O globo, n.31536, 10/12/2019. Artigos, p. 02

 

IDH força Bolsonaro a rever posturas 

10/12/2019

 

 

Entre a série de indicadores que acompanham a situação econômica e social dos países, o de Desenvolvimento Humano (IDH), criado pelos economistas Amartya Sen,indiano, prêmio Nobel de 1998, e o paquistanês Mahbub al Huq, contorna o universo exclusivo da produção, para acompanhar a evolução da saúde, da escolaridade e da renda das populações.

O IDH, de responsabilidade do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), capta segmentos estratégicos das sociedades, só refletidos no PIB de maneira muito indireta.

E o IDH do Brasil, divulgado no domingo, é coerente com a conjuntura de dificuldades por que tem passado o país, entre a recessão e a estagnação de 2014 em diante. Pelo menos, cinco anos de dificuldades.

Apenas agora, no segundo semestre de 2019, evidências de alguma retomada do crescimento começam a ficar mais fortes. Há, porém, muito terreno perdido a recuperar

— na produção e, por decorrência, em áreas ditas sociais. Um desemprego persistente acima dos 12 milhões de pessoas gera muitos efeitos colaterais negativos.

Há um acúmulo de erros e distorções que estão refletidos na evolução do IDH. O governo Bolsonaro recebe esta herança negativa e terá de equacioná-la.

De 2013 ao ano passado, o índice brasileiro perdeu três posições. De 2017 a 2018, em um ranking de 189 países, o Brasil retrocedeu do 78º lugar para 79º, com um IDH de 0,761 (quanto mais próximo de 1, melhor o estágio de desenvolvimento humano).

Ficou aquém de Rússia, Argentina e Chile, num ranking em que nas três últimas colocações estão Chade, República Centro-Africana e Níger. Muito distantes da Noruega e Suíça, os IDHs mais elevados.

Os dois fatores que explicam a queda do IDH brasileiro a partir de 2013 são a estagnação da escolaridade e amá distribuição de renda. Quando o IDH é ajustado considerando apenas a desigualdade de renda, o Brasil cai 23 posições.

Em reação esperada, o governo Bolsonaro culpou as gestões petistas. Mais importante é saber o que fará contra uma área de educação estagnada e para reduzir os grandes desníveis de renda.

No primeiro caso, precisará que o Ministério da Educação saia do rumo que lhe dá o ministro Abraham Weintraub, mais preocupado em converter o MEC em plataforma de guerra ideológica.

Para a questão da má distribuição de riquezas, Bolsonaro não poderá conter o andamento das reformas, como acaba de fazer. Há medidas no ajuste fiscal ena reformado Estado que podem abrir espaço para a execução de políticas sociais mais efetivas. Se esta reforma da Previdência não pôde avançar muito na redução das injustiças nos benefícios do funcionalismo público, fator de concentração de renda, medidas paralelas podem ser tomadas nesta direção. Essencial é que Bolsonaro tenha esta consciência.