Título: Benefício parlamentar próximo do fim
Autor: Florence, Afonso
Fonte: Correio Braziliense, 18/10/2012, Opinião, p. 25

O fim do 14º e do 15º salários dos deputados e senadores é certo, pelo mérito e porque não se sustenta ante a opinião pública. Resta saber quando isso acontecerá. Desde março, a imprensa nacional emplacou louvável campanha pela extinção do benefício, estimulando a pressão popular para levar o Legislativo a essa inadiável decisão. O Senado rapidamente se decidiu, mas, na Câmara, a proposta de extinção tem ainda enfrentado percalços protelatórios.

O pagamento do benefício a deputados e senadores foi instituído pela Constituição de 1946 para cobrir os altos gastos do deslocamento das famílias dos parlamentares para o Rio de Janeiro, capital federal na época. Os salários extras permaneceram no texto constitucional de 1967, vigorando durante a maior parte do período da ditadura militar iniciada em 1964.

A Constituição de 1988 eliminou qualquer menção ao chamado "auxílio-paletó". Ele voltou a existir por meio de dois decretos legislativos, de 1995 e 2006. Essa despesa representa cerca de R$ 34,6 milhões para o Senado em oito anos de mandato; para a Câmara dos Deputados, em quatro anos, atinge R$ 109,6 milhões.

Esses gastos passavam despercebidos até que a imprensa denunciou, em março, que não era pago o Imposto de Renda devido sobre os salários extras dos senadores. O pagamento do 14° e do 15° salários foi "justificado", novamente, como forma de compensar despesas com transporte, entre outros gastos "imprescindíveis ao comparecimento à sessão legislativa". Entretanto, os parlamentares recebem ressarcimento pelo gasto com viagens, assim como com alimentação em circunstâncias de trabalho.

Em resposta a essa situação constrangedora que veio se formando, o Senado aprovou projeto apresentado pela senadora Gleisi Hoffmann, atual ministra da Casa Civil. Com isso, enviou à Câmara o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) nº 569/12, que estabelece que a ajuda de custo seja paga aos membros do Congresso Nacional somente no início e no término do mandato parlamentar. Assim, o pagamento deixa de ser annual, passando a acontecer a cada mandato. Vale registrar que o Senado aprovou a proposta, por unanimidade, em menos de três meses e a encaminhou para apreciação na Câmara.

É razoável supor que, no Senado, se considerou a evolução do tema no seio da opinião pública. Com a consolidação da experiência democrática e o crescimento do discernimento do cidadão, o pagamento do 14° e do 15° não tinha mais sustentação. O raciocínio é simples: "O trabalhador e a trabalhadora não recebem 14º e 15º salários, eles recebem o 13°, o descanso remunerado. Por que os congressistas receberiam?".

O PDC nº 569/12 começou a tramitar na Câmara na Comissão de Finanças e Tributação (CFT), onde sou relator do projeto e, de pronto, emiti parecer favorável à extinção do 14º e do 15º salários. Porém, desde então, as eleições dominaram a cena política. A tramitação de proposições perdeu celeridade, salvo projetos e medidas provisórias de enorme apelo. Os momentos de esforço concentrado não foram capazes de mobilizar o quórum mínimo para o funcionamento regular do plenário e das comissões permanentes e especiais.

Solicitei tratamento prioritário para o projeto. Com isso, conseguimos colocá-lo na frente de 57 outros, que também tramitam na comissão, esperando aprovação. Nas últimas reuniões da CFT em que ele foi para a pauta contamos com a colaboração do deputado Antonio Andrade (PMDB-MG), presidente da comissão. Além de flexibilizar o tempo de espera para formação do quorum, estendendo-o para além dos 30 minutos regulamentares, ele também aceitou a inversão de pauta. Entretanto, nem assim foi alcançado o quorum mínimo, de 17 deputados, para apreciar o PDC. Algumas vezes, a sensação de frustração decorrente da lentidão do processo foi inevitável.

Com a passagem das eleições, é hora de renovarmos os esforços para a aprovação desse projeto, símbolo da aproximação do parlamento do interesse e dos direitos dos cidadãos. Enquete realizada pelo Correio Braziliense mostrou que a maioria dos deputados é a favor do projeto. Assim, se o texto fosse submetido hoje ao plenário, o número de votos favoráveis, muito provavelmente, seria suficiente para derrubar o benefício, já que, para sua aprovação, seria necessária maioria simples, ou seja, 257 votos. Por tudo isso, acredito que, o mais rapidamente possível, a Câmara extinguirá o 14° e o 15° salários dos deputados e senadores.