O Estado de São Paulo, n. 46000, 27/09/2019. Política, p. A8

 

Bancada 'lavajatista' contesta decisão

Breno Pires

Renato Onofre

Paula Reverbel

Bruno Ribeiro

27/09/2019

 

 

Além de deputados e senadores, procuradores também questionam o julgamento do Supremo e veem riscos à Operação Lava Jato

Crítica. Senador Major Olímpio falou em ‘impunidade’ e disse que, agora, há argumentos para instalar a CPI da Lava Toga

Parlamentares “lavajatistas” criticaram ontem ministros do Supremo Tribunal Federal após o julgamento no qual a Corte formou maioria a favor de uma tese capaz de derrubar condenações da Lava Jato. Aliados do ex-juiz e hoje ministro da Justiça, Sérgio Moro, viram com preocupação a decisão do tribunal. Nos bastidores, interlocutores de Moro disseram que, se o alcance da decisão não se restringir a casos bem definidos, a operação está em risco.

“O Brasil, se depender da maioria do Supremo, vai ser o país da impunidade”, disse o senador Major Olímpio (PSL-SP). Favorável à instalação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar atos de ministros da Corte, Olímpio afirmou que o julgamento, até agora, “dá argumentos para a abertura da CPI da Lava Toga”. “Lavajatista”, o senador Álvaro Dias (Podemos-PR) questionou: “O crime vai compensar?”.

A deputada Bia Kicis (PSL-DF) classificou o julgamento como uma “vergonha”. “Suprema Vergonha esse julgamento do STF. Argumentos injurídicos para soltar bandidos”, atacou.

A também deputada Carla Zambelli (PSL-SP) citou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para questionar o STF. “Já se arrependeu de ter indicado o Gilmar Mendes para o STF, caro ex-presidente?”, escreveu em resposta a uma postagem do tucano. FHC havia afirmado: “Espero que o STF não se limite a questões formais, mesmo importantes, e ajude o Brasil a continuar combatendo a corrupção e o crime. Respeito à lei, mas também à moral pública é o que o povo espera”.

Já para a deputada Gleisi Hoffmann (PR), presidente do PT, e o resultado “foi muito importante para corrigir parte dos abusos da Lava Jato”.

Força-tarefa. O procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima – decano da Lava Jato, que se aposentou em março – criticou o Supremo. “Impossível fazer Justiça quando supostos magistrados tiram da manga do colete nulidades absurdas para beneficiar poderosos”, disse Lima no Facebook.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Fábio George Nóbrega, foi na mesma linha. “Vemos com muita preocupação a formação de maioria que se encaminha para anular um processo sem que tenha havido o descumprimento de qualquer norma legal. É muito importante que a tese, se confirmada, sirva para futuros casos, não prejudicando os processos já julgados.” 

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Preciosismo supremo

Roberto Livianu

27/09/2019

 

 

Regras processuais penais existem para que o réu saiba antes qual o roteiro – para não ser surpreendido e ter ampla defesa. Processo é meio para distribuir Justiça, e não um fim em si mesmo.

Devido processo legal busca equilíbrio entre as partes, sem privilégios na produção e análise das provas apresentadas. No entanto, o próprio Direito Processual Penal estabeleceu limites e definiu princípio segundo o qual não cabe apego ao preciosismo formal – nulidades somente podem ser reconhecidas se gerarem prejuízo concreto e inquestionável – pas des nullité sans grief.

No caso examinado ontem pela maioria dos ministros do STF envolvendo grave corrupção, cabe lembrar que na fase das alegações finais já se tinha encerrado a colheita das provas (sujeita ao contraditório). O que ocorre nesta fase é a mera análise delas. No processo em foco, pelo MP e defesa de delatores e de delatados.

O juiz determinou, por isto, que os prazos fluiriam em paralelo para todos, baseado na Lei 12850/13, que não prevê o direito do acusado delatado falar por último. Além disso, não se apontou prejuízo concreto sofrido pelo impetrante para ensejar a anulação, em face do que ela não se mostra justa nem razoável.

Garantismo diz respeito a réus e igualmente à proteção das vítimas, ontem não devidamente consideradas, indo-se muito além da interpretação da vontade da lei preexistente, que cabe ao Judiciário. Criou-se lei nova, o que cabe ao Legislativo. Os efeitos da decisão deverão ser restritos ao caso julgado, não havendo automática incidência a outros processos, que deverão ser analisados um a um.

