O Estado de São Paulo, n. 45987, 14/09/2019. Política, p. A4

 

Planalto usa emendas e monitora redes por apoio

Julia Lindner

Camila Turtelli

14/09/2019

 

 

Poderes. Governo vincula verbas e cargos a comportamento dos parlamentares nas mídias sociais e em comissões; no Senado, cobrança é por aval a indicação de Eduardo Bolsonaro

O governo vai condicionar a liberação de verbas para emendas parlamentares e a distribuição de cargos nos Estados ao apoio no Congresso. Para medir a taxa de fidelidade ao presidente Jair Bolsonaro, o Palácio do Planalto começou a monitorar as redes sociais de deputados e senadores, bem como os discursos feitos na tribuna, além de acompanhar a votação de cada um no plenário.

A ideia é usar até R$ 2 bilhões dos cerca de R$ 15 bilhões do Orçamento que devem ser desbloqueados nas duas próximas semanas para pagar emendas prometidas quando a reforma da Previdência começou a ser discutida, mas as negociações incluem agora uma espécie de compromisso de adesão a um “pacote” de interesse do governo.

O maior foco de tensão está no Senado, que ainda vai apreciar as mudanças nas regras da aposentadoria. É por lá também que passará a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, para o cargo de embaixador nos Estados Unidos. Dois senadores aliados de Bolsonaro ouvidos pelo Estado afirmaram que Eduardo ainda não tem votos suficientes para ter o nome aprovado e consideraram “prudente” esperar o pagamento de emendas, que deve ocorrer em outubro, quando a equipe econômica destravar parte dos recursos do Orçamento.

Primogênito do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSLRJ) tem atuado como uma espécie de ministro dos bastidores no Congresso. Na tentativa de quebrar as resistências, ele tem levado o irmão em jantares, como ocorreu recentemente na casa do senador Lucas Barreto (PSD-AP), para que o caçula fale sobre seus planos nos EUA.

Além do interesse em aprovar Eduardo para a embaixada americana, Augusto Aras para o comando da Procuradoria-Geral da República e a reforma da Previdência, o Planalto também tenta impedir a abertura da CPI da Lava Toga no Senado, que tem o objetivo de investigar o chamado “ativismo judicial”.

Na Câmara, deputados já foram avisados que o governo está de olho em tudo o que os parlamentares publicam nas redes sociais e não fará “concessões” a quem agir como oposição. O vereador Carlos Bolsonaro (PSCRJ), filho “02” do presidente, também é conhecido por “inspecionar” as redes e influenciar a comunicação do Planalto.

Responsável pela articulação política com o Congresso, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, fez um périplo pela Câmara, nesta semana, e teve vários encontros a portas fechadas. Na terça-feira ele almoçou com deputados do PSL e, no dia seguinte, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a bancada do PSDB. Teve, ainda, encontros reservados com parlamentares do Paraná e com líderes de outros partidos, como DEM, PL e Podemos.

‘Alinhamento’. Ramos afirmou que o governo está empenhado em construir uma base de sustentação no Congresso, mas pediu que os parlamentares não o cobrassem em público sobre emendas, porque, na sua avaliação, tudo o que é dito serve para “pautar” os jornalistas. Na prática, quem seguir a cartilha ditada pelo Planalto avançará algumas casas para ter suas demandas atendidas, mas o discurso oficial ainda é o de que essas negociações não significam um “toma lá, dá cá”.

“Creio que o parlamentar tem de ser coerente. Ou está alinhado com o governo ou é contra”, disse Ramos ao Estado, quando questionado se quem criticar Bolsonaro nas redes sociais poderá receber emendas extras e ocupar cargos em diretorias de estatais, por exemplo. O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou, por sua vez, que o governo quer desbloquear mais R$ 5 bilhões até outubro, além dos R$ 15 bilhões previstos pela equipe econômica, para ter mais “tranquilidade”, inclusive na relação com o Congresso. “Vamos atender as prioridades.”

O loteamento de cargos tem provocado atrito no Congresso. Ainda ontem, o deputado Marco Feliciano (PodemosSP) atacou Ramos por entregar a presidência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) a um apadrinhado do líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA), que em maio atacou o governo na tribuna (mais informações nesta página). O DEM, no entanto, controla três ministérios (Casa Civil, Saúde e Agricultura) e todos os seus parlamentares aprovaram a reforma da Previdência.

“Inicia-se agora uma nova fase de articulação do governo, que não quer mais namorico. Quer casamento de papel passado”, comparou o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (MG), usando a metáfora preferida de Bolsonaro.

Quatro meses depois de anunciar que criaria um “banco de talentos” para preencher cargos de confiança nos Estados, as nomeações estão saindo a conta-gotas. O líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP), ironiza a expressão “banco de talentos”. “Tucanaram as indicações políticas.” 

‘Coerência’

“Creio que o parlamentar tem de ser coerente. Ou está alinhado com o governo ou é contra.”

Luiz Eduardo Ramos

MINISTRO-CHEFE DA SECRETARIA DE GOVERNO

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Nomeação de indicado do DEM gera críticas a Ramos

Julia Lindner

14/09/2019

 

 

Marco Feliciano diz que governo ‘passa mau exemplo’ ao ‘premiar’ deputado que fez ataques à atual administração

A nomeação do engenheiro Marcelo Andrade Moreira Pinto para o comando da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), indicado pelo líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA), provocou novo desgaste no governo. O deputado Marco Feliciano (PODE-SP) criticou ontem no Twitter o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, pelo fato de Elmar ter emplacado um apadrinhado, mesmo após ter feito acusações contra a atual gestão.

