Título: MPF acusa Ustra de sequestrar ex-fuzileiro
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 18/10/2012, Política, p. 11
Desaparecido desde 1971, Edgar de Aquino morou com Cabo Anselmo, mas não militava em organizações de esquerda
O coronel da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra vai responder a mais um processo na Justiça por supostos crimes cometidos durante o regime militar. Desta vez, ele é acusado de sequestrar, com a ajuda de dois delegados da Polícia Civil paulista, o ex-fuzileiro Edgar de Aquino Duarte, em junho de 1971, em São Paulo. A vitima, segundo a ação protocolada ontem pelo Ministério Público Federal (MPF), não tinha qualquer envolvimento com opositores da ditadura. Mesmo assim, ela ficou presa ilegalmente no Destacamento de Operações Internas (Doi-Codi) e, depois, desapareceu.
Conforme a ação, Edgar de Aquino Duarte era membro da Associação de Marinheiros do Brasil. Em 1964, depois do golpe militar, ele foi expulso das Forças Armadas, se exilou no México e, depois, em Cuba. De volta ao Brasil, em 1968, viveu com o nome falso de Ivan Marques Lemos e exerceu a profissão de corretor de valores até ser sequestrado. Testemunhas asseguraram que ele não tinha qualquer envolvimento com grupos de resistência à ditadura.
Dois anos depois de retornar ao país, ele reencontrou José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, antigo colega de farda, que havia retornado de Cuba, onde também viveu como exilado. Os dois moravam juntos quando Anselmo foi preso pelo delegado Carlos Alberto Augusto que, na época, era investigador. Nove dias depois, o corretor também foi detido pelo mesmo policial. Levado ao Doi-Codi, nunca mais foi visto.
Crime sem castigo Documentos do 2º Exército, em São Paulo, também comprovaram que Edgar não havia participado de nenhuma organização de esquerda e que atuava como corretor de valores. Como não foram encontrados, até hoje, indícios sobre o paradeiro dele, o MPF protocolou a ação contra Ustra. Os procuradores basearam-se em decisões já tomadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que, recentemente, autorizou a extradição de dois argentinos que estavam no Brasil e eram acusados de sequestros em seu país, cometidos havia 30 anos. Pelo entendimento da Corte, enquanto não se souber o paradeiro da vítima, o crime se sequestro é considerado em curso.
Ustra comandou o Doi-Codi entre 1970 e 1974, período em que foram registradas mais violações de direitos humanos praticadas pelo órgão da repressão. Dos 64 sequestros atribuídos a agentes da ditadura, em São Paulo, mais de 40 foram de responsabilidade do destacamento, segundo o Ministério Público Federal. O ex-coronel, conforme a ação, tinha pleno conhecimento das violações praticadas no local. Ele é, inclusive, acusado de coordenar as atividades de tortura. Além do ex-militar, foram denunciados os delegados Carlos Alberto Augusto, que ainda está na ativa, e Alcides Singillo, que se aposentou. Em abril, o Ministério Público Federal acusou Ustra pelo sequestro do sindicalista Aluísio Palhano, também em 1971, mas a Justiça não aceitou a denúncia. O MPF recorreu da decisão.