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Ministro quer julgar prisão em 2ª instância

Rafael Moraes Moura

27/09/2019

 

 

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), anunciou ontem que vai submeter ao plenário da Corte a análise de 80 casos em que ele barrou a execução antecipada de pena de condenados. Segundo o Estado apurou, o gesto é uma forma de pressionar o presidente do STF, Dias Toffoli, a pautar o julgamento do mérito de três ações que discutem a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância – medida defendida pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro.

Nesses 80 casos, Lewandowski atuou como relator e barrou a execução antecipada de pena e garantiu a liberdade dos réus. São processos que não estão relacionados à Lava Jato e muitos dizem respeito a pessoas humildes. O ministro critica a possibilidade de prisão antes do esgotamento de todos os recursos. Para o ministro, deve prevalecer o princípio da presunção da inocência.

De acordo com Lewandowski, os 80 casos englobam situações em que houve decisões sem a necessária fundamentação, casos em que o réu foi inocentado em primeira instância e condenado apenas em segundo grau e até processos em que o investigado foi condenado apenas por integrantes de tribunal superior.

Depois do comunicado de Lewandowski, Toffoli anunciou que vai pedir à sua equipe para tomar as providências necessárias. “Na forma do regimento interno o relator tem realmente essa faculdade ( de submeter casos ao plenário)”, disse o presidente do Supremo.

A expectativa entre ministros do STF é que o julgamento ocorra ainda neste semestre.

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TRF nega suspender ação com base em medida de Toffoli

Caio Sartori

27/09/2019

 

 

Réus na Furna da Onça, deputados estaduais do Rio pediam mesmo benefício dado a Flávio Bolsonaro no caso Queiroz

A 1.ª Seção Especializada do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2) negou na tarde de ontem os pedidos de liberdade e de suspensão de investigações apresentados pelos deputados estaduais Luiz Martins (PDT) e Marcos Abrahão (Avante). Réus presos preventivamente na Operação Furna da Onça, eles são acusados de se beneficiar de “mensalinho” na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Os crimes teriam ocorrido durante os governos de Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão, do MDB.

Na votação sobre a suspensão das investigações, o placar foi de cinco a zero. Ao analisar o pedido de liberdade dos réus, porém, o desembargador Antonio Ivan Athié foi favorável, “com restrições”, às solturas.

As defesas pediam para que os casos dos deputados fossem enquadrados em decisão do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 16 de julho, Toffoli mandou paralisar todas as investigações no País que tivessem usado, como pilares, sem autorização judicial prévia, dados fornecidos por órgãos de controle. A decisão inclui o extinto Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

“Mas não é esse o caso da Operação Furna da Onça, em que os crimes são diferentes. Possuem no acervo probatório outros elementos que sobreviveriam independentemente da exclusão do Relatório de Inteligência Financeira do Coaf. Paralisar a ação penal poderia significar uma ‘jurisimprudência’ da nossa parte”, afirmou o relator das petições no TRF-2, desembargador Abel Gomes. Ele fez um trocadilho com as palavras imprudência e jurisprudência.

O magistrado lembrou que a Furna da Onça começou com um inquérito policial, não pelo Ministério Público Federal. Outro ponto ressaltado por Gomes é que os réus cumprem prisão preventiva. Nesses casos não seriam abarcados pela decisão de Toffoli, já que, com as investigações suspensas, eles também teriam que ser soltos, conforme solicitaram as defesas. O desembargador ressaltou que não houve nenhuma alteração, no cenário que motivou a ação penal, que justificasse a liberdade dos réus. E disse que as provas que levaram às prisões “muito transbordaram dos relatórios do Coaf.”

A decisão de Toffoli se deu após pedido do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) – investigação apura a suposta prática de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no antigo gabinete dele na Alerj, foi suspensa provisoriamente. A decisão estimulou outros advogados a entrar na Justiça para tentar o mesmo benefício.

Relatório. Foi na Furna da Onça que surgiu o relatório do Coaf com movimentações suspeitas do ex-assessor Fabrício Queiroz, que trabalhou no gabinete de Flávio na Assembleia. O senador não é réu na operação. As “movimentações atípicas” identificadas pelo antigo Coaf nas contas de funcionários da Alerj foram encaminhadas à Promotoria do Rio.

Procuradas, as defesas dos réus não foram localizadas.