Correio braziliense, n. 20489, 26/06/2019. Política, p. 3

 

Especialistas se dividem sobre decisões

Jorge Vasconcellos

Renato Souza

26/06/2019

 

 

Especialistas ouvidos pelo Correio comentaram as decisões tomadas, ontem, pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação aos habeas corpus apresentados pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em uma das deliberações, o colegiado referendou o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que manteve a condenação no caso do triplex do Guarujá. A Segunda Turma também rejeitou pedido do ministro Gilmar Mendes para conceder liberdade provisória ao petista até a conclusão da análise dos recursos. Em outra decisão, adiou o julgamento do habeas corpus que questiona a isenção do ex-juiz Sérgio Moro, que proferiu a condenação em primeira instância.

A sessão da Segunda Turma ocorreu em meio às repercussões da divulgação, pelo site The Intercept Brazil, de mensagens atribuídas a Moro e a procuradores da Lava-Jato. Segundo o site, os diálogos indicariam que o então juiz orientou a atuação do Ministério Público Federal na ação contra Lula.

A jurista Vera Chemim, especialista em direito público pela Fundação Getulio Vargas (FGV), avaliou que a decisão dos ministros está de acordo com o que prevê a Legislação. “Em relação ao habeas corpus contra a decisão do ministro Félix Fischer, não havia nada que colocasse a conduta do magistrado em dúvida”, disse. Ela também destacou que não seria prudente colocar o ex-presidente em liberdade neste momento. “O processo dele foi analisado tanto pelo juiz Moro quanto pelo TRF-4 e nos tribunais superiores. Não tem que se falar em liberdade por liminar.”

Para o advogado Daniel Bialski, especialista em direito penal e processual penal, a decisão da Segunda Turma encontra respaldo em outros casos avaliados pela Corte. “Hoje, o ex-presidente Lula está em uma situação de condenado. Não se pode ignorar todo o processo e conceder a liberdade antecipada. O que os ministros disseram é que não se pode adiantar, por meio de liminar, o julgamento do mérito. É necessário entender se essas provas têm origem lícita. E se forem ilícitas, podem ser usadas no processo? Isso vai impactar em muitas ações da Lava-Jato”, destacou.

Já na opinião de Thiago Turbay, advogado criminalista, sócio do Boaventura Turbay Advogados, o Supremo perdeu a chance de “restabelecer as balizas democráticas, impelindo a atuação ilícita de agentes públicos à frente da condução de processos penais”. “O não enfrentamento dessas irregularidades ameaça o sistema criminal. A incerteza sobre a integridade dos fatos traz relevante dúvida sobre a legalidade da Operação Lava-Jato, o que deveria favorecer o réu, conforme assenta nossa Constituição”, afirmou.

O também advogado criminalista Conrado Gontijo, sócio do escritório Corrêa Gontijo Advogados, fez coro. “O STF, ao retirar de pauta o julgamento do mérito do habeas corpus — porque é necessário ter compreensão mais aprofundada sobre as mensagens trocadas entre Sérgio Moro e Deltan Dallagnol —, reconhece, de alguma forma, que o conteúdo de tais mensagens pode ser revelador da parcialidade do juiz”, destacou.

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Preocupação com projeto

26/06/2019

 

 

 

 

Em reunião com dirigentes de associações do Ministério Público e do Judiciário, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou que o projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 27/2017, apelidado de “10 medidas contra a corrupção”, se aprovado como está, terá “um efeito paralisante sobre a atuação dessas autoridades no combate ao crime organizado e na apuração de irregularidades eleitorais”. O projeto deve ser apreciado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado nesta semana.No encontro, foram discutidos pontos da proposta que caracterizam como crime de abuso de autoridade as infrações disciplinares cometidas por promotores de Justiça, procuradores da República e juízes, além de tornar crime a violação de prerrogativas de advogados.

“Na avaliação da PGR e das associações, tais medidas, se aprovadas pelo Congresso, vão fortalecer o crime organizado, prejudicar o combate à corrupção e destruir o sistema penal acusatório”, afirmou a procuradoria.