Título: Estou rompendo com um passado de atrasos
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 20/10/2012, Cidades, p. 28

Governador rechaça as críticas que a parceria com Cingapura vem sofrendo. Sobre a segurança pública, ele define o sequestro relâmpago como um crime "apavorante", mas garante: medidas estão sendo tomadas

Empolgado com a consultoria da empresa Jurong Consultants, contratada para a criação de um plano de desenvolvimento econômico para o Distrito Federal, o governador Agnelo Queiroz (PT) não esconde o incômodo pelas críticas que o projeto sofreu nos últimos dias. Especialmente as que partem de aliados.

Para Agnelo, atacar o trabalho da empresa de Cingapura, cidade-Estado no Sudeste Asiático conhecida mundialmente pelo rigor no planejamento urbano, representa “provincianismo”, “miopia”, “falta de informação” e “fundamentalismo”. O governador assegura que o plano terá a participação de técnicos da capital brasileira, levando em conta a expertise e a capacidade dos cingapurianos para atrair investimentos. “Estou rompendo com um passado de atraso e de obscurantismo, para um projeto de longo prazo, sustentável e ao lado de parceiros com credibilidade no mundo”, afirma.

Em entrevista ao Correio, Agnelo fala também sobre segurança pública. Dá razão à população em ter medo de sequestros relâmpagos, um crime “apavorante”, nas palavras do próprio governador, mas garante que medidas estão sendo tomadas para reduzir a violência.

Sobre a ampla aliança de partidos que o apoiam, ele diz que o momento é de união contra o domínio do crime organizado e pelo futuro de Brasília. Nessa luta, o petista está aberto a receber companheiros de todas as cores, siglas e ideologias. Só não admite o DEM e o PSDB, que seriam os responsáveis pela “tragédia” que se abateu sobre o DF nos últimos anos.

Nessa ampla unidade, Agnelo diz que aceitaria até mesmo uma eventual ajuda do ex-governador Joaquim Roriz e da mulher dele, Weslian Roriz, candidata contra o petista na eleição de 2010, desde que não significasse entrada no governo. “Se eles quiserem ajudar a cidade, não faremos nenhuma distinção”, diz o governador.

O contrato de consultoria com a Jurong, braço do governo de Cingapura, vem sofrendo ataques de aliados seus como os senadores Rodrigo Rollemberg e Cristovam Buarque, além de membros da sociedade. Como o senhor vê essas críticas? Tenho certeza de que a crítica é feita por ignorância. Estão dizendo que é o planejamento urbanístico da cidade. Não sabem que é para o desenvolvimento econômico. Essa é uma demonstração de que não se conhece do que se está tratando. Buscamos a inteligência disponível de um país que tem vasta experiência nesse tipo de planejamento, com mais de 1.700 projetos desenvolvidos no mundo, vitoriosos, modernos, com grande credibilidade. Vamos buscar essa inteligência, sem excluir nenhum setor da nossa cidade e do nosso país. Atacar sem saber é coisa de fundamentalista. A crítica é feita por ignorância e por provincianismo absoluto. É com o que estou rompendo. Estou rompendo com um passado de atraso e de obscurantismo, para um projeto de longo prazo, sustentável ao lado de parceiros com credibilidade.

Por que a Jurong e não entidades do DF? É uma empresa com grande expertise, de um governo com experiências vitoriosas e credibilidade internacional, que ajuda a atrair grandes empresas no mundo. É o que buscamos. Atacar Cingapura é uma demonstração de absoluta falta de conhecimento sobre a realidade. Grandes empresas brasileiras investem lá, como a Petrobras, a Vale, inclusive com faturamentos substanciais. E o Brasil tem procurado estreitar relações com Cingapura.

De onde surgiu a ideia desse acordo? Surgiu por todo o histórico de Cingapura de desenvolvimento extraordinário. Em 40 anos, saiu de uma renda per capita de pouco mais de US$ 500 para US$ 50 mil. Tem hoje uma das maiores rendas do mundo. Por experiências também no Brasil, como o projeto do corredor norte de Minas Gerais, onde está instalado o aeroporto de Confins. O projeto também foi feito sem licitação.

