O Estado de São Paulo, n. 45992, 19/09/2019. Política, p. A6

 

Bolsonaro mantém aliado de Moro no comando da PF

19/09/2019

 

 

Maurício Valeixo, cuja saída era dada como certa após declaração do presidente, foi informado de que, por ora, não será substituído

O diretor-geral da Polícia Federal, delegado Maurício Valeixo, volta de férias hoje e continua no cargo, segundo apurou o Estado com fontes a par do assunto. O ministro da Justiça, Sérgio Moro, já teria dado a Valeixo a informação de que ele não será substituído pelo menos por enquanto.

O assunto foi comentado pelo porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros, ontem. “O presidente me deixou claro o seguinte ponto: diretamente nunca fez nenhum tipo de restrição ao doutor Valeixo, reconhece o seu trabalho e reforça que decisões sobre a Polícia Federal são de responsabilidade do ministro Moro.”

A saída de Valeixo era dada como certa internamente na PF após o presidente Jair Bolsonaro ter declarado, no mês passado, que poderia trocar a direção do órgão para demonstrar que é ele quem manda, e não Sérgio Moro. A nomeação do diretorgeral é do presidente da República, mas, tradicionalmente, o ministro da Justiça faz a indicação do nome para evitar interferência política. Os presidentes costumam ser mais suscetíveis aos pedidos da base aliada de cargos do que os ministros considerados técnicos como Moro.

Para evitar que a permanência de Valeixo no cargo seja interpretada como uma vitória de Moro sobre Bolsonaro, a ordem é ninguém comentar o assunto na PF ou na Justiça. Ficou combinado que o delegado reassumirá o cargo hoje como se nada tivesse acontecido e está avisado de que qualquer manifestação nesse sentido poderá colocar tudo a perder.

A ameaça de Bolsonaro de demitir Valeixo foi criticada por parte do seu eleitorado que viu nela uma forma de enfraquecimento do seu superministro. O Estado revelou que o grupo pró-Moro no Congresso chegou a aconselhar o ex-juiz da Lava Jato a usar sua força para impor a manutenção do diretor-geral da PF. A mais recente pesquisa Datafolha, divulgada em setembro, mostrou que Moro é o ministro mais popular e mais bem avaliado do governo, com patamar de apoio maior do que o do próprio presidente.

O ministro sempre negou os rumores de que teria ameaçado deixar o cargo levantados nas inúmeras crises que os dois tiveram. No auge da crise envolvendo a PF, Moro apareceu de braço dado com o presidente no desfile de Sete de Setembro e, no último domingo, esteve com Bolsonaro no hospital onde o presidente se recuperava de uma cirurgia_a quarta após a facada que tomou durante a eleição presidencial. No dia seguinte à visita, Bolsonaro concedeu uma entrevista à TV Record e não fez qualquer comentário sobre troca na PF. O silêncio sinalizou para a corporação o recuo.

Rio. A ameaça de Bolsonaro de intervir na PF ocorreu diante da recusa do diretor-geral de indicar para a superintendência do Rio o delegado Alexandre Saraiva, atual chefe da unidade do Amazonas, no lugar do delegado Ricardo Saadi.

Na ocasião, Bolsonaro afirmou que havia determinado a saída de Saadi por “questão de produtividade”. Na verdade, tinha tomado conhecimento de um suposto direcionamento pela PF do Rio de investigação para atingir o deputado Helio Lopes (PSL-RJ), seu aliado. Lopes também é próximo do vereador Carlos Bolsonaro (PSC), que costuma despachar do seu gabinete quando viaja para Brasília.

Moro determinou, na semana passada, que a corregedoria da PF apure a denúncia de direcionamento do inquérito. Paralelo a isso, Bolsonaro recebeu esclarecimentos de que o superintendente da PF não tem conhecimento de todos os inquéritos que tramitam na sua área de atuação – no caso do Rio, são cerca de três mil.

CRISE NA CORPORAÇÃO

• PF contradiz Bolsonaro

Em agosto, Bolsonaro alega “questão de produtividade” e anuncia troca do delegado Ricardo Saadi. PF desmente.

• ‘Quem manda sou eu’

Bolsonaro afirma que, para vaga de Saadi, vai Alexandre Saraiva. “Quem manda sou eu”, diz ele. PF reage e recorre a Moro. O presidente acaba recuando.

• Diretor-geral

“Se não posso trocar o superintendente, vou trocar o diretor-geral”, afirma Bolsonaro, acrescentando que Maurício Valeixo é subordinado a ele, não a Moro.

