O Estado de São Paulo, n. 45984, 11/09/2019. Política, p.A4

 

Ação contra CPI da Lava Toga racha PSL do Senado.

 

 

 

Daniel Weterman

Breno Pires

Renato Onofre

Mariana Haubert

11/09/2019

 

 

Congresso. Articulação da direção da legenda e de Flávio Bolsonaro para evitar a comissão que tem como foco o Supremo desagradou a senadores; Juíza Selma ameaça deixar a sigla

 

BRASÍLIA

 

EDILSON RODRIGUES/AGENCIA SENADO-28/3/2019

‘Divergências’. Senadora Juíza Selma alega ‘pressão partidária’ e diz que pode deixar PSL

 

O movimento da cúpula do PSL, articulado pelo senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), para abafar a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado que tenha como foco ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) provocou ontem um racha no partido e até ameaça de baixa. Diante da pressão partidária contra a chamada CPI da Lava Toga, a senadora Juíza Selma (PSL-MT) disse que pode deixar a sigla.

Filho do presidente Jair Bolsonaro, Flávio é o único dos quatro senadores do PSL que não apenas não assinou a petição pela abertura da comissão como agiu para enterrá-la. Tanto no Congresso como no Palácio do Planalto as investigações da CPI são vistas como perigosas, com potencial para afetar a relação entre os Poderes. O presidente do PSL, deputado Luciano Bivar (PE), admitiu que Flávio foi chamado para convencer seus pares a retirar assinaturas do pedido de abertura da CPI.

A preocupação é porque o objetivo da comissão é apurar o que parlamentares chamam de “ativismo judicial” de magistrados, incluindo ministros do Supremo. A crítica de senadores favoráveis à CPI é a de que a Corte muitas vezes toma decisões sobre assuntos ainda em discussão no Congresso, sobrepondo a atribuição dos parlamentares de legislar. Também questiona inquérito aberto pelo ministro Alexandre de Moraes para apurar ataques virtuais contra integrantes do tribunal.

A CPI tem sido defendida principalmente por parlamentares classificados como “lavajatistas”, que se elegeram com a bandeira do combate à corrupção. O Supremo se tornou alvo do grupo após atuar como um contraponto à operação e rever decisões tomadas em primeira instância.

Ao ameaçar deixar o partido, a senadora Juíza Selma – magistrada aposentada, que foi eleita com a alcunha de “Moro de Saias” e hoje recorre da decisão que cassou seu mandato por uso de caixa 2  – apontou desavenças políticas. “A senadora Juíza Selma esclarece que, devido a divergências políticas internas, entre elas a pressão partidária pela derrubada da CPI da Lava Toga, está avaliando a possibilidade de não permanecer no PSL”, disse, em nota.

O líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP), que na semana passada também já havia ameaçado deixar o partido, também se manifestou contra derrubar a CPI. “Não adianta pressão não porque vamos para cima”, afirmou, em vídeo. Na postagem, ele convoca manifestação para o dia 25, na Praça dos Três Poderes, para pressionar senadores.

A quarta integrante da bancada do PSL, Soraya Thronicke (MS), minimizou a ação partidária. “O Bivar e nenhum outro dirigente do partido nunca me pressionaram para nada”, disse. Soraya assegurou que manterá seu apoio à comissão.

Esta é a terceira tentativa para emplacar a CPI no Senado. As outras duas foram enterradas pelo Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que já classificou a medida como inconstitucional. “Se há entendimento de que a comissão não pode investigar decisão judicial, como vou passar por cima disso?”

Para sair do papel, a CPI precisa da assinatura de pelo menos 27 dos 81 senadores. Segundo o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), autor do requerimento de criação da comissão, o número já havia sido atingido, mas sua colega Maria do Carmo (DEM-SE) anunciou que vai retirar o nome da lista para atender a uma solicitação de Alcolumbre.

O Presidente do Senado negou ter pedido a retirada de assinaturas. Admitiu, porém, que tentou convencer parlamentares sobre seu posicionamento contrário à Lava Toga.

 

Articulação. A ação de Flávio para derrubar a CPI no Senado faz parte de uma estratégia para aparar arestas com o Supremo. Nas últimas semanas, o filho “01” do presidente iniciou uma aproximação até pouco tempo inimaginável entre o presidente da Corte, Dias Toffoli, com parlamentares do partido, incluindo um jantar conjunto no dia 21 de agosto. A deputada Carla Zambelli (PSL-SP), que já levou um boneco do presidente do STF a manifestações, não compareceu.

O Estado apurou que Flávio vê Toffoli como uma autoridade que traz estabilidade para o cenário político. Ele foi o autor da ordem para paralisar todas as investigações no País que utilizassem informações de órgãos de controle sem aval da Justiça. A decisão teve como base um pedido de Flávio. Toffoli apontou ilegalidade no compartilhamento dos dados do Coaf com o Ministério Público do Rio sem prévia autorização judicial.

Flávio também tem mantido contato com o ministro do Supremo Gilmar Mendes, que já o recebeu em casa. Mendes é, na Corte, o principal crítico do que classifica como “abusos” da Lava Jato. Procurado, Flávio não se manifestou. /