E o custo do contrato no DF? Oito milhões de reais não seriam muito dinheiro? Comparado ao de Minas, foi uma pechincha. O de lá custou12 milhões de reais. E, mesmo assim, valeu a pena. Por causa do planejamento, essa região de Minas já captou US$ 4 bilhões em investimentos. A projeção é de US$ 40 bilhões até 2030.

Falta diálogo com seus aliados no Senado? Não. Com Rodrigo, tenho conversado com mais frequência. Com ele e com o PSB. O partido está bem no governo, com muito espaço e toda vez que foi necessário discutir a participação no governo, nós discutimos. Fiquei espantado porque se uma crítica dessas vem da Liliane Roriz, por exemplo, eu entendo. Aqui, sempre houve uma política contra qualquer tipo de planejamento. Mas um aliado ter uma visão atrasada como essa, míope, de prontamente rechaçar que possamos utilizar toda a expertise do que existe de mais avançado e de inteligência no mundo, é incompreensível, a não ser por um motivo completamente mesquinho, que é a disputa eleitoral ou desejar que o governo não dê certo.

Incomoda o senhor que Rollemberg tenha planos de disputar o governo? Qualquer objetivo individual é legítimo. As pessoas só precisam ser claras com suas atitudes. O que não pode é ter uma atitude de oposição e participar do governo.

O senhor tem uma base ampla de apoio. Conseguirá mantê-la unida em 2014? Vou lutar muito para isso. Nossa cidade precisa de uma grande união para superar o que aconteceu no passado. As pessoas que têm compromisso com Brasília e que amam a cidade não querem a volta do passado, dos métodos do passado. Esse é o momento de unir todas as forças que desejam essa transformação. Precisamos virar essa página. O senhor tem batido muito nesta tecla do desenvolvimento econômico, mas há um problema grave no seu governo que é a segurança pública. O senhor acha está no caminho certo para conter a violência? Nós fizemos uma mudança na política de segurança pública, integrando as forças como nunca aconteceu aqui no passado. E estamos fazendo um monitoramento importante, com um sistema em que se registra on-line todas as ocorrências. Podemos ver as características do crime, da pessoa que cometeu. Com essas informações, temos condição de tomar as medidas necessárias. Desde a implantação desse programa, chamado Ação pela Vida, tivemos bons resultados.

Quando começa a redução dos índices? Já há redução. Quando há uma análise levando em conta os meses antes do início do programa, há uma distorção dos dados. Mas a gente já começa a ver redução. Por exemplo, em setembro agora, o índice de roubo com restrição de liberdade, o chamado sequestro relâmpago, foi o mais baixo nestes últimos dois anos: 32 casos. Esse é um crime que assusta a população, traumatiza. Mas, se compararmos com setembro de 2011, é menos da metade. Foram 69 naquele período.

O clima hoje é de medo. As pessoas estão com receio de ir a um restaurante... É que ficaria chato comparar com estados. Mas a imprensa, neste fim de semana, noticiou casos num grande estado brasileiro de homicídios em grande quantidade. Aqui, prendemos um bocado de criminosos envolvidos em sequestros relâmpagos. Foram mais de 400. Acha um exagero as pessoas terem medo? Não acho, não. É uma situação muito constrangedora e ameaçadora porque a pessoa não sabe se vai ser largada ali ou se vai sofrer alguma violência. É uma modalidade de crime apavorante, muito traumática. Mas conseguimos prender um grande número desses criminosos. Não estamos satisfeitos ainda com os dados: 32 sequestros relâmpagos no mês é um por dia. Mas estamos trabalhando sério. Uma política pública, para dar certo, não ocorre de um dia para outro. Demora a dar resultados. Mas isso nos preocupa muito e temos nos dedicado bastante.

