O globo, n.31533, 07/12/2019. Economia, p. 23

 

Maior inflação em 4 anos 

Letycia Cardoso 

Rennan Setti 

07/12/2019

 

 

Em alta. Preço da carne disparou nos açougues, chegando a subir 30%. O impacto na inflação foi alto: respondeu por quase a metade do índice. Problemas na oferta global encareceram o produto no país

A carne foi a vilã que fez o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de novembro subir para 0,51%, a maior taxa para o mês em quatro anos. O produto sozinho respondeu por 43% do índice. A previsão é que em dezembro os cortes bovinos subam mais, por causa das festas de fim de ano.

Pressionada pela alta da carne de 8,09%, a inflação subiu para 0,51% em novembro, a maior taxa para o mês em quatro anos, quando o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficara em 1,01%. Somente a carne respondeu por quase metade da taxa: 43%. Nos últimos 12 meses, o IPCA, usado na meta de inflação, acumula alta de 3,27% —abaixo, portanto, da meta para este ano, de 4,25%. Por isso, apesar da alta em novembro, especialistas não esperam interrupção no ciclo de queda de juros. O Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne na semana que vem para decidir sobre a taxa básica, a Selic, hoje em 5% ao ano. Devido ao desemprego alto, com 12 milhões à procura de uma vaga, Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados, afirma que s Selic deve cair para 4,5% este ano, com um novo corte em fevereiro, recuando a 4,25%: — Agrande preocupaçãoé se a forte depreciação cambial pode trazer pressões inflacionárias.

 Mas acho que esse risco acaba moderado pela própria ociosidade da economia. Este mês, embora haja previsão de redução da tarifa

de energia elétrica, coma entrada em vigor da bandeira amarela, Rafaela Vitoria, economista-chefe do Banco Inter, projeta o IPCA entre 0,50% e 0,70%. Mesmo assim, ela acredita que o Co pom deve reduzira tax apara 4,5%, mantendo a Selic nesse patamar em 2020. O economista-chefe do Modalmais, Alvaro Bandeira, vai mais longe. Como a inflação acumulada em 12 meses continua muito abaixo da meta, ele acredita que a Selic caia a 4% em 2020: —Avariação cambia lé oque pode frear esses cortes, porque, se o dólar continuar subindo, pode puxar o preço de itens importados, com repasse para o consumidor final.

 GUEDES: ECONOMIA COM JURO

A queda da Selic, que passou de 14,25% em 2016 para os atuais 5%, aliviou as contas públicas. Serão R$ 96 bilhões a menos no custeio da dívida pública, afirmou ontem o ministro da Economia, Paulo Guedes.

— Para o ano que vem, as despesas de juros vão cair R$ 96 bilhões. São três Bolsas Família. Recursos que estavam aí, como eu sempre digo, no paraíso dos rentistas —disse Guedes em evento na sede do BNDES. O avanço da inflação foi concentrado. Apenas três itens —carne, energia elétrica, com a adoção pela bandeira vermelha, e jogos de loteria — responderam por 80% do índice. Esse é outro motivo para os analistas não esperarem interrupção no ciclo de queda dos juros. O consumidor já vinha percebendo o encarecimento da carne. Nas últimas duas semanas, cortes bovinos de primeira subiram 30% nos açougues cariocas. Até os espetinhos de rua ficaram mais caros: em alguns casos, chegaram a dobrar, para até R$ 7. Segundo a economista do Itaú Unibanco Júlia Passabom, a alta no preço da carne é a maior desde 2010:

— Esse item subiu bastante no atacado, e o aumento foi repassado ao consumidor. Em dezembro, deve subir mais, devido às festas de fim de ano. Essa alta se deve a um problema de oferta global. A peste suína reduziu drasticamente o rebanho chinês de porcos, puxando os preços de todos os tipos de carne no mercado internacional. Com isso, parte da produção brasileira foi desviada para o exterior. André Braz, da Fundação Getulio Vargas (FGV), estima que o preço da carne comece a cair no primeiro trimestre de 2020, mas sem voltar ao patamar inicial.