O Estado de São Paulo, n. 45977, 04/09/2019. Política, p. A8

 

Entrevista - Carlos Siqueira: 'O regime da Venezuela é autoritário'

Paula Reverbel

04/09/2019

 

 

Siqueira afirma que PSB sofreu cobranças internas e da sociedade para se manifestar sobre o governo do país vizinho

PSB. Siqueira diz que desligamento do partido do Foro de São Paulo foi meramente formal

‘O regime da Venezuela é autoritário ’

Carlos Siqueira , presidente nacional do PSB

A decisão do PSB de condenar publicamente violações a direitos humanos do governo de Nicolás Maduro na Venezuela foi uma resposta a cobranças internas e da sociedade, afirmou ao Estado o presidente da sigla, Carlos Siqueira. Segundo ele, o país vizinho tem características de regime autoritário. Já o desligamento do Foro de São Paulo, diz, foi uma mera formalização, já que o partido não participou das últimas três edições. Nesta entrevista, Siqueira também critica o presidente Jair Bolsonaro e o compara a Maduro – para ele, o presidente brasileiro também não respeita a democracia. A seguir os principais trechos da entrevista:

O que levou o partido a repudiar as violações de direitos humanos na Venezuela?

O PSB tem na sua base a ideia do socialismo democrático, ou seja, plural. Diferentemente do stalinismo, a nossa ideia, na fundação do partido, foi crítica ao socialismo autoritário. Nunca tivemos relação com o governo Hugo Chávez ou com Nicolás Maduro, nunca tivemos uma reunião com o partido socialista da Venezuela. Ao mesmo tempo, estávamos sendo cobrados sobre por que a gente não dizia nada sobre isso. Achei que as pessoas tinham razão. (O governo Maduro) não tem nada a ver com o socialismo.

Acha que a Venezuela vive uma ditadura?

Embora tenha um presidente eleito, a eleição em si, apesar de indispensável, não garante que a Venezuela seja um regime democrático. O país hoje tem as características próprias de um regime autoritário: a existência de presos políticos e a ausência de liberdade de expressão. Esse é um pouco o risco que nós, brasileiros, corremos, já que elegemos um presidente que não respeita a democracia, elogia torturadores e desrespeita a imprensa.

O que levou à saída do Foro de São Paulo?

Há três edições, o PSB não participa. Os partidos socialistas da América Latina têm uma visão crítica do Foro. Quando participamos, não tínhamos uma identidade. Então, decidimos que, já que estamos fora na prática, seria melhor oficializar.

Quais são as críticas que fazem ao Foro?

A sua condução sempre foi bastante centralizada, não permitia uma discussão mais aberta sobre a conjuntura latino-americana. Fomos nos desanimando com isso e abandonando ao longo do tempo. Temos construído uma relação fora desse âmbito. Entramos na Aliança Progressista, uma articulação de partidos socialistas e socialdemocratas que tem coordenação no Partido Social-Democrata alemão. Fomos o primeiro partido do Brasil a aderir. Passamos a participar da Coordenação Socialista LatinoAmericana (CSL), que o PSB coordena há algum tempo e é composta de partidos socialistas da América Latina.

Havia cobrança para se posicionar sobre a Venezuela?

Havia uma cobrança interna e no plano externo, da sociedade, para que nós mostrássemos que não temos vínculo com esse governo. Não podemos ficar calados porque os direitos humanos estão sendo desrespeitados por alguém que se diz de esquerda. Temos de defender os direitos humanos quando eles forem desrespeitados por quem quer que seja. Da mesma maneira que nós resolvemos dizer que não reconhecemos o Juan Guaidó como presidente autointitulado. E também não podemos concordar que a crise na Venezuela seja resolvida por outros países, como Brasil – conforme o presidente Jair Bolsonaro sugeriu – ou EUA. A sociedade venezuelana é quem tem de decidir sobre essas coisas.

O PT fez o oposto, e a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, vem reiterando o apoio ao regime Maduro. O que acha isso?

Nós somos um partido de esquerda, mas de outra natureza. Não vou dar opinião sobre o PT, isso é com eles.

Bolsonaro já deu declarações sobre sua candidatura à reeleição. O que acha disso?

Acho que é muito cedo para falar de 2022 porque temos uma outra eleição pela frente. Bolsonaro resolveu fazer essa antecipação sem ter resolvido um único problema que encontrou como presidente. Acho negativo, pois os partidos deveriam estar dedicados a encontrar uma solução para os problemas do País.

Direitos Humanos

“Não podemos ficar calados porque os direitos humanos estão sendo desrespeitados por alguém que se diz de esquerda. Temos de defender os direitos humanos quando eles forem desrespeitados por quem quer que seja.”

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Seminário discute os desafios da democracia

04/09/2019

 

 

O Estado e a Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) realizam hoje, no Senado, em Brasília, o seminário Desafios da Democracia no Brasil: Inovação e Representação num Mundo Hiperconectado. A polarização política, a radicalização dos discursos e um ambiente virtual contaminado por informações falsas serão alguns dos assuntos debatidos, bem como o direito à privacidade, a proteção de dados e a inteligência artificial.

Os debatedores serão a senadora Mara Gabrilli (PSDBSP), o deputado Tadeu Alencar (PSB-PE), o gerente de políticas públicas do Twitter no Brasil, Fernando Gallo, o cientista político Fernando Guarnieri e a diretora executiva da Raps, Mônica Sodré.

Para Tadeu Alencar, as redes sociais e a internet aumentaram a participação social e a difusão de informações, e isso é positivo porque permite interação. Ele, no entanto, destacou a necessidade de soluções para evitar o mau uso. “A gente precisa se preparar para ter os antídotos a essas alterações dos fatos, fake news, que também se valem da própria plataforma para divulgar informações falsas.”

Na avaliação de Fernando Gallo, do Twitter, rede social usada por políticos no Brasil e outros países, é importante tomar medidas para identificar conteúdos danosos e contas automatizadas. “O Twitter é uma plataforma de liberdade de expressão, mas a gente quer também que as pessoas se sintam seguras para se comunicar dentro da rede”, disse ele, afirmando que a empresa investe em tecnologia para manter o ambiente saudável.

Para Mônica Sodré, um dos principais obstáculos é o acesso à tecnologia. A executiva da Raps questionou: “Como discutir participação popular e tecnologia no Brasil, em que parte significativa das pessoas está fora do ambiente digital?”

Fernando Guarnieri defendeu a formação de lideranças fortes para que as siglas organizem sua atuação parlamentar. “As oligarquias partidárias têm de ter algum limite, mas o que os movimentos de renovação têm de refletir é até que ponto essa forma enrijecida de partido não é consequência justamente do jeito como funciona nossa democracia”, afirmou o cientista político.