedente. O fato de haver fracionamento de depósitos bancários e em dh [dinheiro] gera suspeitas, mas, por si, não é crime de lavagem, pois pode a origem do dh [dinheiro] ser lícita.

A principal razão apontada pelo promotor para se desligar do caso, no entanto, foi um encontro - relatado em suas alegações ao Ministério Público - com Flávio Bolsonaro em 30 de novembro, quando as investigações pelo MP já estavam em andamento. Calo conta que a reunião se deu por intermédio de dois amigos em comum, que fizeram faculdade de direito com o filho do presidente da República.

Ao novo promotor, o Valor questionou se Luís Otávio Figueira Lopes já se encontrou ou foi procurado por Flávio Bolsonaro ou pessoa próxima a ele. Por meio da assessoria do MP do Rio, o promotor de Justiça afirmou ter recebido ontem o procedimento que envolve o senador e que a apuração será conduzida por "absoluto sigilo". Figueira Lopes preferiu não se manifestar e não respondeu às perguntas enviadas.

Ao lado de quatro promotores, Figueira Lopes formou um grupo designado, em março do ano passado, para ajudar nas investigações dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista dela, Anderson Santos. Cinco meses depois, porém, o grupo se desligou do caso e Figueira Lopes assumiu a responsabilidade de apurar crimes na internet, uma área de sua especialidade, contra Marielle.

Em 2014, o promotor denunciou a ativista Elisa Quadros Pinto Sanzi, a Sininho, por incitar manifestantes a incendiar a Câmara Municipal do Rio e a queimar um ônibus nos protestos de 2013. Em 2014, Figueira Lopes atendeu a um pedido de investigação do PSDB e obteve na Justiça um mandado de busca e apreensão na casa de jornalistas, sob a alegação de que estariam difamando o então senador Aécio Neves.