Vice-líder do governo na Câmara, Feliciano afirmou que o “namoro” de Ramos com o Congresso começou “cheio de traições e ingratidão”. “Governo premia quem trai e passa mau exemplo a quem é fiel! Como todo traído, vai ser o último a saber”, escreveu.

Segundo Feliciano, existe uma insatisfação do Legislativo sobre a distribuição de cargos feita pelo governo. “Acho um absurdo se premiar parlamentares que falam mal do governo e traem o governo com as joias da coroa, com os principais cargos federais”, reforçou.

Em maio, durante votação no plenário da Câmara, Elmar disse que o governo havia adotado um “procedimento canalha”. À época, afirmou, ainda, que não mexia “com laranja”, em referência a suspeitas de candidaturas de laranjas do PSL.

Feliciano ainda mencionou fala de Elmar, publicada pela Coluna do Estadão em setembro, na qual ele disse que a indicação para a Codevasf é “um favor ao governo”, sem quadros para tantos cargos. “Eu considero que o deputado Elmar Nascimento passou dos limites quando esnobou o presidente e fez pouco caso do governo como um todo.”

Ao Estado, Ramos minimizou as críticas de Feliciano e disse que Elmar fez a indicação por ser líder do DEM, partido que tem “votado com o governo”. “O pronunciamento dele (contra o PSL e o Planalto) foi em maio. Isso é uma coisa menor”, afirmou Ramos.

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Reforma tributária e a nova guerra de vaidade

Alberto Bombig

14/09/2019

 

 

Reforma tributária e a nova guerra de vaidade

Enquanto o governo patina, Câmara e Senado, mais uma vez, disputam a paternidade da reforma tributária. Há cerca de um mês, Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre e o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), conversam para chegar a um acordo parecido com o alcançado na Previdência, pelo menos em torno dos pontos principais, mas ainda sem sucesso. Dessa forma, o Senado toca sua agenda e o relatório de Roberto Rocha (PSDB-MA) deve ser lido na quarta-feira. Na Câmara, o prazo para recebimento de emendas foi reaberto.

Cronograma. Pelas contas de quem acredita no acordo, a reforma pode ser votada em primeiro turno ainda este ano. Ficaria para 2020 o segundo turno e a votação no Senado.

Core. Ainda que ambas se proponham a unificar tributos, há diferenças consideráveis. A da Câmara reúne cinco impostos, a do Senado, 9, por exemplo.

No lápis. A proposta da Câmara já conta com o apoio dos secretários de Fazenda dos Estados. Pelas contas da cúpula da comissão, como historicamente os governadores travaram o avanço das reformas anteriores, o apoio deles por si só já garantiria os votos necessários para aprová-la.

Acúmulo... A ministra Tereza Cristina embarcou ontem para uma viagem ao Oriente Médio. No roteiro, o Egito, que cancelou de última hora uma visita do ex-chanceler Aloysio Nunes Ferreira no ano passado.

...de funções. O cancelamento ocorreu em retaliação à intenção de Bolsonaro, recém-eleito, de mudar a embaixada brasileira de Israel para Jerusalém. Além de ajudar a baixar o tom no caso das queimadas na Amazônia, Tereza apaga incêndios também na área diplomática do governo.

Amizade... A votação da Lei das Licitações uniu PT e PSOL ao Novo na Câmara: foram contra o aumento da exigência de garantia de empresas em obras acima de R$ 100 milhões.

...nova. “O Novo alia-se à sintética e brilhante defesa da deputada petista Erika Kokay da livre concorrência”, disse o líder Marcel Van Hatten, arrancando risadas no plenário da Casa.

Ops. Pedro Lupion (DEM-PR) quase assinou a CPI da Lava Jato – achava que o objetivo era investigar o vazamento das mensagens. Diz que muitos também caíram na pegadinha de não ler direito.

Pegadinha... Quando pipocaram no grupo de WhatsApp da bancada do DEM mensagens de deputados preocupados se teriam assinado “sem querer”, quem zoou foi Rodrigo Maia.

...do malandro. Ele brincou que a assinatura dos que estavam em dúvida seria publicada na recontagem. É Maia quem decide se instala ou não a CPI.

Bentinho. Vice-líder do governo, Marco Feliciano (Pode-SP) reagiu à fala de Luiz Eduardo Ramos à Coluna de que formar base é como um “namoro”. “Governo premia quem trai e dá mau exemplo a quem é fiel.”

Xii... A Coluna apurou que Feliciano tentou, sem sucesso, emplacar Pablo Tatim na Esplanada. Depois, sugeriu o ex-deputado Takayama (PSC-PR). Este segundo estaria ainda sob análise, mas depois do tuíte suas chances diminuíram.

CLICK. “Bahia Barroca”, da fotógrafa Flávia K, é a exposição aberta esta semana por João Doria no Palácio dos Bandeirantes. Visitas são gratuitas e monitoradas.

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PRONTO, FALEI!

ALEXANDRE FROTA

Deputado federal (PSDB-SP)

“CPI não é bicho de sete cabeças. Não sou igual ao Flávio (Bolsonaro) de não assinar. Se for o caso, estarei lá para defendê-lo (Moro)”, sobre CPI da Lava Jato.