Correio braziliense, n. 20482, 19/06/2019. Economia, p. 7

 

23% sem renda de emprego

Thaís Moura

19/06/2019

 

 

Trabalho » Pesquisa do Ipea mostra que de janeiro a abril, a sobrevivência em quase um quarto dos domicílios do país vinha de fora do mercado formal. De acordo com o levantamento, mulheres são as que mais sofrem com desocupação. Trabalho intermitente avança

O mercado de trabalho segue deteriorado no país, com altos contingentes de desocupados, desalentados e subocupados. Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que, no primeiro trimestre deste ano, quase um quarto (22,7%) das residências no país não tinham nenhum tipo de renda proveniente do trabalho. Fora isso, o percentual de desempregados por dois anos ou mais cresceu 42,4% nos últimos quatro anos. Segundo o Ipea, passou de 17,4%, de janeiro a março de 2015, para 24,8% no mesmo período deste ano.

As pessoas com mais de 40 anos, de acordo com o levantamento, estão no grupo dos que mais sofrem com a crise de emprego no país. Correspondem a 27,3% dos desocupados. É o caso de Bruno Cena, 43, que não tem carteira assinada há seis anos. Desde que foi demitido do cargo de auxiliar de cozinha, vai diariamente à Agência do Trabalhador em busca de uma fonte de renda. Casado e pai de dois filhos, ele reclama que a vida está “cada vez mais cara”. “Tive que virar camelô para conseguir sustentar minha família, mas a renda ainda não é suficiente. Como minha mulher também está desempregada, precisei cortar muitos gastos e, agora, vivemos da rua”, conta.

Altair Nascimento, 56, perdeu as esperanças de voltar a trabalhar. “Eu era porteiro e segurança de condomínio, mas fui demitido há dois anos. Mesmo sendo aposentado, isso afetou muito minha renda, porque o benefício não cobre aluguel, água, luz, pensão, escola, roupas e alimentação”, disse. Mesmo morando sozinho, ele precisa pagar pensão alimentícia para seus dois filhos. “É muito difícil arrumar trabalho na minha idade, então acabo pegando qualquer bico para sobreviver”.

Ainda de acordo com o estudo, as mulheres predominam entre os desempregados de longo prazo. Enquanto os homens representam 20,3% dos desocupados há mais de dois anos, elas representam 28,8% do total. Em segundo lugar, estão as pessoas com mais de 40 anos, com um percentual de 27,3%.

A pesquisadora do Ipea Maria Andreia Lameiras explica que essa diferença entre homens e mulheres se dá principalmente por causa da dupla jornada atribuída à mulher. “Quando se compara um homem e mulher com mesmas características e experiências, vimos que a contratação do homem é privilegiada, porque a mulher tem uma dupla jornada e questões como maternidade e licenças.”

A eficácia da reforma trabalhista também foi analisada pelo Ipea. O levantamento mostrou que, das 507.140 vagas criadas de novembro de 2017 a abril deste ano, 58.630 foram na modalidade intermitente — contrato no qual a prestação de serviços não é contínua. Outras 19.765 foram postos com contrato parcial — que permite um horário de trabalho menor com ganho proporcional. Para Maria Andreia,  apesar de a reforma ter gerado mais empregos, o mercado de trabalho permanece depreciado. “Não podemos julgar ainda se a reforma foi positiva ou não, porque não temos um mercado funcionando a todo vapor”, afirmou.

Domingos

O governo editou ontem a Portaria nº 604, que libera o trabalho aos domingos e feriados. O documento, assinado pelo secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, deverá ser publicado no Diário Oficial da União de hoje. Estão contemplados 78 ramos de atividade. Mas é no setor de serviços, especialmente no comércio, que a medida terá seu maior impacto. Hoje, há restrições para o trabalho aos fins de semana e em feriados. Pela portaria, aqueles que quiserem poderão trabalhar todos os domingos, com folga em qualquer dia da semana. Para Paulo Solmucci, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), a portaria retira as amarras para a contratação de mão de obra.