Título: Em defesa da reforma política
Autor: Almeida, Amanda
Fonte: Correio Braziliense, 20/10/2012, Política, p. 2
Especialistas avaliam que o Legislativo precisa de mudanças. Dos 513 deputados, apenas oito participaram de todas as sessões
A distorção entre os salários dos deputados federais e o da média do trabalhador brasileiro diminui a capacidade de representação e, consequentemente, a de legislar da Câmara dos Deputados. É a avaliação de cientistas políticos ouvidos pelo Correio. Eles destacam o alto custo do parlamentar no Brasil em relação a outros países e dizem que apenas uma reforma política profunda é capaz de revigorar o Legislativo.
“O deputado federal deveria ser o espelho do estado ou região que representa. Quando ele passa do patamar daquele que representa, inverte a lógica e não acompanha a demanda do cidadão”, avalia Rudá Ricci, doutor em ciências sociais pela Unicamp-SP e integrante do Observatório da Democracia Participativa. Para ele, ao colocar os pés na Câmara, o deputado ingressa também numa “elite política” do país, levando uma vida sofisticada e afastando-se daquele que o elegeu.
O cientista político e professor emérito da UnB David Fleischer vai na mesma linha: “Isso (a distorção entre salários) pode diminuir a capacidade de legislar”. Ele destaca ainda que o parlamentar brasileiro tem regalias inexistentes no parlamento norte-americano, como os 13º, 14º e 15º salários, auxílio moradia e cota de passagens aéreas para voltarem aos seus estados. Enquanto o deputado federal pode receber R$ 3,2 mil por dia de votação em 2013, o professor que ganha o piso nacional da categoria será remunerado com apenas R$ 94,3 por dia de aula.
Os dois cientistas políticos criticam também a aprovação das faltas nas segundas e sextas-feiras — as chamadas “gazetas”. Fleischer lembra que já houve discussões de mudanças no calendário na Casa, como a ideia de dividir as atividades por semana. Pela proposta, uma semana seria de trabalho nas comissões; outra, gasta em debates; uma terceira para votações; e a última para que o eleito visite sua base.
Para Ricci, o argumento usado pelos parlamentares de que as “gazetas” são para passar um tempo em sua base, com o objetivo de captar as demandas da população, é falho. “Nunca vamos saber se eles estão lá escutando as demandas dos eleitores ou tomando sol na beira da piscina. Não há um sistema que comprove que eles estão trabalhando diariamente como todo trabalhador brasileiro”, compara, acrescentando que é necessária uma reforma política organizada pela sociedade, e não pelos políticos.
Presença Dos 513 deputados, apenas oito tiveram 100% de presença nas 177 sessões deliberativas (quando há votação) na atual legislatura. Desde fevereiro de 2011, Alexandre Leite (DEM-SP), Jesus Rodrigues (PT-PI), Lincoln Portela (PR-MG), Manato (PDT-ES), Pedro Chaves (PMDB-GO), Reguffe (PDT-DF), Salvador Zimbaldi (PDT-SP) e Tiririca (PR-SP) não faltaram às reuniões.
Para Reguffe, a presença nas reuniões é “obrigação” do parlamentar. “Isso é o mínimo que o parlamentar deve fazer. Temos, na Casa, projetos parados há muitos anos. O trabalho do deputado não é apenas votar proposta, mas isso é uma parte muito importante”, diz Reguffe. Ele critica ainda o alto custo do Legislativo no país: “Não temos democracia sem um Poder Legislativo forte. Mas ele não precisa ser tão inchado como é hoje”.