Correio braziliense, n. 20498, 05/07/2019. Cidades, p. 17

 

Robério é investigado por peculato e falsidade

Ana Viriato

Mariana Machado

05/07/2019

 

 

Operação Absentia » Distrital e segundo secretário da Câmara Legislativa aparece como suspeito de fraudar 50 listas de presença da Casa. Uma das denúncias atestam que ele registrou comparecimento em cinco sessões de novembro, período em que estava nos Estados Unidos

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) deflagrou, ontem, a Operação Absentia, que, em latim, significa ausência, para investigar a suposta fraude de 50 listas de presença da Câmara Legislativa pelo distrital e segundo secretário da Casa, Robério Negreiros (PSD). Por cerca de seis horas, os promotores de Justiça cumpriram mandados de busca e apreensão nas empresas ligadas ao deputado, em seu gabinete, na Segunda Secretaria, na sala da Mesa Diretora e na Diretoria Legislativa.

As medidas integram o Processo de Investigação Criminal (PIC) instaurado pela Procuradoria-Geral de Justiça do DF, com o apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e da Polícia Civil. Além de Robério Negreiros, a Operação Absentia mira o chefe da Diretoria Legislativa, Arlécio Alexandre Gazal — o setor é responsável pela marcação de ponto dos parlamentares. Pelo episódio, os dois podem ser denunciados pelos crimes de peculato e falsidade ideológica.

As suspeitas sobre Robério foram levantadas há mais de um mês. Em 4 de junho, o Instituto de Fiscalização e Controle (IFC), entidade de vigilância parlamentar, apresentou um pedido de cassação do mandato do parlamentar. A entidade afirmou que Robério atestou presença nas sessões ordinárias de 6, 7, 8, 11 e 13 de novembro de 2018. No período, entretanto, ele estava em Orlando, nos Estados Unidos, conforme comprovam fotos publicadas em redes sociais. Após a denúncia, o próprio distrital reconheceu que visitava a cidade norte-americana à época e argumentou que assinou o ponto “por equívoco”.

A Mesa Diretora efetuou o desconto referente às ausências no contracheque do parlamentar. Com base em um parecer da Procuradoria-Geral da Câmara Legislativa, porém, a cúpula da Casa arquivou o processo por quebra de decoro parlamentar, antes mesmo da análise pela Corregedoria ou pela Comissão de Ética e Decoro Parlamentar. “A investigação pelas autoridades competentes se encontra numa fase embrionária, pois sequer o investigado foi ouvido. Portanto, seria muito açodada e precipitada a abertura de um processo de cassação neste momento”, disse o parecer técnico, emitido em 18 de junho.

A representação do IFC ainda indicava que, na atual legislatura, Robério assinou a folha de presença em diversas sessões, mas não aparecia em filmagens ou notas taquigráficas. De acordo com a entidade, o distrital faltou, até 23 de maio, 75% das deliberações. “Nenhum dos meios de controle elencados pelos deputados foram definidos no Regimento Interno da Casa como meio de certificação do exercício parlamentar”, rebateu a Procuradoria-Geral do Legislativo.

Apesar do arquivamento da representação do IFC, novos procedimentos podem ser abertos. Na história da Câmara Legislativa, somente três deputados tiveram os mandatos cassados: Raad Massouh, Eurides Brito e Carlos Xavier.

Ação

Policiais civis da Coordenação de combate à corrupção, aos crimes contra a administração pública e contra a ordem tributária (Cecor) e promotores do MPDFT chegaram à Câmara Legislativa por volta das 9h. Eles deixaram a Casa às 14h45. O material apreendido, como cópias de documentos relacionados à homologação de atestados médicos e verba indenizatória, foi retirado pela garagem.

Mas esta não foi a primeira vez que eles compareceram ao Legislativo local em busca de informações sobre Robério. No fim de maio, requisitaram as folhas de presenças de 30 e 31 de outubro e de todas as sessões de novembro. Na mesma época, o distrital apresentou um atestado médico para se licenciar — em seguida, emendou mais três justificativas para se ausentar. O parlamentar do PSD retornou à Câmara Legislativa somente em 25 de junho, quando subiu à tribuna para se defender das acusações e criticar a mídia.

Em nota, Robério Negreiros afirmou entender “as ações de hoje (ontem) como naturais em um regime democrático e sob o império das leis”. “Temos certeza de que sairemos fortalecidos no fim do processo, quando a verdade será restabelecida, e os covardes denuncistas e mentirosos, desmascarados”, diz o texto divulgado pela assessoria de imprensa do deputado.

A Câmara Legislativa informou que “forneceu todas as informações solicitadas e está colaborando com o Ministério Público, a Polícia Civil e o Tribunal de Contas do DF (TCDF) desde o início das investigações. “Aguardamos a conclusão das apurações para adotar as medidas cabíveis no âmbito do Poder Legislativo”, completou.

O Ministério Público de Contas (MPC) também investiga o caso. O órgão instaurou um procedimento interno (PI) para levantar informações e decidir se apresenta uma representação contra o distrital ao TCDF.

Memória

Condenação por improbidade

Em outubro de 2017, a 14ª Vara Federal em Brasília condenou Robério Negreiros por improbidade administrativa devido à fraude em uma licitação do Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo o Ministério Público Federal (MPF), em 2004, ele articulou, com as empresas Sitran e Confederal, as propostas apresentadas em uma concorrência pública para que a Brasfort, empresa de sua família no ramo de segurança e contratação de mão de obra especializada, na qual trabalhava, saísse vencedora.

As investigações da Operação Sentinela indicaram que o pai do parlamentar e funcionários da Corte de Contas teriam planejado o modelo do edital da licitação e inserido exigências que restringissem o número de participantes, como “elevado capital social”, “serviços de vigilância” e “brigada de incêndio”. Em contrapartida, os servidores poderiam indicar conhecidos a cargos na Brasfort. Pelas fraudes, em 2004, Robério chegou a ser preso em uma cela da Superintendência da Polícia Federal, no Setor Policial Sul. O deputado nega as irregularidades e recorreu da sentença.

O que diz a lei

O Ato da Mesa Diretora nº 61/2019, publicado em 30 de maio, determina que, no prazo de uma hora após o encerramento das sessões ordinárias, a Diretoria Legislativa protocole as listas de presença para a notificação dos distritais faltosos. Os deputados, então, têm 48 horas para justificar eventuais ausências. O texto estabelece oito possíveis explicações: motivos de saúde própria ou familiar; participação em assembleias e atos públicos; entrevistas de rádio ou televisão; presença em solenidades oficiais; atendimento ao clamor público vinculado a questões emergenciais; atendimento parlamentar de reunião, seminário, congresso, movimento social e de missão de caráter diplomático ou cultural; representação do Legislativo local em eventos oficiais; e participação em eventos fora do Distrito Federal. Caso a ausência não seja justificada, a Casa deve efetuar o corte de ponto e o desconto no salário do parlamentar.

50

Quantidade de folhas de ponto supostamente fraudadas

18.819

Número de votos conquistados por Robério Negreiros em 2018

R$ 25,2 mil

Valor do salário de um deputado distrital