O ex-governador Arruda fez uma acusação, ao participar de audiência de instrução de um dos processos que ele responde. Disse que deveria aparecer o vídeo em que o senhor conversa com Durval Barbosa antes da Operação Caixa de Pandora... O que tem lá? O que eu vi foram os criminosos, como ele, fazendo maracutaia. Eu não tenho nada com isso, com essa bandidagem e com a quadrilha dele. Ter o comportamento que tive ajudou a fazer com que esses bandidos fossem para a cadeia. Arruda disse que os esquemas continuam. O crime organizado persiste? Enfrentei e continuo enfrentando o crime que havia no governo dele e em outros. Estamos redobrando nossa vigilância e aperfeiçoando nossa estrutura de fiscalização, uma das melhores do país, com a Secretaria de Transparência. É uma luta cotidiana.

O fato de líderes do seu partido, o PT, terem sido condenados pelo STF no mensalão será um desgaste para petistas nas eleições? Sempre vão querer utilizar isso. Mas nossa população é cada vez mais esclarecida. Sabe distinguir o que é uma condenação com conteúdo político de uma com provas. Vamos ver o resultado dessas eleições e fazer uma análise do que significou. Tenho certeza de que há prejuízo um julgamento no curso de uma eleição, com grande exposição. O STF foi justo ao condenar José Dirceu e José Genoino por corrupção ativa? Houve um julgamento político. É muito arriscado fazer uma condenação sem provas. A nossa história está cheia de exemplos como esse, de tristes memórias. É preciso um respeito muito grande pelo direito. Essa é a forma de defender a democracia. Quando sai desse espaço, do Estado de direito, serão as preferências pessoais, as idiossincrasias, as vinganças que vão sobressair e, aí, pode descambar para outros caminhos que não queremos mais no Brasil, da ditadura. É muito perigoso. Mas temos que acatar o que foi decidido pela Justiça.

Ainda sobre a ampliação da sua base, o PSD pode se tornar um parceiro? O Brasil é muito heterogêneo. Cada estado tem uma composição própria. No plano federal, o PSD apoia a presidente Dilma. Tem uma base grande no Congresso. Aqui, tem uma posição de independência. Tanto é que tem deputados que fazem oposição e há quem seja base, como o deputado Washington Mesquita. Estive com Kassab várias vezes...

O ex-governador Rogério Rosso, presidente do PSD-DF, vai ocupar cargo no GDF? Não temos conversado sobre cargos. Temos conversado sobre pessoas que podem contribuir. Faço um esforço para que todos que defendem a cidade possam ajudar. Passamos por uma tragédia. Nossa credibilidade foi ao fundo do poço. E esse é um momento excepcional de recuperação e de mudanças estruturais para um grande salto econômico.

Então, o senhor aceita todos os aliados que quiserem contribuir? Esse não é um momento de exclusão. Só estão excluídos aqui o crime e a direita mais empedernida, autora dessa tragédia. Portanto, não cabem no meu governo DEM e PSDB.

O senhor foi adversário de Joaquim e Weslian Roriz em 2010. Se eles quiserem colaborar no seu governo, aceita? É difícil eles quererem. Não vão querer. Mas se eles quiserem ajudar a cidade, não faremos nenhuma distinção. Não significa que seria com cargos. Acho que tem formas de ajudar a cidade.

A dois anos da próxima eleição, já tomou a decisão de disputar um novo mandato? Hoje, ainda não. É cedo para se falar nisso. Minha preocupação hoje é minha dedicação integral, 18, 19 horas por dia para a minha cidade. É muito trabalho e, se o dia tivesse um pouco mais de 24 horas, seguramente ajudaria mais. Houve uma intensa disputa pelo comando da Federação Brasiliense de Futebol. A entidade terá alguma participação na gestão do Estádio Nacional? De forma alguma. Vamos fazer uma licitação internacional para a administração do estádio. Quem ganhar vai explorar a arena e arcar com os custos.