Valor econômico, v.19, n.4719, 29/03/2019. Brasil, p. A5

 

Para Ipea, sem reforma país pode voltar à recessão

Bruno Villas Bôas 

29/03/2019

 

 

Sem a aprovação da reforma da Previdência, o país pode viver uma nova recessão a partir do ano que vem. A avaliação é do economista José Ronaldo Souza Júnior, diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que divulgou nesta quinta-feira sua Visão Geral de Conjuntura.

"É possível fazer várias simulações, mas, em algum momento, o nível de incerteza será de tal ponto que as taxa de juros do governo sobem, o câmbio se desvaloriza fortemente, desencadeando um processo que poderia gerar nova recessão. Talvez não neste ano, mas no próximo, gerando um período longo de estagnação para o país."

Segundo o economista, uma recessão no próximo ano pode ter consequências graves para o país, uma vez que teria início com níveis de desemprego já elevados e desequilíbrios fiscais intensos nos Estados. "Você chegaria ao fim do período [de recessão] com um nível de renda muito menor", afirmou.

O Ipea não apresentou projeções do tamanho da recessão, que não é o cenário básico para o ano que vem. O instituto acredita que a reforma apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro será aprovada em meados deste ano, o que permitirá um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país de 2% em 2019 e de 3% no ano que vem.

Conforme cálculos do Ipea, a reforma pode aumentar o espaço fiscal do governo em quase R$ 40 milhões ao ano, no período de 2020 a 2023. De acordo com Souza Júnior, essa projeção considera apenas os efeitos da reforma sobre os gastos do governo, sem seus efeitos sobre a arrecadação. Os dados também são corrigidos pela inflação oficial.

"A forma como calculamos é diferente da do governo e, por isso, não são números comparáveis. Quando fala em uma economia de R$ 1 trilhão, o Ministério da Economia olhou um período de dez anos, um número nominal e considera o impacto das medidas nas receitas previdenciárias", explicou.

O cálculo mostra que, apesar da economia da reforma da Previdência ser crescente ao longo do tempo, traz impactos também importantes de curto prazo, necessários para aumentar o espaço fiscal (diferença entre o teto dos gastos e as despesas obrigatórias e incomprimíveis) do governo.

"É muito importante que as regras de transição que geram economia para próximos anos sejam mantidas minimamente [pelo Congresso Nacional] por causa dos impactos nos próximos anos. Estamos vendo espaço fiscal curto", acrescentou Souza Júnior.

O Grupo de Conjuntura do Ipea divulgou ontem cenários atualizados para a economia. A previsão de crescimento do PIB foi cortada para 2%, de 2,7% divulgados anteriormente (dezembro). A revisão coloca as projeções mais alinhadas com o restante do mercado, de 2% pela mediana do boletim Focus.

A revisão do Ipea reflete, em parte, o menor efeito de carregamento estatístico, provocado pela desaceleração da atividade no quarto trimestre do ano passado. Também pesaram incertezas ainda presentes sobre a aprovação da reforma da Previdência.

"A retomada que se imaginava ainda não aconteceu com força. Ela deve ser mais clara no segundo semestre. Existe ainda uma incerteza grande sobre o cenário fiscal, com a espera pela aprovação da reforma da Previdência. Com isso, podemos esperar uma retomada maior dos investimentos", afirmou.