Valor econômico, v.19, n.4719, 29/03/2019. Política, p. A6

 

Senadores articulam emenda para implantar parlmentarismo após 2022

Vandson Lima 

Renan Truffi 

29/03/2019

 

 

Senadores que compõem a cúpula do Congresso Nacional vão apresentar, até o próximo mês, uma proposta de emenda constitucional (PEC) para implantar um sistema parlamentarista no Brasil a partir de 2022.

Em um encontro ontem, no qual foi decidido dar início a esta articulação, estavam presentes o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), o vice-presidente Antonio Anastasia (PSDB-MG), Tasso Jereissati (PSDB-CE), a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS) e o senador José Serra (PSDB-SP), que encabeçará a iniciativa, elaborando o texto da PEC.

Serra confirmou ao Valor as tratativas. "Não é para agora, seria para valer a partir de 2022. Apresentarei a proposta até o próximo mês. A ideia é um sistema similar ao da França ou de Portugal".

Em Portugal e na França, o modelo é considerado semipresidencialista. O presidente eleito pelas urnas escolhe o primeiro-ministro, mas seu nome precisa ser aprovado pelos parlamentares. Nesta configuração, o primeiro-ministro é o elo que precisa refletir a vontade conjunta do parlamento e do presidente. Caso falhe, o parlamento pode substituí-lo.

O Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa do Senado fez, em 2016, um estudo a pedido dos parlamentares, em que detalhou as características de cada modelo. No caso português, o indicado a primeiro-ministro não precisa integrar a Assembleia nem, formalmente, pertencer ao partido majoritário. No entanto, uma vez indicado, terá 10 dias para apresentar seu programa de governo ao Legislativo. Como a rejeição do programa conduz à demissão do governo, é praxe o presidente consultar os partidos políticos.

Na França, o governo é composto por duas instâncias: o Conselho de Ministros e o Gabinete. O Conselho toma, em tese, as decisões mais relevantes, é presidido pelo presidente, enquanto o gabinete, com uma agenda mais operacional, tem o primeiro-ministro como presidente.

Uma proposta apresentada pelo ex-ministro de Relações Exteriores Aloysio Nunes Ferreira, em 2016, previa que o governo fosse chefiado pelo primeiro-ministro, indicado pela maioria da Câmara, com autoridade para a gerência da administração pública federal.

Para Serra, a proposta não afeta o presidente Jair Bolsonaro imediatamente, mas que reflete as dificuldades que o governo tem enfrentando já nos primeiros meses: "É óbvio que as dificuldades vistas nestes três meses do governo mostram que o sistema está esgotado. É preciso propor outro modelo."

Há também um caráter 'pedagógico' na proposta, segundo outros parlamentares envolvidos, com o objetivo de usar a medida como uma "sinalização" para que o governo Bolsonaro entenda que a "paciência" no Congresso se esgotou. "Ou o governo acorda, toma as rédeas e assume seu papel quanto à reforma da Previdência, dialogando num bom nível com o Congresso - não é um diálogo da velha política, mas com respeito -, ou nós vamos descambar para esses caminhos. Não tem jeito", afirmou uma fonte.

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Senado tentará reduzir impacto fiscal de PEC do Orçamento impositivo

Vandson Lima 

Renan Truffi 

29/03/2019

 

 

O Senado vai promover alterações na proposta de emenda à Constituição (PEC) do Orçamento impositivo para tentar diminuir ou até mesmo anular o impacto fiscal da medida.

A proposta, aprovada na Câmara dos Deputados na terça-feira, insere no texto constitucional o caráter mandatório das emendas de bancada estadual, à razão de 1% da Receita Corrente Líquida (RCL) do ano anterior. Ocorre que, desde 2017, a LDO prevê o percentual obrigatório das emendas coletivas em 0,6% da RCL.

A emenda que está sendo estudada no Senado traria esse percentual aos 0,6% já previstos ou a 0,8%, mas constitucionalizaria a obrigatoriedade.

Com a mudança, o texto teria de voltar à Câmara dos Deputados para nova análise, mas diminuiria o caráter de "pauta-bomba" e contrário aos interesses do governo, avaliam os senadores.

As lideranças da Casa estão de acordo com o procedimento, incluindo o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Simone Tebet (MDB-MS). O senador Esperidião Amin (PP-SC) foi designado para relatar a matéria e já realizou reuniões ontem com a equipe econômica do governo.

O Valor apurou que Amin gostaria de manter o texto como aprovado na Câmara, fixando as emendas em até 1%. O pedido para que esse percentual seja reduzido para 0,6% é do governo, que teme o impacto da medida no chamado Teto de Gastos. O argumento da equipe econômica é que, a cada 0,1%, o impacto no orçamento é de R$ 1 bilhão. Nesse embate, a tendência é que os parlamentares pressionem para que 0,8% seja o valor final.

Um estudo realizado pela Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado apontou que a medida, tal como está, pode colocar em risco o cumprimento do teto dos gastos públicos em 2020.

Pelo texto aprovado, aponta a IFI, o caráter impositivo para as emendas de bancada representaria a criação de uma nova obrigação constitucional, que poderia atingir R$ 9,5 bilhões em 2020.

A IFI também apontou que o texto original da PEC foi modificado, fixando-se uma regra de correção baseada no teto de gastos, isto é, a inflação. Assim, da mesma forma que ocorre no caso das emendas individuais, o percentual inicial será observado apenas no primeiro ano. A partir do segundo, os valores nominais das emendas serão corrigidos pela inflação (medida pelo IPCA). Este ponto também está sendo avaliado pelos senadores e está sujeito a modificações.

Por fim, uma emenda apresentada em plenário retirou da PEC o parágrafo que tornava obrigatória a execução das programações orçamentárias que integram as políticas públicas e metas prioritárias. Mas em seu lugar, ficou no texto um conceito genérico que, avaliam técnicos do Senado, estaria sujeito a contestação jurídica. Tal argumentou pesou para que a matéria não fosse colocada em votação no Senado esta semana e recebesse uma análise mais cuidadosa.