• ‘Reveses’

Ainda em agosto, Sérgio Moro defende o trabalho de Valeixo, mas, sem entrar em detalhes, admite “reveses”.

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Senado rejeita nomes para conselho do Ministério Público

Daniel Weterman

Rafael Moraes Moura

19/09/2019

 

 

Ação é vista como retaliação; procuradores cujas reconduções foram negadas impediram processo contra Deltan

O Senado rejeitou ontem a recondução de dois nomes para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável por fiscalizar a atuação de membros do MP em todo o País. O movimento foi articulado pelo Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e por parlamentares críticos a condutas da Operação Lava Jato, entre eles Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (MDB-AM). Um terceiro nome para o conselho foi retirado da pauta após obstrução do grupo conhecido como “lavajatista”.

O descontentamento do Senado com os nomes do CNMP foi revelado pelo Estadão/Broadcast. Na Casa, parlamentares se queixam do que alegam ser “corporativismo” do conselho, que estaria demorando para aplicar sanções contra procuradores que, em suas avaliações, cometeram abusos. O principal alvo é o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol.

A recondução de Lauro Nogueira e Dermeval Gomes Filho, indicados pelos MPs Estadual e do Distrito Federal, foi rejeitada por 36 e 33 votos contrários, respectivamente. A votação é secreta. A retirada de pauta foi a de Marcelo Weitzel, indicado pelo MP Militar. Em agosto, os três conselheiros votaram contra a abertura de um processo administrativo contra Dallagnol.

No Ministério Público Federal (MPF), a ação foi vista como retaliação e tentativa de intimidação. O procurador regional Blal Dalloul disse ser um “claro sinal de retaliação para agentes públicos que, em tempos muito estranhos para a própria democracia, ousaram julgar centenas de casos com independência e senso de justiça”.

Renan negou haver relação com a atuação dos conselheiros, mas criticou a atuação do CNMP. “Tenho entrado com representações e acho, mas aí não tem nada a ver com a apreciação de nomes, que o CNMP tem sido muito corporativista e culpado pelos excessos do que aconteceu na Lava Jato”, disse Renan, que apresentou ontem nova representação contra Dallagnol no conselho pedindo seu afastamento das atividades no MP. O senador acusa o procurador de ter “maquinada um conluio” com a Rede para impedir o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, de julgar casos da Lava Jato.

____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Causa da morte de delator é 'indeterminada'

Pedro Prata

Fausto Macedo

19/09/2019

 

 

O registro oficial da 14.ª Delegacia, no Leblon, aponta “causa indeterminada” para a morte do ex-presidente da extinta Odebrecht Energia Henrique Serrano do Prado Valladares, um dos delatores da empreiteira na operação Lava Jato. O corpo do exexecutivo foi encontrado anteontem no apartamento onde ele morava. As primeiras investigações indicam que não havia sinais de arrombamento no imóvel nem evidências de luta.

Em sua delação, revelada pelo Estado em abril de 2017, Valladares citou o suposto pagamento de propinas para o deputado Aécio Neves (PSDB-MG) e para o ex-senador e ex-ministro Edison Lobão (MDB-MA). Ele é apontado como um dos negociantes de R$ 30 milhões de propina para Aécio atuar nos projetos do Rio Madeira (Usinas Hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, em Rondônia) para atender interesses da Odebrecht e também da Andrade Gutierrez.

Valladares relatou que a empreiteira pagava prestações de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões a “Mineirinho”, codinome atribuído a Aécio. Os valores eram, segundo ele, repassados pelo setor de Operações Estruturadas, apontado como o departamento de propinas do grupo.

O delator afirmou ainda que Lobão recebeu R$ 5,5 milhões para interferir no leilão da usina de Jirau de forma que a Odebrecht assumisse o empreendimento. Segundo ele, o ex-ministro, que teria o apelido de “Esquálido” na planilha da empreiteira, cobrou “contrapartida”. Pagamentos de propina, relatou Valladares, foram feitos em com entrega de dinheiro diretamente na casa do filho de Lobão, Márcio Lobão, no Rio.

Na época da delação, o deputado Aécio Neves, o ex-ministro Edison Lobão e seu filho, Márcio Lobão, negaram a prática de ilícitos e o recebimento de propinas da Odebrecht. A reportagem procurou as defesas ontem mas não teve retorno até a conclusão desta edição.