Correio braziliense, n. 20491, 28/06/2019. Economia, p. 9

 

Estados e municípios emperram reforma

Alessandra Azevedo

Bernardo Bittar

28/06/2019

 

 

Conjuntura » A falta de entendimento para a inclusão dos entes da Federação nas novas regras de aposentadorias e pensões provoca o adiamento da leitura do relatório para a semana que vem. Presidentes da Câmara e do Senado negociam com governadores

O esforço para colocar estados e municípios de volta na reforma da Previdência tem prejudicado o andamento da proposta na Câmara. Ainda sem consenso sobre o assunto, a leitura do voto complementar do relator, Samuel Moreira (PSDB-SP), precisou ser adiada para a semana que vem na Comissão Especial. A sessão, que estava marcada para ontem de manhã, foi cancelada na noite de quarta-feira, devido à necessidade de mais negociação com governadores. Com as constantes mudanças no cronograma, deputados consideram cada vez menor a chance de que a proposta seja votada na comissão e no plenário nas três semanas que faltam para o recesso parlamentar.

Mas, mesmo que o andamento da proposta atrase, a missão do governo, agora, é reincluir os estados no relatório e garantir ganhos fiscais para todos os entes, não apenas para a União. Como ressaltou ontem o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, a alteração ainda não ocorreu por “questões políticas”. Em evento da Fitch Ratings, ele garantiu que o governo está tentando buscar uma solução, por entender que, “se eles não forem incluídos, terão que fazer esforço enorme para reequilibrar as contas”. “Houve várias reuniões em Brasília nos últimos dois, três dias”, ressaltou.

A batalha conta com engajamento explícito do ministro da Economia, Paulo Guedes, que se disse “ressentido” pela mudança dessa parte no texto original da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019. Para resolver a pendência política, os principais líderes do Legislativo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), têm conversado com governadores, em busca de um consenso, enquanto os deputados da Comissão Especial aguardam a nova versão do parecer.

Para conseguir a ajuda, o governo federal acena aos mandatários com maior repasse de recursos provenientes do pré-sal. “Estamos fazendo um gesto aos governadores, dividindo esses recursos do petróleo”, explicou Alcolumbre, após se encontrar com Guedes e com o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE). Ele recomendou que os chefes dos Executivos estaduais reúnam as bancadas no Congresso e façam um levantamento de votos, para que seja possível avançar na negociação. “Para unir o país, é necessário fazer política”, comentou.

Após a reunião de ontem, Guedes se mostrou confiante na articulação política, mesmo com o mal-estar gerado pelas críticas que fez ao parecer de Moreira, quando foi divulgado, há duas semanas. “Estamos lutando juntos para colocarmos estados e municípios na reforma. Se eles ficarem de fora, vão acabar tendo de usar os novos recursos que virão da exploração de petróleo apenas para pagar suas contas”, explicou o ministro.

Guedes não se queixou de outros pontos alterados no parecer, como a retirada das mudanças na aposentadoria rural e no Benefício de Prestação Continuada (BPC) — embora a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), diga que alguma mudança no segundo item é estudada. “Mas não achei interessantes as mudanças para servidores e me ressenti da retirada de estados e municípios do relatório”, apontou o chefe da equipe econômica. Quando o relator apresentou o parecer, Guedes afirmou que, devido aos cortes feitos no texto, seria necessário que o próximo presidente fizesse outra reforma.

Com tom mais conciliador, o secretário do Tesouro disse que, se a proposta atual for aprovada até setembro no Congresso, mesmo com as mudanças que devem permanecer no relatório, será um “grande sucesso”. Mansueto acredita que é possível emplacar uma reforma com impacto fiscal de R$ 850 bilhões a R$ 1 trilhão em 10 anos e com a inclusão de estados e municípios. “Chegamos a um estágio em que a reforma da Previdência se descolou do governo”, comentou.

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Liberação de mais R$ 100 bi

 

 

 

 

 

Bernardo Bittar

28/06/2019

 

 

 

Após discutir detalhes sobre a reforma da Previdência em encontro com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o governo vai liberar R$ 100 bilhões de compulsório, dinheiro dos clientes que os bancos não podem usar em operações de crédito e são transferidos para o Banco Central.

A decisão foi anunciada um dia depois de o BC divulgar a nova redução na alíquota do recolhimento compulsório sobre recursos a prazo de 33% para 41%, o que representa liberação de R$ 16,1 bilhões aos bancos para dar maior incentivo a empréstimos.

“Estamos fazendo a desestatização do mercado de crédito. Estamos fazendo a devolução, despedalando os bancos públicos”, disse Guedes após almoço na residência oficial do presidente do Senado da qual também participou o líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra (MDB-PE).

“Ontem (quarta-feira), já houve uma liberação de vinte e poucos bilhões de recolhimento compulsório para ampliar o crédito privado e vêm aí mais de R$ 100 bilhões de liberação de compulsório. Estamos encolhendo o crédito público e melhorando a alocação de recursos, expandindo o crédito privado”, explicou o ministro.

Segundo assessores de Guedes, a liberação dos R$ 100 bilhões ocorreria a longo prazo, uma vez que o montante corresponde a cerca um quarto do total de compulsório disponível no país atualmente. Ainda assim, a sinalização do ministro vai de encontro com o que é defendido pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto. Ele declarou que a redução dos compulsórios foi tímida nos últimos anos e que há, sim, espaço para novas liberações. Informalmente, Campos Neto disse que os testes de estresse aplicados sobre o sistema financeiro dariam aval às liberações.