O Estado de São Paulo, n. 45999, 26/09/2019. Política, p. A8

 

Fachin vota contra rever sentenças da Lava Jato

Rafael Moraes Moura

26/09/2019

 

 

Ministro diz que lei não prevê prazo diferente para manifestações de delatores e delatados

O relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, votou ontem contra uma brecha que pode levar à anulação de condenações impostas pela Justiça Federal em Curitiba e beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O julgamento será retomado hoje, em discussão que deve expor as divisões internas do Supremo.

Na análise do habeas corpus do ex-gerente da Petrobrás Márcio de Almeida Ferreira, a discussão gira em torno da fixação de prazos diferenciados para o envio das alegações finais de réus delatores e réus delatados. A defesa de Ferreira alegou que ele sofreu constrangimento ilegal por não poder apresentar alegações finais após a manifestação dos réus colaboradores, que lhe acusaram de cometer crimes.

O ex-gerente da Petrobrás foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em primeira instância, mas aguarda o julgamento de um recurso no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4)

Em seu voto, Fachin observou que a lei sobre as colaborações premiadas não disciplina nem distingue o prazo para o envio das manifestações finais de agentes colaboradores e réus delatados. “Não há lei infraconstitucional que assegure esse direito e ao menos até a data de hoje não há manifestação plenária deste STF sobre a matéria”, disse o relator.

“A legislação não disciplinou imposição de ordem de colheita das argumentações de cada defesa, tampouco potencializou, para esse escopo, eventual adoção, ou não, de postura colaborativa. Poderia tê-lo feito e até hoje não o fez. Não deve o Judiciário legislar, em hipótese alguma”, declarou o ministro.

Fachin também disse que o entendimento a ser firmado no caso do ex-gerente da Petrobrás pode provocar “possível interferência” em outras investigações, que também contaram com o apoio de delatores e apuram crimes como tráfico de drogas e armas, tráfico de pessoas e pornografia infantil.

No mês passado, a Segunda Turma do STF derrubou decisão do ex-juiz Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça, que havia condenado o ex-presidente da Petrobrás e do Banco do Brasil Aldemir Bendine a 11 anos de reclusão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Foi a primeira vez que o Supremo anulou uma condenação de Moro. No papel, o caso de Ferreira guarda semelhanças com o de Bendine.

O Estado apurou que o entendimento a ser firmado pelo plenário do STF pode afetar processos de Lula, como o do sítio de Atibaia, mas não a condenação imposta por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na ação do triplex do Guarujá. No caso do apartamento não havia réus com acordo de colaboração premiada homologado pela Justiça na época da condenação em primeira instância. A defesa de Lula, porém, entende que a regra também deve valer para esse caso porque o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro fez acusações contra o petista.

Entendimento. Integrantes da Corte disseram acreditar que o Supremo pode delimitar o entendimento da Segunda Turma, em um esforço para “reduzir danos” e preservar parte das sentenças já proferidas. A avaliação é a de que os votos dos ministros Rosa Weber e Alexandre de Moraes serão decisivos para a definição do placar.

Uma das alternativas cogitadas seria anular as condenações somente daqueles réus que solicitaram, durante o andamento da ação, o prazo diferenciado para a apresentação das alegações finais, mas tiveram o pedido rejeitado pela Justiça. Outra possibilidade seria o Supremo “modular” os efeitos da decisão da Turma, ou seja, fixar um marco temporal para a aplicação do novo entendimento.