O globo, n.31375, 02/07/2019. País, p. 06

 

Relatório de CPI vai pedir o indiciamento da Vale e Tüv Süd 

Naira Trindade 

02/07/2019

 

 

Cinco meses após o rompimento da Barragem de Brumadinho, que deixou ao menos 246 mortos e 24 desaparecidos, o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado vai acusar a Vale de omissão e dizer que a empresa operou no campo do “risco proibido”. Em seu parecer, o relator, senador Carlos Viana (PSDMG), vai pedir o indiciamento da Vale, da empresa alemã Tüv Süd, que atestou a estabilidade do muro de contenção de rejeitos, e de 14 mais funcionários das duas companhias por homicídio culposo e crime ambiental.

No parecer que será apresentado à comissão hoje, ao qual o GLOBO teve acesso, o relator concluiu que “diretores, gerentes e funcionários da empresa operavam dentro do campo do risco

proibido, ou seja, aquele que expõe bens jurídicos (vida, patrimônio, meio ambiente) a perigo concreto”. Carlos Viana disse ainda “ter a certeza de que a Vale detinha de informações sobre o risco do rompimento”.

— Ficou muito claro nos dois anos de quebra de sigilo de e-mails que a empresa detinha informações e foi omissa — disse o relator ao GLOBO.

No texto, pede-se o indiciamento da Vale e da Tüv Süd por “crime culposo de destruição de flora de preservação permanente e de mata atlântica e de poluição, que provoca mortandade de fauna e flora, com inviabilização de área para ocupação humana, combinados com responsabilidade penal de pessoa jurídica”. Já para os 12 funcionários da Vale e dois da Tüv Süd, Viana pede indiciamento por homicídio culposo, lesão corporal culposa e também pelos crimes de destruição da flora.

No documento de 395 páginas, o relator chamou a atenção para troca de e-mails entre funcionários da Vale e da empresa de auditoria TüvSüv onde eram promovidas alterações no conteúdo antes que fossem formalmente apresentados à Vale e à Agência Nacional de Mineração (ANM). “Como fica a credibilidade dos resultados? Sempre que não passar, a Vale vai envolver uma outra empresa até ter um resultado benéfico pra ela?”, questionou um dos funcionários da Tüv-Süv à mineradora.

APOIO DE ALCOLUMBRE

O relator identificou haver claro conflito de interesse entre as duas empresas e acusou a companhia alemã de alterar o conteúdo até isentar a Vale de responsabilidades. Com base nisso, o relator propõe —em um dos três projetos de lei que serão apresentados pela comissão — passar para a agência reguladora, ANM, a responsabilidade de contratar as empresas de auditoria externa responsáveis por avaliar as estabilidades das barragens.

Em outro dos projetos propostos está a criação de uma “participação especial” aplicada à receita líquida das mineradoras, com alíquota máxima de 40%, a exemplo do que ocorre com o royalties do petróleo. O entendimento do relator é que, “aplicando se à tributação do lucro evita se inviabilizar a atividade do empreendedor, especialmente aqueles de porte médio ou pequeno, que exploram minas menores e de menor qualidade”.

Já o terceiro projeto quer acabar com as barragens de rejeitos em operação em um prazo máximo de dez anos. As que estão inativas teriam prazo de apenas cinco anos.

— Estamos com total apoio do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, para que esses projetos sejam analisados de forma mais rápida possível —disse Viana.

Procurada, a Vale informou que “vai aguardar o relatório ser comunicado oficialmente para se pronunciar”. Já a Tüv-Süd não retornou às ligações.